A aposentada Corina Cerqueira, 87, sentiu o impacto causado pela suspensão dos encontros presenciais do grupo de idosos do qual faz parte, em Pernambués, Salvador, por conta da pandemia.
“Eu senti tanto que comecei a ficar esquecida. Isso está me prejudicando. Quando a gente está lá conversando, é só chegar em casa para contar os casos, o que foi que aprendemos. Isso já é muito importante”.
Durante três dias na semana, ela e seus vizinhos se reuniam para realização de atividades educativas, de lazer e laborativas no grupo de convivência de idosos Nova Vida, instalado no CSU (Centro Social Urbano) de Pernambués, na rua Thomaz Gonzaga.
Composto por 50 idosos, o grupo está prestes a completar 33 anos neste sábado (15) e precisou adaptar suas atividades para formatos remotos para não deixar de atender. Por conta das medidas de restrição impostas pelo combate à pandemia, somente os serviços essenciais funcionam atualmente no centro.
A psicóloga Ana Emília Ramos alerta que apesar da pandemia trazer o distanciamento físico, o isolamento afetivo não deve ser mantido, porque pode trazer riscos para a saúde mental das pessoas idosas.
“É muito importante manter contato telefônico ou ligações por vídeo chamada, com familiares, amigos e pessoas significativas para diminuir a saudade, buscar apoio emocional, dividir os medos e preocupações, mas também compartilhar estratégias de enfrentamento que podem promover o fortalecimento de forças pessoais”.
Assim como Corina, a aposentada Estelita de Jesus Conceição, 61, relata que no início da suspensão dos encontros ficou parada. Depois, decidiu caminhar.
“Antes, eu andava todo dia de manhã. Pegava uma senhorinha [do grupo] e andava até o Conjunto São Judas Tadeu. Depois, deixava ela em casa e voltava para a minha. Mas, nesses tempos, deixei de sair”.
A assistente social e coordenadora do CSU, Rose Rian, que também é técnica do Nova Vida, explica como os idosos vêm sendo acompanhados à distância.
“As atividades laborativas, educativas e de lazer estão sendo desenvolvidas em formatos acessíveis com recursos tecnológicos, por vezes limitado e às vezes ampliado, vai dependendo do incentivo à pesquisa que vai sendo aceita e estimulada para cada idoso (a)”.
Apesar das dificuldades no uso das novas tecnologias, Rose ressalta a boa aceitação por parte dos idosos, já que 30% tiveram contato com oficinas de informática.
“Tivemos alguns idosos que já estão utilizando o Instagram, outros usam apenas o WhatsApp e uma menor parte usa telefone fixo residencial ou celular só para recebimento de ligações”, acrescenta.
Corina, por exemplo, passou a receber ligações das voluntárias do Nova Vida, que oferecem uma escuta voltada para o cuidado da saúde mental. “Quando recebo a ligação, eu renovo. O tempo se alegra, não existe mais tristeza, não existe mais nada”. A idosa também tem apoiado as amigas. “Ligo para minhas colegas e elas ligam para mim”, diz.
Já Estelita passou a interagir com as colegas por meio do grupo no WhatsApp, além de acessar os conteúdos e as atividades disponibilizadas. “A gente conversa, as responsáveis ligam, mandam vídeos de aula de ioga, vídeos para fazermos exercícios”, diz.
Considerada uma das fundadoras do Nova Vida, a aposentada Maria Vitória dos Santos, 98, recebe o apoio da filha, a professora Janete Santos, 50. “Sempre gravo no WhatsApp do grupo, ela tomando café, mandando beijo para as amigas. Tem vídeos dela fazendo ginástica e dizendo para as amigas como ela faz”, detalha Janete.
CONTRA SOLIDÃO
Corina soube da existência do grupo em um momento em que não sabia lidar com a solidão. Ela trabalhou como merendeira e permaneceu na profissão até se aposentar. “Quando saiu no Diário Oficial que estava aposentada, eu comecei a chorar. Não queria passar o [tempo] sem uma pessoa para conversar, com o marido trabalhando”, relembra.
Para a psicóloga Ana Emília Ramos, os grupos de convivência contribuem para proteção da saúde mental das pessoas idosas, por meio do suporte social, além de proteger contra a solidão e o avanço da depressão.
“Os grupos de convivência também podem fornecer suporte emocional através dos vínculos afetivos significativos que podem ser estabelecidos. Além de se questionar a crença social de que o envelhecimento está associado às ideias de inatividade e deterioração”, acrescenta.
Rose Rian elenca algumas mudanças positivas no comportamento dos participantes. “Percebemos autonomia do idoso, elevação da autoestima, desenvoltura no interesse da participação social e comunitária, aproximação das relações intrafamiliares, motivação à promoção de prática de atividades físicas, saindo do sedentarismo, entre outros”.
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O grupo oferece atividades com enfoque no lazer, na educação e nas práticas laborais. Estelita ressalta os resultados dos exercícios físicos e experiências vividas em coletivo. “Quando cheguei aqui, aprendi, porque, no período da manhã, eu tinha que fazer caminhada na quadra. Aqui a gente se diverte. Jogamos baralho, dominó, dama, fazemos artesanato”.
Também são oferecidas atividades educativas que propiciam a troca de conhecimentos, por meio de palestras, rodas de conversa, com a presença de convidados e parceiros multiprofissionais. Já as atividades laborais proporcionam qualificação profissional e tecnológica que buscam incentivar o potencial empreendedor dos participantes.
Com todas essas ações, a continuidade do Nova Vida, aniversariante do mês, é um desejo coletivo comum. “Eu não sabia que a gente podia viver mais feliz. Então, a vida melhorou. Queria que o grupo não fracassasse, que se animasse mais, para ir para frente, com mais alegria e tudo de bom”, diz Maria Vitória, integrante há 30 anos.