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Agência de Jornalismo das periferias

Por: Ira Romão

Publicado em 15.03.2022 | 17:25 | Alterado em 15.03.2022| 17:39

RESUMO

Retorno, encerramento de ciclos e relação são alguns dos assuntos mencionados pelos alunos do terceiro ano do ensino médio ouvidos pela Agência Mural

Tempo de leitura: 5 min(s)
Esta reportagem foi produzida com o apoio do Instituto Unibanco IU

O ambiente escolar é um espaço que possibilita não só o acesso ao conhecimento, mas as trocas sociais, o acolhimento e encorajamento das relações humanas. A escola “representa o começo de tudo”, define a estudante Isabela Gomes, 17. Já para Rayanna Mirela Costa da Silva, 18, a escola abriu os olhos para o mundo.

No Brasil, o papel e a importância dessa instituição democrática é celebrado no dia 15 de março. Embora não seja feriado nacional, a data é uma oportunidade de evidenciar a responsabilidade da escola que é, de longe, um dos principais lugares de interações fora do círculo familiar.

De acordo com o Censo da Educação Básica de 2020 do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) existem no Brasil mais de 179 mil escolas de educação básica. Só no estado de São Paulo estão concentradas 5,4 mil escolas que atendem 3,5 milhões de estudantes, o que corresponde a 36% do total de matrículas no país.

Para entender como é a relação dos alunos com a escola, a Agência Mural conversou com Isabela, Rayanna e outros jovens das periferias de São Paulo que estão no terceiro ano do ensino médio. Eles opinam sobre esse ambiente com base nas experiências pessoais, já que estão inseridos em diferentes modalidades de ensino.

Ambiente social

Matheus Maciel, 18, cursa o terceiro ano integrado ao técnico de comunicação visual, na Etec (Escola Técnica Estadual) Jornalista Roberto Marinho, no Brooklin, zona sul. Morador do bairro Jardim Miriam, situado no distrito de Cidade Ademar, ele acredita que dentre outras coisas, a escola é um lugar de socialização.

“Na escola é onde eu treino o que vejo em livros e, às vezes, em filmes. É um lugar onde você vai trocar, receber críticas, falar coisas que são pertinentes e que acabam sendo integradas à escola”

Matheus Maciel, 18, estudante

Matheus defende que a interação social para além do conteúdo programático, sobretudo com os professores, faz a diferença na vida dos alunos dentro e fora da escola.

“Conheci a Etec através de uma dessas conversas informais”, lembra. “Uma professora de português comentou no oitavo ano. Por mais que ela não tenha explicado muito bem o que era Etec, ela deu esse estalo na nossa cabeça.”

Matheus destaca que a escola é um ambiente de socialização @Ira Romão/Agência Mural

O estudante destaca que ingressar em uma escola técnica, ainda mais localizada em um bairro onde se concentram grandes empresas, é um pontapé importante na vida estudantil.

“Por mais que eu tenha que correr muito e com muita coisa, o meu ponto de partida, que ainda não é excelente em relações acadêmicas, é melhor do que o que muita gente vivencia”, avalia o jovem.

Além disso, Matheus destaca que o apoio familiar é a base para o desenvolvimento de qualquer criança e jovem, ainda mais para lidar com questões do ambiente escolar. “[Sem os conselhos da família] eu não teria lidado com muita coisa da escola e da maneira que eu lidei.”

De volta à escola

A estudante Isabela Gomes, 17, não esconde a felicidade por ter voltado às aulas presenciais, já que por conta da pandemia o ensino remoto prevaleceu nos dois primeiros anos do ensino médio.

“Foi algo difícil porque eu não tinha concentração nenhuma nas aulas. O online acabou comigo, mas acredito que já consegui recuperar e estou nos eixos”

Isabela Gomes, 17, estudante

Moradora do bairro de Americanópolis, também na zona sul de São Paulo, Isabela estuda no Colégio Monte Castelo, na região de Interlagos, que integra a rede privada do estado. Em 2022, as instituições particulares têm 40 mil alunos matriculados no terceiro ano do ensino médio, de acordo com a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.

Isabela acredita que a escola “representa o começo de tudo” e, por passar grande parte do tempo nesse ambiente, afirma que ele “teve total interferência” em seu desenvolvimento de vida. Assim, ela sente estar “preparada para começar um novo ciclo” após concluir o terceiro ano.

Isabela comemorou a volta do ensino presencial nas escolas @Arquivo Pessoal

Segundo a estudante, essa preparação está associada ao próprio esforço como aluna, do que ao fato dela estudar em uma escola privada. Para a jovem, dependendo da situação, quem faz a escola é o aluno.

“Tenho muitos conhecidos que estudam em escolas públicas, que têm certo desleixo, não ligam para a escola. Mas tem muita gente lá dentro que também quer aprender”, exemplifica.

“Na escola particular é a mesma coisa: tem gente que está lá porque quer aprender e tem gente que está por estar. O pai está pagando a escola e ele não liga.”

Fim de ciclo

Quem também está gostando da volta presencial no tão esperado terceiro ano é Rayanna Mirela Costa da Silva, 18, moradora da favela de Paraisópolis, na zona sul da capital. Ela cursa técnico em administração integrado ao ensino médio, na Etec Abdias do Nascimento, e define como “maravilhoso” o atual ano letivo que representa o fim de um ciclo.

Rayanna encara a escola como um dividir de águas, lugar que lhe abriu a mente @Arquivo Pessoal

“Estou achando bem importante aproveitar cada minuto do ensino médio, rir e estudar bastante, enquanto me preparo para o que está por vir”, diz.

Rayanna está entre os 380 mil alunos matriculados no ensino médio na rede estadual de São Paulo. Para ela, a volta à sala de aula é como se estivesse vivendo ao mesmo tempo o primeiro e o último ano dessa etapa estudantil. E reforça o papel da escola na vida dos estudantes das periferias.

“Ir para a escola no lugar que moro [Paraisópolis] é uma das melhores coisas que você faz, porque não tem muitas oportunidades. E isso não é só aqui”

Rayanna Mirela Costa da Silva, 18, estudante

“Na minha vida, a escola foi algo que abriu meus olhos para o mundo. Assim, vi que poderia chegar a patamares que pessoas que nasceram em berço de ouro chegaram. E ultrapassar também”, acrescenta.

A estudante também evidencia o peso dos primeiros anos da educação básica. “A fase de ‘prézinho’ [ensino infantil] e de fundamental I é uma das mais importantes, porque é ela que vai te moldar, não só para a vida, mas para quem você será após se formar na escola. Também vai te ajudar muito na questão do fundamental II e no ensino médio”, diz.

Outra chance

Em 2021, Alan Quintino, 22, se matriculou na Escola Estadual Professor Carlos Borba, no Jardim Shangrilá, na zona norte, retornando ao primeiro ano do ensino médio pelo EJA (Educação de Jovens e Adultos). Neste ano, em São Paulo, estão matriculados nessa modalidade 30 mil alunos no terceiro ano.

Alan fala da importância da volta aos estudos com o EJA @Arquivo Pessoal

Morador do Jardim Rodrigo, na Parada de Taipas, também na zona norte, Alan ficou cerca de quatro anos longe da escola. “O EJA foi uma das melhores coisas que me aconteceu, se não tivesse ele não sei se teria como terminar”, reflete.

Alan diz que a escola “representa um dos melhores lugares” e que ela mudou sua vida.

“É um lugar onde você aprende e conhece muitos amigos. Nem todos você leva para a vida, mas alguns ficam. [A escola] pra mim foi algo muito importante”

Alan Quintino, 22, estudante

O jovem, que durante a semana trabalha em uma funilaria e aos finais de semana faz bicos, tem se planejando para cursar uma faculdade.

“Tenho um grande sonho de concluir e fazer faculdade de veterinária. Desde pequeno sempre tive esse sonho”, conta ele. Outra motivação é a própria mãe, que o incentiva nos estudos. “Ela sempre está ali no meu pé, dizendo ‘vai lá, termina e faz a sua faculdade'”, narra.

Aos jovens que estão no início ou no meio do percurso, Alan aconselha que tenham força e não desistam. “Se estiver com dificuldade para ir, se levanta. Se achar que não vai conseguir, mude o pensamento. [Diga:] ‘Eu vou conseguir e continue indo’.”

O dia a dia de estudantes das quebradas também foi tema de episódio do Próxima Parada. Confira:

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Ira Romão

Jornalista, fotojornalista e apresentadora de podcast. Atuou em comunicação corporativa. Já participou de diferentes projetos como repórter, fotógrafa, verificadora de notícias falsas e enganosas. Foi uma das apresentadoras do ‘Em Quarentena” e da série sobre mobilidade nas periferias. Ama ouvir histórias, dançar, karaokê e poledance. Correspondente de Perus desde 2018.

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