Como mulher lésbica que gosta de usar o cabelo curto, Elaine Dias, 35, teve uma experiência difícil para encontrar um cabeleireiro que a agradasse. Isso tornou-se motivação para que ela, que é barbeira, empreendesse e abrisse um local focado no público LGBTQIA+, em Suzano, na Grande São Paulo.
“A gente [LGBTQIA+] tem uma grande dificuldade em realizar tarefas muito simples e sofre preconceito em locais cotidianos: supermercado, farmácia, na rua. Então, cortar o cabelo, para a gente, às vezes é um pouco desagradável e desafiador, sabe?”, diz Elaine, conhecida como Nane.
Em agosto desse ano nasceu a Lord G, barbearia especializada em cortes curtos com máquina e tesoura, independente do gênero do cliente, e que oferece um espaço acolhedor.
“Tenho certeza que outras pessoas já passaram por isso, mulheres, homens, pessoas não binárias, mulheres e homens trans. Além da questão de não saber se vai sair com a aparência que gostaria de ter, um bom corte de cabelo ou uma boa barba, ainda tem o medo de sofrer algum tipo de preconceito. A ideia é não permitir que isso aconteça.”
Segundo Elaine, o objetivo é que todos se sintam bem-vindos para cortar o cabelo no estilo que escolherem, conversar e fazer amizades. “Além de sair com um corte bacana, sair de lá se sentindo bem porque é um lugar que não existe preconceito”, explica a proprietária.
A decoração neutra também busca fugir dos padrões dos estabelecimentos de beleza convencionais, que delimitam gênero com cores como rosa (ligada a espaços femininos) e decorações como caveiras e clima de bar (normalmente em locais masculinos).
Por ter uma experiência de 12 anos como barista, unir o conceito de cafeteria e barbearia também está nos planos futuros do local recém aberto. “Quis uma coisa neutra, simples, sem arco-íris, glitter e sem caveira. A ideia é se sentir acolhido e se sentir bem”, explica.
O nome do estabelecimento foi inspirado em Lord Ganesha, deus do intelecto, da sabedoria e da fortuna segundo a religião do hinduísmo.
CABELO E AUTOESTIMA
Elaine acredita que o corte de cabelo contribui com a autoestima, é uma forma de se expressar e que por meio de técnicas de corte é possível transmitir mensagens sobre a personalidade.
Áthina Ferreira, 26, é uma das pessoas que frequentam o local. “Já fui barrada muitas vezes em barbearias quando estava com o cabelo curto e falaram que não iam cortar por eu ser mulher ou que para cabelo cacheado o único corte possível era o black [power]”, conta.
“Pode ver estampada a minha alegria de ter um espaço que além de acolher todos os tipos de pessoa na sua pluralidade ainda ser de alguém que está disposta a ousar nos cortes”, comenta Áthina.
Para Kiwi Ferreira da Silva, 18, “é bom ver a vida mais leve, principalmente quando você vai cortar o cabelo.”
Kiwi é uma pessoa não binária, transfeminina (que não se limita a ideia de homem ou mulher e sim com um gênero neutro, porém possui um grau de identificação maior com o gênero feminino) e negra. Ela conta que antes não gostava de sua aparência. A Elaine é quem cuida do cabelo dela desde que decidiu estudar barbearia.
“Não conseguia cuidar do meu cabelo, não conseguia fazer nada com ele e isso me frustrava demais. E aí vim aqui e ela me mostrou o poder de usar o cabelo afro. Então muita parte da minha história com o meu cabelo foi graças a Nane.”
“Ser mulher, lésbica, barbeira e dona de uma barbearia que foca na minha galera é uma realização, só tenho a agradecer e sou muito feliz por estar conseguindo conquistar esse espaço”, comemora Elaine.
Endereço: Rua Amélia Guerra, 208B, Vila Amorim – Suzano
Horário de funcionamento: De terça a sábado, das 10h às 18h