‘’Ser um vereador jovem, preto e periférico é um desafio que está imbuído de uma complexidade muito grande’’, afirma Abidan Henrique (PSB), que sofreu dois pedidos de cassação ao longo do atual mandato na Câmara Municipal de Embu das Artes, na Grande São Paulo.
O último pedido de cassação foi aprovado no dia 28 de fevereiro deste ano pela grande maioria dos parlamentares do legislativo, onde a maior parte do legislativo é aliada ao prefeito Ney Santos (Republicanos).
Parlamentar de oposição, Abidan Henrique denunciou um desvio de R$2,5 milhões das áreas de saúde e de segurança do município para custeio de shows, o que a gestão nega. Ao tentar seguir com a denúncia, o vereador viu a Câmara Municipal vazia.
“Eles fugiram como ratos’’, disse Abidan em transmissão ao vivo nas redes sociais logo após se deparar com a saída dos parlamentares. Apoiadores da gestão Ney Santos usaram a fala para acusar o vereador por quebra de decoro[regra de conduta dos legisladores].
A equipe do vereador recorreu imediatamente à justiça. No dia 21 de março, o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) acatou o parecer do MP-SP (Ministério Público de São Paulo), que defendeu a tese de que Abidan estava enfrentando “perseguição política”.
Trajetória
A trajetória política de Abidan Henrique começou em 2020, quando foi eleito o vereador mais novo da história de Embu das Artes, com 23 anos. Nascido no bairro Valo Velho, em Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, ele viveu a juventude na região de Caputera, bairro que fica no limite entre Embu das Artes, Itapecerica da Serra e Cotia.
Desde o começo do mandato, ele acusa perseguição e ataques racistas na Câmara. “A violência psicológica é a mais invisível, da pressão que envolve todo esse processo parlamentar, e de você estar muitas vezes representando uma pauta de maneira solitária, com todos contra você’’, conta.
Neste momento, o vereador do PSB participa de uma coalizão junto à candidata a prefeita Rosângela Santos (PT) e aos ex-prefeitos da cidade Geraldo Cruz (PT) e Chico Brito (sem partido), enquanto a base de Ney Santos lançou Hugo Prado (Republicanos), atual vice-prefeito de Embu das Artes.
O primeiro pedido de cassação contra o mandato do vereador se deu por conta de uma denúncia contra o caso de injúria racial cometido pelo presidente da Câmara, Renato Oliveira (MDB), em janeiro de 2022.
Abidan explica que entrou com um processo para suspender o mandato de Renato Oliveira, porém não teve o apoio dos vereadores, inclusive parlamentares negros da Câmara. “Muitos falavam “negros” na terceira pessoa’’, afirma ele.
Para Abidan, ele não foi apoiado nesse caso tanto pela pressão política quanto pela falta de letramento racial dos vereadores.
“Quando eles se deparam com conflitos reais do mandato no dia a dia, que exigem deles muitas vezes tomar partido publicamente da pauta racial, eles não fazem, seja por pressão política ou por não considerar relevante”, conta o vereador.
A dificuldade nesse sentido ocorre mesmo com Embu sendo um dos legislativos com a maior presença de negros na Grande São Paulo. São nove dos 17 parlamentares, mais da metade do legislativo. Mas, muitas vezes, ter a presença de vereadores negros não significa a atuação contra o racismo.