Dentre as medidas implementadas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), atual presidente da República, está a recém-criada Secretaria Nacional de Políticas para os Territórios Periféricos, uma das cinco secretarias que compõem o Ministério das Cidades.
A secretaria é comandada por Guilherme Simões, 38, que é professor de sociologia e há 18 anos atua como militante do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto). Nascido e criado no Grajaú, no extremo sul de São Paulo, ele conta à Agência Mural que a criação dessa nova frente é o indicativo de um governo voltado às maiorias sociais do país.
“O principal objetivo é conseguirmos colocar a periferia no centro da política. Do debate da política urbana, do debate do direito à cidade e dar dignidade às pessoas que moram nos territórios periféricos”, explica. “Toda a orientação que o governo e a gestão nos passa é o combate à pobreza e não o combate aos pobres.”
A partir dessa perspetiva, Simões apresenta a urbanização das regiões periféricas como o principal ponto de atuação da secretaria.
“Primeiro, vamos pensar na prevenção de desastres (devido às consequências climáticas nas áreas de riscos), focar em salvar vidas e, posteriormente, pensar em um plano de urbanização que seja participativo e integrado às experiências territoriais”
Guilherme Simões, secretário nacional de políticas para os territórios periféricos
Segundo uma estimativa do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento de Alertas de Desastres Naturais), vinculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações, cerca de 9,5 milhões de brasileiros moram em áreas de risco sujeitas a deslizamentos, enchentes e outros desastres.
“Temos a atribuição da prevenção de riscos e estamos realizando um mapeamento das cidades de maior vulnerabilidade a desastres junto à Defesa Civil”, conta o secretário.
Ele menciona a urbanização das periferias como um objetivo interseccional que precisa, também, da atuação de outras áreas e ministérios do governo federal.
“Estamos conversando com o Ministério da Cultura, da Igualdade Racial, do Desenvolvimento Social e com a Secretaria Geral da Presidência. Todas as áreas têm relação com o povo periférico, [por isso] queremos levar essa visão da intersetorialidade para o investimento público”, diz.
Déficit na habitação
A habitação também está diretamente relacionada às periferias brasileiras – direito que é assegurado pela Constituição de 1988. As mudanças climáticas e o aumento de eventos extremos chamam a atenção para a situação de famílias em áreas de risco, ao mesmo tempo em que existe um déficit de moradias nas cidades.
Em São Paulo, o déficit habitacional, que atualmente é de 369 mil domicílios, tende a se agravar até 2030. Para suprir essa demanda, a cidade precisaria entregar uma média de 73 mil moradias por ano. Atualmente são construídas cerca de 24 mil unidades anuais.
Segundo Simões, o foco no momento é dar atenção às situações de urgência. “É preciso rever desde a captação de energia até a forma de concentração da população em determinados territórios, sem criminalizar quem ocupa esses lugares”, explica.
Dentre os recentes alagamentos no sudeste brasileiro, regiões periféricas como Itaquera e São Mateus, na zona leste de São Paulo, Parelheiros, na zona sul, e Osasco, na região metropolitana do estado, têm registrado grandes perdas para os moradores.
Para o secretário, é preciso construir saídas integradas, não apenas tirar a população das áreas de risco. “Ninguém mora em regiões propícias a desastres por opção, apenas tirá-las de lá cria outro problema, pois irão para outro lugar indevido por falta de alternativas. O mais certo é realizar obras de contenção ou de drenagem, por exemplo.”
De acordo com o governo federal, coordenar ações com foco na urbanização de assentamentos precários, na regularização fundiária urbana e implementar a Política Nacional de Habitação (junto às Secretarias Nacionais de Habitação e de Saneamento Ambiental) também são competências da Secretaria Nacional de Políticas para os Territórios Periféricos.
Economia da sobrevivência
Ao mencionar novas possibilidades, Simões enfatiza a necessidade de ter a própria periferia como referência. “Desde sempre a periferia desenvolve saídas. Na pandemia [de Covid-19], vimos cozinhas comunitárias solidárias e hortas urbanas. A periferia constrói sua própria economia da sobrevivência.”
Para ele, é preciso valorizar essas coletividades organizadas que, por si só, já são planos de ação. “O Estado precisa reconhecer essas soluções e integrar isso a um plano comum ou políticas mais estruturadas, reconhecendo a centralidade das periferias no debate urbano”, diz.
Para isso, a nova secretaria está organizando a Caravana das Periferias, que leva em consideração as particularidades das quebradas do Brasil e visa conhecer as iniciativas desenvolvidas nessas regiões.
“Com a Caravana das Periferias, queremos ir aos diversos territórios, visitar as experiências e coletividades das periferias para identificar e reconhecer as iniciativas como potenciais políticas públicas”, conclui o secretário.