Por: Evelyn Fagundes
Arte: Magno Borges
Edição: Paulo Talarico
Publicado em 17.01.2025 | 14:36 | Alterado em 17.01.2025| 16:17
As profissionais do cuidado das unhas celebram o reconhecimento entre vitórias pessoais e estigmas do trabalho
Tempo de leitura: 6 min(s)Mia Silva, 31, trabalha há 13 anos como manicure e afirma que há uma função quase intrínseca à profissão: a dedicação em ser companheira do cliente. Foi ouvindo histórias das clientes que ela criou amizades, mas, também, conseguiu identificar que estava vivendo problemas em um relacionamento.
Hoje, mãe solo de Nicolas, 4, a manicure conta que a renda que conquista com o trabalho sustenta a casa. Além disso, como é possível agendar os horários em que ela fará o atendimento, encontra momentos para ficar com o filho.
“Meu único trabalho é esse, não tenho outra fonte de renda. E é ele que me abre portas para cuidar do meu filho, estar com ele, curtir ele e organizar meus horários. Tenho essa flexibilidade”, diz Mia.
Mia Silva é pernambucana e abriu um salão no Jardim Cumbica, em Guarulhos @Arquivo pessoal/Divulgação
Os estilos diferentes de unhas feitas pela Mia @Arquivo pessoal/Divulgação
Unha em formato oval com detalhes de oncinha @Arquivo pessoal/Divulgação
O ano em que Mia começou foi o mesmo em que a profissão passou a ser reconhecida oficialmente como uma atividade de trabalho. Apesar desse cuidado com as unhas existir desde antes de Cristo, no Brasil a lei que ofiicaliza este trabalho foi aprovada em 18 de janeiro de 2012.
Mia vive no Jardim Cumbica, em Guarulhos, na Grande São Paulo, onde pessoas que atuam com o cuidado das unhas não faltam.
Pelas ruas da região é comum encontrar nos portões das casas, placas anunciando o serviço. A Agência Mural identificou ao menos 15 manicures no bairro.
Para marcar o Dia da Manicure, entrevistamos todas elas que apontam conquistas e desafios da profissão, as mudanças no gosto das clientes (hoje muitas vão além do esmalte) além de enfrentar um preconceito de quem não considera manicure um trabalho.
O que faz a manicure?
O trabalho de manicure consiste no cuidado de cutículas, corte das unhas, esmaltação, artes e, mais recentemente, o “nail design” prática que, basicamente, aborda o alongamento e decoração de unhas, uma técnica que tem invadido os salões de beleza em vista da alta demanda.
Antes da profissão, Mia já trabalhou na área de vendas. No entanto, decidiu investir na formação do cuidado com as unhas e mudar de área. Emily Pazini, 31, e Michele Candido, 31, também resolveram deixar de lado o trabalho com carteira assinada para ter mais flexibilidade e poder acompanhar os filhos de perto.
“É um mercado que nunca está em falta. Sempre há procura, então, se eu voltasse ao CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), não poderia acompanhar o crescimento das minhas filhas”, avalia Michele, que possui 10 anos de carreira no cuidado das unhas.
A mesma opinião é compartilhada por Lidiane da Silva, 32, manicure há 15 anos. “Me trouxe muitas coisas boas. Conquistei liberdade financeira e posso fazer meus horários e ficar com meus filhos no meu local de trabalho”, afirma.
Ela cita que o trabalho também a conectou com outras áreas da beleza, como ser cabeleireira e design de sobrancelhas.
As ferramentas de trabalho da manicure se atualizaram com o passar dos anos. Para além da esmaltação tradicional, entre os anos de 2018 e 2019, conforme contam as profissionais, se popularizaram nos salões as técnicas de alongamento.
A prática permite que as clientes aumentem o tamanho das unhas utilizando um tipo de gel que molda um novo formato desejado.
Segundo os dados coletados pela Agência Mural, entre as 15 entrevistadas, 11 trabalham com alongamento de unhas.
Segundo as profissionais, o serviço oferecido na extensão, além de aumentar o tamanho das unhas, dá mais durabilidade ao esmalte, podendo durar até quatro vezes mais que o procedimento tradicional.
“Sempre temos que nos aperfeiçoar. Nessa área todo dia tem uma novidade. Um esmalte novo, uma nova tendência, uma nova técnica”, afirma Tamyres Feitosa, 35, que trabalha como manicure desde 2014, mas em 2020 fez um curso sobre alongamento de unhas.
Lara Cabral, 38, iniciou a carreira há quatro anos e, no entanto, começou logo com o nail design, fugindo do tradicional. Ela conta que era cliente de uma manicure no bairro da Vila Izabel, próximo ao Jardim Cumbica, e foi assim que percebeu no alongamento de unhas uma oportunidade de trabalho.
“Hoje, a demanda são as unhas de gel pela facilidade que você tem de ficar com a unha pintada mais tempo”, conta. “Às vezes, na primeira louça que você lava, a esmaltação tradicional já sai. O gel traz essa praticidade de você ter uma unha que dura um mês todo”, afirma Lara.
Além de poder acompanhar os dois filhos, ela também tem percebido um ganho financeiro.
“Nunca me vi ganhando que eu ganho hoje”, diz Lara, que estima receber 50 clientes por mês.
Em vista da alta demanda, a manicure contratou uma pessoa para trabalhar no estúdio. Ela deu um curso de alongamento de unhas para Rafaela Mello, 27, que iniciou na profissão há quatro meses.
Eliane Correia, 48, trabalha como manicure e cabeleireira há quatro anos, no entanto, por outro lado, ela decidiu se manter na esmaltação tradicional, sem procurar se especializar no alongamento.
De acordo com ela, ainda assim, o serviço clássico ainda é procurado pelas clientes. “É uma profissão que nunca te deixa na mão na parte financeira. Se soubermos administrar, dá pra conquistar os objetivos”, diz.
FIBRA DE VIDRO: a profissional utiliza pequenos filamentos de vidro em cima da unha.
TIPS: a manicure molda a unha natural com uma unha postiça para dar forma à extensão.
MOLDE F1: é um tipo de unha postiça que recebe um gel que é colocado nas unhas naturais.
SQUARE ou SQUOVAL. O primeiro deixa as unhas no formato mais quadrado. O segundo deixa os cantos das unhas arredondados
BALLERINA, STILETTO e ALMOND. Tipos alongamentos que são mais populares.
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No entanto, Tatiane Alves, 29, que possui quatro anos nesse trabalho, afirma que a segurança financeira é um desafio para quem está no início da profissão, pois é preciso captar clientes, o que pode gerar frustração.
“No começo é bem difícil, pois leva um tempo até você conseguir mostrar o trabalho a um número maior de pessoas. No início, precisa de muita persistência. Mas, logo, se você faz um bom trabalho, as clientes vão te indicando para outras pessoas”, diz.
Entre as manicures entrevistadas, é de comum opinião que estar com as unhas pintadas ou decoradas é um ato importante para a autoconfiança.
‘Nós manicures não fazemos apenas unhas. Trazemos autoestima. Toda pessoa precisa do seu momento de cuidado e nós podemos proporcionar isso’
Nety Nascimento, 39, manicure
“Amo meu trabalho porque ser manicure me permite transformar unhas, autoestima, arrancar sorrisos, trazer confiança e cor para vida dessa mulherada”, afirma Helen Vieira, 28, manicure há 14 anos.
Mesmo sendo manicure, Mia afirma que recorre a outra profissional para fazer as próprias unhas. “Quero ficar de boa e receber a atenção”, brinca.
Ela destaca que o cuidado com as unhas não deve ser limitado às mulheres, pois é algo que ultrapassa o debate sobre gênero e sexualidade. Para ela, higienizar, fazer um corte correto das unhas e passar uma base também são, também, atividades para os homens.
“Empresários vêm ao salão e fazem as unhas porque precisam estar com as unhas bem feitas. O homem que corta a unha torta passa uma impressão diferente em comparação com o homem que chega com a unha bonitinha com base”, afirma a manicure.
Apesar da importância da profissão, muitas manicures relataram que já ouviram frases preconceituosas a respeito do trabalho. Suelen Freitas, 27, aponta que muitas pessoas ainda veem a área com descrédito.
Mia diz que quando começou a trabalhar como manicure ouviu pessoas que a aconselhavam a estudar outra coisa e até perguntavam se ela estava passando fome.
“Mas nem ligo. Sei o quanto eu estudei e o quanto eu estudo para isso. Já ministrei cursos sobre alongamento de unhas, inclusive. Sei o quanto ser manicure mudou a minha vida e mudou um monte de vidas por aí a fora”.
Priscila da Silva, 36, também passou por situação similar e diz que ouviu coisas como “Você é tão nova, tão bonita para estar em uma das piores profissões” e “Por que você não procura algo melhor? Manicure não é profissão’”.
“Isso me deixou muito triste”, lembra a manicure. Apesar da falta de apoio, Priscila insistiu e, por um tempo, teve de conciliar o serviço com o trabalho de costureira, profissão que não atua mais.
“Sou manicure e gosto muito do que faço. Gosto das minhas clientes, do meu trabalho e não me arrependo de ter encarado essa profissão.”
Com a atual clientela, ela afirma que não precisa mais conciliar com outro trabalho. “A gente consegue conquistar muita coisa. Valeu a pena.”
Jornalista formada pela PUC-SP, instituição onde desenvolveu sua pesquisa premiada sobre o Racionais MC's. Mãe de pet e planta, é uma canceriana apaixonada por música. Correspondente de Guarulhos, na Grande São Paulo, desde 2022.
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