Ato 3: Capacitismo

por Kelvin França De Lamare, 24, artista e criador de conteúdo sobre neurodivergência,  da Casa Verde, zona norte

“Capacitismo é a tentativa de outras dizerem o que somos capazes de fazer.  É o ato de resumir nossa individualidade apenas à deficiência, em uma visão estereotipada do que é ser neurodivergente”

Aos 21 anos, Kelvin foi diagnosticado com o Transtorno do Espectro Autista nível 1, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, Altas Habilidades e Superdotação.

“[Na infância] era muito difícil prestar atenção ou manter a concentração na aula. Eu não sabia que ouvia diferente das pessoas. Quando o assunto é desinteressante para um autista, TDAH e superdotado, é mais difícil absorver conteúdo”

“Por ignorância, eu era agredido ou contido nas crises de meltdown [crise nervosa], porque achavam que era um surto. Eu era taxado como preguiçoso e desleixado nos episódios de shutdown[desligamento do corpo]" - ambos são causados pelo excesso de estímulos

Para Kelvin, o capacitismo também tem recortes.  Se periférico, negro e LGBTIAPN+, como ele, o preconceito se acentua.

Nas quebradas, os desafios podem ser ainda maiores, por sobrecarga de estímulos ou dificuldade de garantir direitos, como assento preferencial no transporte público.

“Na periferia tem a dinâmica do toque, do afeto. Às vezes eu falo: ‘não encosta em mim que eu não gosto’, então a pessoa me acha arrogante, subjugando nossos desafios”

LUTANDO CONTRA É fundamental não invalidar ou estereotipar “Ouço que meu autismo é leve e que não pareço ou que é frescura... Mesmo que a pessoa esteja tentando elogiar, é muito capacitista. A gente odeia ouvir"

Outro ponto é ampliar o acesso aos diagnósticos, que são caros e não fornecidos pelo SUS, além dos acompanhamentos profissionais. Propiciar espaços adaptados e melhorar a acessibilidade em escolas, equipamentos de cultura e locais esporte é urgente.

Buscar informação e debater o tema é obrigação de todos. “Na periferia é onde demora mais pra chegar a informação. Quando a gente vem com informação, dado, fato, a gente reformula nosso conhecimento”

“O capacitismo é ruim até para as pessoas sem deficiência, porque uma sociedade inclusiva é boa para todos”. Em seu instagram, Kelvin discute neurodiversidade, acessibilidade e vida na periferia de forma descomplicada.

Texto: Jacqueline Maria da Silva  Edição: Sarah Fernandes Imagens: Léu Britto Montagem: Magno Borges