Doze anos separaram a educadora Thaiza Cristina, 33, da cidade natal Osasco, na região oeste da Grande São Paulo. Ao voltar, trouxe na bagagem um olhar voltado para a agricultura urbana e uma alimentação mais saudável.
Thaiza se mudou do município ainda jovem para estudar ciências sociais em uma faculdade em Campinas, no interior de São Paulo. Morou em outras cidades pelo Brasil e passou algum tempo como voluntária em áreas rurais do sul de Minas Gerais.
A experiência trouxe uma nova relação com a comida e o território. Em meio à pandemia de Covid-19, ela, com apoio de educadores e amigos, criou a Ecoz, uma iniciativa de venda e doação de cestas de alimentos ecológicos plantados por pequenos produtores locais.
“A Ecoz é um ‘juntado’ de pessoas que já queriam movimentar a agricultura urbana há muito tempo”, conta Thaiza, que mora no bairro Presidente Altino. “Quando a pandemia começou, a gente acabou se juntando e partindo para ação”.
O grupo começou a atuar no dia 15 de maio e atualmente conta com cerca de 25 pessoas que trabalham aos sábados de forma voluntária na montagem e entrega das cestas.
A organização é realizada em reuniões virtuais durante a semana. Em uma quinzena são feitas entregas para quem compra e na outra, as doações para mães solo em situação de pobreza, principalmente dos bairros Jardim Conceição e Rochdale, também em Osasco.
Até o final de julho, 2.653 quilos de alimentos dispostos em 274 cestas solidárias foram doados.
As cestas são compostas por, no mínimo, 11 itens, como legumes ou tubérculos, frutas, chás, salada e tempero. “Junto com os alimentos a gente também envia um material para falar daquela planta, das propriedades e dicas de consumo”, diz Thaiza.
Quem compra tem a opção de ter a cesta entregue em casa (R$ 10 o frete para Osasco e R$ 15 para zona oeste de São Paulo) ou ainda retirar no local da montagem, que fica no bairro Campesina.
O valor da cesta é R$ 80. Duas cestas vendidas sustentam uma doada. A meta de vendas é de 80 cestas a cada 15 dias, o que garantiria a doação para 40 famílias. Porém, até agora essa quantia não foi atingida. A Ecoz também conta com uma campanha de arrecadação virtual que ajuda a garantir as doações.
AGRICULTURA ‘SEM VENENO’
Para Thaiza, levar a discussão da agricultura urbana e sem uso de componentes químicos para contextos periféricos é importante porque pode dar mais autonomia e segurança alimentar aos moradores.
“Às vezes, as periferias são desertos alimentares, porque no mercadinho só tem aqueles salgadinhos, aquela coisa industrial que é um treco de comer mas é oco por dentro”, diz.
Atualmente, Osasco conta com 15 hortas. Dessas, 12 fazem parte de um programa de economia solidária da SDTI (Secretaria de Desenvolvimento, Trabalho e Inclusão), da prefeitura. Famílias em situação de vulnerabilidade podem se cadastrar e utilizar o terreno para plantar e comercializar os alimentos desde que não utilizem agroquímicos.
Thaiza explica que alimentos plantados sem os químicos são ricos em vitaminas. “Não é só a questão de não ter veneno. Os alimentos cultivados em um solo rico, em uma terra bem tratada, terão mais nutrientes quem vai consumir”.
Ao todo, 12 agricultores urbanos e seis rurais compõem a rede da Ecoz. O grupo também deseja ajudar a aumentar a plantação de mais variedades na cidade, o que tem potencial de ajudar o meio ambiente.
“A gente prioriza comprar os produtos para as cestas das hortas locais, apoiando assim o pequeno agricultor, mas têm alguns que não encontramos”, diz. “Há muita folha, tempero, chá, mas ciclos mais longos geralmente demoram para produzir e vender, então dificilmente você acha uma beterraba, uma batata doce, por exemplo”.
O intuito é incentivar novas plantações em casas, lajes ou onde houver um terreno parado, o que pode trazer mais autonomia, principalmente em momentos de crise.
“Quando a gente muda essa relação, nem que seja cultivando um temperinho ali na janela da cozinha, há um empoderamento, até um resgate de certa ancestralidade daquilo que é essencial: saber plantar, colher e preparar o seu alimento”, comenta. “Às vezes as pessoas se alienam disso nas cidades”
O grupo conseguiu um trator apelidado de “Jorge”, que está na cidade para, no futuro, ajudar nessas plantações.
Por enquanto, eles procuram pessoas que tenham um terreno parado e queiram fazer alguma parceria, além de aceitar doações de ferramentas para o plantio. “Queremos tocar essa frente da agricultura na cidade e continuar com o esquema das cestas”.
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