A aposentada Jaci Maria de Jesus, 62, tinha acabado de sair de um supermercado no Campo Limpo, zona sul de São Paulo, quando foi abordada pela reportagem da Agência Mural.
Com duas sacolas nas mãos, ela e o marido tinham gastado R$ 350 para comprar pacotes de linguiça, carne de porco, e alguns produtos de limpeza. “Cada dia a gente fica mais triste. Vou pagar essa compra hoje e já não tem mais nada”, comenta Jaci.
Desta vez, o Natal na casa da família vai ser diferente dos anteriores. A mesa farta com a tradicional maionese de legumes e o peru será substituída por um jantar mais simples, do qual só participarão o marido e os filhos.
A presença dos amigos em uma grande festa parece uma lembrança de outro tempo. “A gente se reunia com os amigos, cada um levava uma coisa. Agora todo mundo está na sua casa, ninguém nem fala nada”, lamenta a doméstica.
Com a alta do preço dos alimentos, bancar os custos da reunião natalina ficou mais difícil, conta Jaci. Ela cita o preço da cebola, que teve alta de 23% em novembro, e sai por R$ 10,90 o quilo nos mercados do bairro. Para ela, o cenário faz com que as celebrações não tenham sentido.
“Comemorar o quê? Não tem nada para comemorar, as coisas estão muito complicadas para ficar comemorando”, diz Jaci emocionada.
Segundo levantamento feito pela FGV IBRE (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), a pedido da BBC Brasil, o preço dos alimentos tradicionalmente consumidos nesta época do ano está 20% mais caro em relação ao Natal passado.
Além da cebola, chama a atenção também o aumento acumulado do preço da maionese e da batata inglesa. Ambos ficaram cerca de 29% mais caros. O frango inteiro subiu 11,9%. Quem teve pouca variação foram as carnes suínas, como o pernil e o lombo, com aumento de menos de 1% em comparação a 2021.
Como as coisas mudaram
Dilza Moreira Dantas, 57, mora sozinha em São Paulo e costumava celebrar a chegada do Ano Novo com amigos. A ceia contava com feijão tropeiro e tinha champagne para brindar a virada.
“Quando vejo as fotos, penso como as coisas mudaram”, afirma a moradora do Jardim Ângela, na zona sul.
Desde 2020, quando perdeu o emprego de ajudante de cozinha durante a pandemia, Dilza vive apenas com o Auxílio Brasil e o dinheiro que consegue vendendo algumas peças de artesanato. “Tô economizando no que posso”, explica ela. Neste fim de ano, ela não encontrará os amigos para a ceia do Ano Novo.
Para que os R$ 600 do Auxílio Brasil durem até o fim do mês, Dilza busca promoções nos mercados do bairro. “Vou em 3, 4 supermercados procurando o que está mais em conta”, afirma.
Ela conta que a alta no preço dos alimentos tem atingido até o pé de galinha, que ela compra para fazer sopa. Antes, o quilo do alimento saia por R$ 2. Agora, chega a ser vendido por R$ 9,90, segundo Dilza.
A moradora do Jardim Ângela lamenta não conseguir vaga no mercado de trabalho. “Fiz duas entrevistas que a mulher falou ‘a gente só pega até 40 anos’”, conta.
Funcionária de um supermercado no Jardim Ângela, a auxiliar de limpeza Maria José Castro, 60, acompanha de perto as oscilações nos preços nas prateleiras. “Quando tem promoção, eu aproveito e compro”, conta a trabalhadora.
Na casa dela, a ceia de Natal vai ter frango no lugar das tradicionais carnes natalinas, como pernil e peru. “Tem que fazer diferente [este ano] porque as coisas estão muito caras”.
A troca dos pratos clássicos também vai ser a saída na casa de Fátima Girotto, 58. Moradora do Campo Limpo, ela sempre fazia lasanhas para a família no Natal. Agora, o prato do cardápio da festa será outro.
“Ia fazer uma lasanha caseira, mas optei por comprar a [congelada] da Sadia”, conta ela, explicando que os frios ficaram caros demais para manter a versão anterior do prato.
O filho da dona de casa Italo Girotto, 34, conta que a expectativa é que a situação econômica melhore a partir do ano que vem. “Os preços não devem cair muito, mas a condição do brasileiro vai melhorar”, espera ele.
“A minha contribuição será nós dois [a presença dela e o filho]. No ano novo, vai ser do mesmo jeito”
Mara Rubio, 40, moradora do Jardim São José, na zona sul
A monitora escolar Mara Rubio, 40, do Jardim São José, no distrito do Capão Redondo, também na zona sul, chega a brincar sobre a alta dos preços. Ela comenta que prefere “nem olhar muito para ter uma noite tranquila de sono”. “Vou deixar para comemorar meu Natal na casa de parentes. Nos outros anos, antes da pandemia [de Covid-19], fazia em casa, depois não mais.”