No centro histórico de Santana de Parnaíba, as pessoas se encontram. Com o grupo do samba reunido, o cortejo anda pelas ruas, entoa canções. O movimento só faz algumas pausas em algumas casas e bares para pedir pinga.
“Carreira de paca, carreira de lebre / Traz a pinga que nois bebe”, são os versos para pedir a bebida. Depois que consegue, o grupo canta “Por esse litro tão querido / Obrigado meu amigo”.
Assim vai noite adentro na cidade a 40 km da capital, localizada na região metropolitana de São Paulo.
O município, fundado em 1625, mantém um dos mais tradicionais carnavais da Grande São Paulo, com marchinhas, fantasias de fantasmas e o samba de bumbo. Em geral, as atividades são no centro histórico da cidade de 130 mil habitantes.
Morador da região, o autônomo Leandro Daher, 45, participa de, ao menos, quatro grupos no município: entre eles, dois sambas de bumbo, de origem rural paulista com influência africana.
“É uma festa sustentada pela história, como o samba de bumbo. Há uma vontade nossa de ‘fazer acontecer’. Existe um clima de cidade pequena. Por mais que tenha mais de 120 mil habitantes, o centro histórico é minúsculo”, observa.
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“O samba sai na rua, com todo mundo atrás, empregando um ritmo africano, algo que lembra uma batida de guerra. Isso faz com que você participe da magia”, completa.
FANTASMAS
O carnaval de Santana de Parnaíba é composto por vários grupos musicais, como blocos e escolas de samba.
O Grito da Noite é o samba de maior relevância, abrindo as comemorações carnavalescas na noite de sexta-feira (21).
Nesta manifestação, os moradores produzem figuras de personagens da cidade, que são homenageados ou satirizados nos sambas e nas histórias.
Ao som dos instrumentos bumbo, caixa e chocalho, os foliões, vestidos com túnicas ou com cabeções de caveira, andam até o cemitério da região.
A tradição é baseada em uma história folclórica. Durante um cortejo de assombrações, a chamada “Procissão das Almas”, Henrique Preto, negro “filho do Ventre Livre”, resolveu desafiar essa interdição e olhar a passagem do cortejo.
Um dos fiéis deu a ele uma vela para que guardasse até o dia seguinte da procissão. Dias depois, a pessoa foi até sua casa a fim de recuperar o pertence, mas o objeto se transformou em um fêmur e o dono desapareceu.
Assustado, Henrique Preto teria saído à rua aos gritos, batendo seu bumbo até a porta do cemitério, ‘para espantar as almas’, no que passou a ser imitado por seus amigos. Eles passaram a se vestir de fantasma e tocar bumbo até a porta do cemitério, o que hoje é chamado de Noite dos Fantasmas.
O SAMBA SAI NO BUMBO
Outra tradição na região é o Samba de Bumbo, também conhecido como Samba Campineiro, Samba de Pirapora, Samba de Roda ou Samba do Lenço. Junto do Jongo e do Batuque de Umbigada, o samba faz parte da trilogia das manifestações negras originadas no tempo da escravidão e que são praticadas no Estado de São Paulo.
“A festa de carnaval levada pelo samba de bumbo em Santana de Parnaíba é um evento cuja proporção permite que se acionem relações sociais e se brinque simbolicamente com muitos dos sentidos locais”, diz Simone Toji no artigo Samba e carnaval à paulista, uma folia em Santana de Parnaíba..
“O cantar conjunto torna o cortejo, ao menos temporariamente, uma comunidade de sentido folião”, completa o estudo.
Até a década de 1930, o samba de bumbo estava presente nos redutos negros da capital paulista e teve como ponto de encontro a cidade de Pirapora, durante as festas do Bom Jesus, em agosto. Hoje, o ritmo é realizado nas cidades de Mauá, Pirapora do Bom Jesus, Santana de Parnaíba e Vinhedo.
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São usados apenas instrumentos de percussão. Os bumbos e as caixas são de estilo europeu, produzidos em madeira e com peles de cabrito no dois lados, são percutidos por baquetas e afinados por cordas. Os chocalhos têm formas variadas. Também ocorre a presença de pandeiros e reco-recos de bambu ou de chifre.
HISTÓRIA DA REGIÃO
Santana de Parnaíba fica na região metropolitana de São Paulo e faz limite com municípios próximos da capital, como Osasco, Barueri e Pirapora do do Bom Jesus.
A sua data de criação é a mesma que a fazenda do casal Manoel Fernandes e Suzana Dias, em 1580. A partir daí, começou o povoamento do local, segundo pesquisas históricas.
Décadas depois, em 1625, o local se destacou como vila colonial, devido a posição considerada estratégica por bandeirantes que iriam adentrar o sertão seguindo o curso do Rio Tietê.