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Do black aos louvores, sons da periferia têm de tudo um pouco

Nem só de baile de favela vive a periferia, mas de todos os sons possíveis — Foto: Priscila Gomes

Moro na periferia desde que nasci, há 32 anos. E no final dos anos 1980 eu morava no extremo leste de São Paulo, no bairro Engenheiro Manoel Feio, carinhosamente chamado de “Mané Fei”. Na época, as músicas das festas eram Bezerra da Silva, Leci Brandão, Fundo de Quintal e as famosas dos bailes blacks internacionais como Jimmy “Bo” Horne, Earth, Wind And Fire, Jean Knight, King Tee, Chubb Rock, Michael Jackson entre outros.

Hoje moro na zona norte há quase 20 anos e meu bairro é muito eclético. De um lado, minha rua é rodeada de igrejas evangélicas, com seus cantos de louvores de segunda a sexta (são três na rua da frente, duas na rua de trás e diversas em volta). De outro lado, todos os fins de semana tem festa em alguma rua.

Com isso, nos dias úteis os louvores tomam conta do bairro e se misturam com o barulho dos ônibus, pois moro próximo a um terminal. Os coletivos competem com o som das motos.

Já me acostumei com os ruídos. Afinal, é o preço que se paga pra ter transporte na porta de casa, então vale a pena.

Mas alguns moradores do bairro não gostam da diversidade ou do barulho. “O som alto durante a madrugada atrapalha meu sono, minha rotina e minha paz de espírito. O barulho dos ônibus não me incomoda”, diz Helen Ferraz, 21, estudante.

“As músicas com palavras de baixo calão constrangem quem não está na bagunça, sem contar que o volume é altíssimo. Às vezes é impossível ouvir TV ou conversar dentro de casa”, afirma Elielma dos Santos, 29, técnica têxtil.

“Aqui no nosso bairro existe muito barulho de vários tipos, não dá para assistir uma TV, desde as festas com música alta até a madrugada, mas o que mais incomoda mesmo é o barulho das motos, no bairro tem muitas”, desabafa o supervisor de vendas Amilton Guimarães, 26.

“O barulho do meu bairro não é nada agradável, pois existem várias igrejas no local que não respeitam a população, colocando suas músicas no último volume. Os vizinhos também colocam músicas altas. No final de semana o som é absurdo, não dá pra assistir uma TV. Nossa vizinhança é familiar, têm idosos e crianças”, finaliza Ezio Damasceno, analista de crédito, 22.

O que não faltam são as mixagens produzidas entre variados sons, como quando junta-se louvor e barulho de ônibus.

Já outros vizinhos do bairro apreciam o gosto musical das festas que embalam a noite e se divertem dentro de casa. “Gosto quando tem festa na rua e toca músicas da Turma do Pagode e Jeito Moleque. Até me divirto com o som, viu”, completa Ivonete Pires, Babá, 37 anos.

“Eu não gosto quando toca funk, mas adoro quando escuto forró, me animo demais. É o ritmo que mais escuto em casa. Então nessas festas, quando toca, eu divirto aqui”, finaliza Alessandra Costa, auxiliar administrativo, 38 anos.

Às sextas-feiras começam as festas, dá saudades da minha adolescência e era fã dos grupos que faziam sucesso na época. Não sei onde fica, mas da minha casa eu escuto, são sambas dos anos 90.

Salve, Bezerra da Silva.

Aos sábados, o público que curte deve ver variado, porque toca funk e forró.

Nas noites de sábado ouve-se também black music.

E domingo de manhã, da janela do meu quarto, eu sou privilegiada, já que gosto muito de música gospel. Às 8h da manhã sou acordada com louvores. Meu dia começa abençoado, espantando qualquer mau humor.

Priscila Gomes é correspondente da Vila Zilda
priscilagomes@agenciamural.org.br

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