Relato em primeira pessoa da mãe e jornalista Ira Romão
Perder um filho, independentemente do período, é uma dor que paralisa e mutila por dentro. Quando isso ocorre num período tão prematuro, a dor do que não foi vivido nos sufoca, ao mesmo tempo que nos esvazia
No entanto, a morte de um filho não é o fim da maternidade, não importa quanto tempo ele permaneceu com sua mãe
É inexplicável a conexão entre uma mãe e um filho. E é por isso que é tão difícil tentar explicar como é estar em uma maternidade para dar à luz, e depois disso, voltar para casa com os braços vazios
A passagem da minha pequena me permitiu conhecer um universo – das mães de anjos – que eu até via, mas não enxergava quão profundo era. Uma vez neste universo, os filhos gestados jamais serão esquecidos por suas mães
Realidade que comprovei, inesperadamente, durante o velório da minha filha. Naquele dia, duas conhecidas, em momentos distintos, ao me abraçarem, confidenciaram que entendiam o que eu estava sentindo porque haviam passado por perdas gestacionais décadas atrás
Um ponto comum nessas histórias, é que, em algum momento do luto, essas mães tiveram suas dores, mesmo que inconscientemente ou inocentemente, ignoradas e anuladas
É como se não tivéssemos direito de sentir essa dor. Nem de recordar a existência de nossos anjinhos, que só nos trouxeram coisas boas. Afinal, mãe é mãe e ponto
Ira Romão e o marido durante a gravidez de Heloísa, arquivo pessoal
Texto: Ira Romão Edição: Sarah Fernandes Ilustrações e montagem: Magno Borges