Antes do início da pandemia de Covid-19, em março, a contabilista Flávia Lima, 26, saia por volta das 7h de casa para chegar no trabalho. Depois do decreto da quarentena, passou a trabalhar em regime de homeoffice. A mudança também alterou sua relação com os comércios locais.
Moradora de Guaianases, na zona leste, ela diz que nos últimos meses, passou a comprar mais produtos perto de casa, como padaria e mercado. “Tem uma lojinha aqui na esquina. Sempre compramos uma coisinha ou outra que está faltando em casa”, comenta. “O carro dos ovos, a gente sempre compra também”.
A tentativa de se locomover para longe foi um dos dos motivos que a levou aos comércios no bairro. “Tenho preguiça de ir longe, mas também comprar perto evita que eu ande mais de vinte minutos para conseguir algo que procuro”, indica.
A resposta de Flávia vai de encontro com informações da terceira e última parte da pesquisa “Viver em São Paulo: Especial Pandemia”, divulgada na semana passada pela Rede Nossa São Paulo em parceria com o Ibope.
Os pesquisadores entrevistaram 800 paulistanos com mais de 16 anos, das classes A, B e C, entre os dias 20 e 28 de julho. Uma das perguntas questionou quais as principais mudanças causadas pela pandemia e pelo isolamento social em relação com o bairro.
De acordo com o estudo, 45% disseram que passaram a dar mais valor ao comércio e aos prestadores de serviços locais. Outros 23% afirmaram que conheceram e compraram em estabelecimentos comerciais que não conheciam antes da pandemia.
No caso de Flávia, a ida ao mercado passou a ser somente quando não tem mais o que comer em casa. “Vamos quando falta muita coisa também e precisa comprar as coisas para o mês todo, caso contrário, preferimos os mais próximos”.
Outra coisa que motivou a mudança foi o café da manhã. Geralmente, tomava a refeição quando chegava no escritório, mas no trabalho casa houve a necessidade de comprar pães diariamente na padaria mais próxima de casa.
Morador do Jardim Jaqueline, na zona oeste, o produtor audiovisual Igor Camilo, 26, também concorda que a pandemia fez com que olhasse com mais atenção para os comércios locais.
“Esse período só ressaltou o quanto o trabalho deles é importante no nosso cotidiano”, pontua. “Antes era tudo muito no automático, tipo, só mais um pedido, mas agora a gente enxerga os riscos que eles correm e o quanto eles precisam de reconhecimento por isso, principalmente o financeiro”, completa.
Outro ponto é que a situação da crise sanitária fez com que moradores se desdobrassem para manter as contas em dia.
Nos bairros da capital, iniciativas locais surgiram durante a pandemia, com novos serviços. Alguns comerciantes começaram a apostar nas entregas em casa, alguns exemplos mostrados pela Agência Mural na página A boa do delivery.
Na Grande São Paulo, o delivery com produtos de feira foi outra saída comum. Outros chegaram a mudar de ramo para se adaptar ao período de isolamento e manter a renda.
Em Santana, na zona norte, o motoboy Luan Santana, 35, comenta que antes da pandemia já tinha o costume de comprar comida, como pastel e pizza no bairro em que mora, mas a pandemia fez aumentar a frequência do hábito.
“Por mais que eu comprasse bastante por aqui, não ficava o tempo todo em casa, mas agora não tem o que fazer, né? Fico o dia todo em casa trabalhando, me exercitando”, relata. “Então recorrer aos lugares que confio é a coisa mais provável a fazer”.
Luan também diz que comprar dos comerciantes do bairro pode ajudar a não fechar estabelecimentos. “Sei que eles, por serem de pequenos portes, são os mais fragilizados com a crise. E é agora que nós, como clientes, podemos colaborar com o consumo”.