Por: Malu Marinho
Notícia
Publicado em 28.03.2024 | 17:18 | Alterado em 28.03.2024 | 17:37
Ovos de Páscoa trufados com dois sabores, kits infantis e 90% dos produtos com valores mantidos do ano passado foram alguns dos diferenciais propostos pela padaria e confeitaria Jardim das Delícias, em Noronha, bairro do adjacente ao Grajaú, na zona sul de São Paulo, para atrair a clientela. As donas do negócio comemoram as mais de 115 encomendas no período.
“A Páscoa sempre foi nosso carro-chefe, assim como as festas no geral. Então, vemos que essa expectativa foi alcançada e superada com as novidades de tabletes de chocolate, ovos recheados meio a meio e os kits que pensamos para as crianças”, diz a confeiteira Sandra Freire, 49, uma das proprietárias do Jardim das Delícias.
Mônica Freire, 26, filha de Sandra e sócia do negócio, destaca a importância de trabalhar com ingredientes de qualidade e a novidade de trazer dois sabores para atender uma demanda da época.
“Posso dizer que o fato de fazermos ovos trufados meio a meio teve bastante impacto também, pois muita gente pedia por isso e nunca tínhamos feito até esse ano. Além de que quem compra com a gente sabe um pouco da nossa história, isso é algo que deve fazer a diferença”, finaliza Mônica.
A história do empreendimento surge a partir do desejo de criar um espaço sofisticado com essência feminina e feminista para a periferia. Além da mãe, Mônica conta na administração com a tia Simone e a irmã Amanda.
Por ser uma confeitaria comandada por mulheres, as sócias alegam já ter enfrentado situações delicadas com clientes masculinos. “Às vezes chegam perguntando onde está ‘o dono’ e respondo: eu sou ‘a dona’”, diz Mônica.
Ela relata que a organização da equipe formada exclusivamente por mulheres surgiu de forma orgânica, mas, com o tempo, refletiram sobre a importância de oferecer oportunidades para as mulheres da região. “Por exemplo, minha braço direito mora descendo a rua”, comenta Mônica.
Antes da abertura do Jardim das Delícias, as sócias trilhavam por carreiras diferentes e exaustivas. Simone Freire, 40, outra das sócias da família, enfrentou problemas de saúde por conta de uma jornada longa e distante do trabalho em um banco, até receber recomendações médicas para mudar o estilo de vida.
“Trabalhava muito longe, no metrô Vila Conceição, e só tinha tempo de vir para casa, cochilar e voltar ao trabalho, até que fui em uma consulta e falaram que se continuasse nesse ritmo, só teria mais dois anos pela frente”, explica a empresária.
Já Sandra Freire, 46, irmã de Simone, trabalhava em um salão de cabeleireiro. “Também era manicure, e comecei a ter dores no braço, por conta dos movimentos repetitivos. Tinha um desejo de trabalhar com algo próprio”, relata.
Mônica conta que o negócio, iniciado pelas duas irmãs no segundo semestre de 2014, passou por mudanças. “A gente ficou se transformando ao longo dos anos, no começo vendíamos lanche; com o tempo vieram as festas, os doces”, explica.
Bacharel em Letras pela USP (Universidade de São Paulo), Mônica relata que o primeiro contato de ajuda dela na loja foi durante a adolescência, e no período de pandemia ela assumiu o cargo comandando também o marketing do Jardim das Delícias. O Instagram @ojardimdasdelicias, com mais de 12,4 mil seguidores, traz, entre outros conteúdos, dicas da Mônica, fotos e vídeos dos produtos oferecidos pela loja.
‘No começo, me sentia estranha e pensava: ‘poxa, estou fazendo faculdade, estou na USP, e fico aqui vendendo bolo?’. Mas depois percebi que a gente não está só vendendo doce, estamos transformando vidas’, diz Mônica.
A sócia menciona uma situação que, de acordo com ela, reafirma o papel da continuidade da loja. “Durante a pandemia, uma pessoa falou que estava pensando em cometer suicídio, mas o nosso bilhetinho, que mandamos junto com o pedido, a ajudou”.
Esse cuidado da loja atrai clientes como a professora Karina Lira, 38, que compra no Jardim das Delícias desde 2022. “Gosto muito dos produtos e do carinho como tudo é enviado para nossa casa. A confeitaria é uma gracinha e como elas falam, a periferia também merece produtos de qualidade”, comenta a docente.
A manicure Adriana Santos, 30, destaca a importância da confeitaria no bairro. “É muito bom quando queremos fazer uma festa, ou comer algo diferente depois do trabalho, não precisar pegar transporte para ter esse momento”, diz.
Para Mônica, levar a sofisticação “do centro” para a periferia tem o desafio de mostrar às pessoas da comunidade que elas merecem produtos de qualidade sem a necessidade de se deslocar para obtê-los.
“Os comércios aqui da região não tinham essa preocupação com uma fachada, por exemplo. As fachadinhas foram surgindo depois da gente. Uniforme então? Nem pensar, ninguém usava uniforme. Acho que realmente a gente começou esse movimento aqui”, diz.
Um levantamento realizado pela Agência Mural mostra que existem cerca de 23 confeitarias, não provenientes de franquias, apenas dentro do distrito do Grajaú, atendendo uma população de aproximadamente 445 mil habitantes. Como consumidora, Mônica diz sentir falta de lugares para encontrar os amigos, e marcar “dates” em geral.
“Nosso sonho/objetivo é ampliar o espaço para as pessoas marcarem dates aqui, encontrarem com os amigos, e não precisarem pegar uma hora, uma hora e meia de transporte para isso”, completa a sócia.
Serviço:
Rua Norberto Riesta, 241 (Antigo 71), Jardim Noronha
Aberto de segunda a sábado, das 8h às 20h e aos domingos, das 8h às 14h.
Jornalista ProUnista formada pela PUC é correspondente do Grajaú desde 2023. Premiada pelo Instituto Vladimir Herzog na categoria Jovem Jornalista. É pesquisadora da cultura Rom/cigana, com um livro escrito a partir de relatos da comunidade.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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