Dois cineastas das periferias da zona sul de São Paulo estão fazendo uma vaquinha online para bancar os estudos em uma das escolas de cinema mais conhecidas de todo o mundo. Well Amorim, 27, do Jardim Ângela, e Nay Mendl, 28, do Grajaú, foram aprovados na EICTV (Escuela Internacional de Cine y Television), em Cuba, mas agora precisam arrecadar o dinheiro para se manter no país latino-americano.
“Para estudar lá, cada aluno precisa desembolsar 6 mil euros por ano, que é o valor da matrícula, alimentação e hospedagem”, explica Well. Sem dinheiro para pagar os custos sozinhos, os cineastas decidiram abrir um financiamento coletivo, que termina nesta quinta-feira (1º).
A meta é arrecadar R$ 86 mil, valor que bancaria as despesas de ambos no primeiro ano de curso. A partir do segundo ano, os dois podem concorrer a uma bolsa de estudos, que os ajudaria a permanecer na escola até o fim do período.
Todos os anos, apenas cinco estudantes de todo o mundo são selecionados para cada uma das oito especialidades oferecidas na escola, que foi fundada pelo escritor colombiano Gabriel García Márquez e o cineasta argentino Fernando Birri. Para Well, estudar na EICTV representa um passo importante na carreira como cineasta da quebrada.
“Ela [a EICTV] também nasceu com uma ideia de fortalecer a narrativa do que é conhecido como terceiro mundo, que são esses países da África, América Latina e Ásia, com histórias pouco reconhecidas e visibilizadas na história do cinema. Tem muito a ver com o trabalho que eu faço aqui em São Paulo”, conta.
Ele e Nay são co-fundadores, ao lado do cineasta Rosa Caldeira, da Maloka Filmes, descrito pelo trio como um “coletivo TLGB da zona sul”, que trabalha com direção criativa, consultoria e curadoria de festivais de cinema e cineclubes. Rosa, inclusive, foi o primeiro membro do grupo a ser aprovado na EICTV, em 2020, e estuda em Cuba desde então.
Juntos, os três cineastas fizeram o premiado curta-metragem Perifericu, que já recebeu mais de 30 prêmios, o longa documental Raízes e o Festival Internacional de Cinema e Cultura de Quebrada, que também levou o nome de Perifericu.
Well conta que o grupo tem projetos em andamento e que os trabalhos continuarão em curso mesmo com os estudos em Cuba.
“A gente tem dois curtas-metragens em processo de construção. Um [deles] a gente ia gravar agora em Foz do Iguaçu [no Paraná], mas, por conta de Cuba, a gente vai gravar em dezembro no período de férias da escola”, explica o cineasta.
“É um curta-metragem que conta a história de um jovem trans masculino de São Paulo que vai para Foz do Iguaçu em busca da história do pai dele.”
O outro filme que está em construção pelo coletivo é um curta-metragem sobre a história do bairro Jardim Ibirapuera, também na zona sul de São Paulo, que terá como personagem principal uma pessoa trans que passou cinco anos numa universidade fora da cidade.
Além dos curtas, Well afirma que o coletivo também está desenvolvendo um roteiro de um longa-metragem aprovado em um edital. “A ideia é construir um longa-metragem a partir desse curta que a gente vai rodar no ano que vem [sobre o Jardim Ibirapuera]”, conta.
O cofundador da Maloka Filmes garante que a bagagem das aulas vai ser revertida em conhecimento para desenvolver cada vez mais o cinema nas quebradas paulistanas.
“O nosso grande sonho retornando de Cuba, que é um sonho que a gente já vem construindo a pequenos passos, é a construção de uma escola de cinema popular no nosso território”
Well Amorim, cineasta
“A gente tem construído um espaço que se chama Ibira Lab, tem uma página no Instagram, mas que ainda não tem grandes atividades. A gente está engatinhando ainda, mas a ideia é que a gente volte de Cuba com todo esse conhecimento e possa devolver para o nosso território tudo que a gente aprender”, afirma.
Para tornar o sonho realidade, Well e Nay contam com o financiamento coletivo. Até agora, só 37% da meta para bancar o primeiro ano de estudos da dupla na EICTV foi atingida. Para contribuir, acesse o site da vaquinha.