As primeiras notícias sobre a chegada da pandemia da Covid-19 ao Brasil trouxeram receio para algumas moradoras diagnosticadas com diabetes em Pernambués. O bairro é considerado a região com maior número de casos em Salvador, com 3.786 registros, segundo levantamento da Secretaria Municipal da Saúde.
A cozinheira Cássia Muniz, 49, diagnosticada com diabetes tipo 1, ligou o alerta ao saber do vírus. “Fiquei muito preocupada. Senti medo, de certa forma, porque as pessoas ficavam falando: ‘Você é de risco, você é de risco’”.
Para a aposentada Elisete Ferreira, 61, diagnosticada com diabetes tipo 2, o auxílio do filho tem sido essencial durante a quarentena. “Eu me sentia segura dentro de casa. Meu filho tinha cuidado comigo. Quando chegava da rua, ele usava máscara, usava luva, tirava a roupa”, diz.
Já Reijane Lima, gestora de recursos humanos, 28, conta que foi surpreendida com uma gravidez. “Foi um susto descobrir a gestação no período da pandemia”. E disse ter redobrado os cuidados.
De olho nos altos índices de casos na região, as três moradoras afirmam ter evitado ao máximo sair de casa. “[Uso] máscara e álcool gel. Evito entrar em mercado cheio, por sinal, no Forte, tem meses que não entro”, diz Cássia.
Segundo o comunicado da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), as pessoas com a doença fazem parte dos segmentos da população com maior possibilidade de desenvolver complicações, caso adquiram a Covid-19.
Para a redução dos riscos, a pessoa com diabetes precisa ter adesão ao tratamento e seguir as orientações médicas para o bom controle do diabetes, como explica a nutricionista, professora da UFBA (Universidade Federal da Bahia) e educadora em diabetes, Viviane Sahade.
“Os pilares do tratamento do diabetes são: alimentação, prática da atividade física, o uso regular dos medicamentos prescritos, sono adequado e equilíbrio emocional. Esses cinco pilares se aplicam não só ao diabetes, mas para todas as outras doenças e a alimentação vai permear o tratamento independente de estar no momento de pandemia ou não”, afirma.
Cássia conta que a pandemia não alterou sua rotina de cuidados com a doença. ”Eu malho para ganhar massa muscular e faço também atividade física. Faço alongamento, faço dança em casa, nada em academia”.
Ao longo da semana, com o uso do glicosímetro, a cozinheira monitora o índice antes e duas horas depois das refeições, com orientação médica.
“Tenho feito a monitorização em casa, e o meu açúcar, graças a Deus, está bem controlado, com as atividades físicas que faço”, relata Cássia.
Durante o período da gestação, Reijane lembra que aumentou o número de vezes em que fez o controle da glicose, além de ter modificado o plano alimentar. “Diminui a quantidade de carboidratos que comia, mas tudo com orientação médica. Tiveram de ser feitas algumas mudanças de dosagens na insulina”, conta.
As pessoas com diabetes precisam acompanhar as taxas de glicose para que o tratamento seja eficiente, segundo a nutricionista. “Todo indivíduo diabético, seja ele DM1 ou DM2, precisa fazer a glicemia capilar, porque é essa glicemia que vai indicar se o paciente está dentro das metas estabelecidas. Estando fora das metas, esse paciente precisa saber como corrigir”, explica Viviane.
Com o nascimento da filha, Reijane reafirma a importância das medidas de precaução. “Valeu a pena ter me dedicado mais ainda por conta de Alicia. Agora, independente, se eu não estivesse grávida, ia correr atrás do mesmo jeito, para me manter saudável na pandemia”, complementa.
Já a aposentada Elisete conta que segue a dieta alimentar, usa os medicamentos rigorosamente, mas não monitorava a glicose, porque acabou de comprar o glicosímetro e as fitas. “Soube que apenas pacientes que usam insulina têm direito as fitas do SUS”.
Segundo a lei Federal 11.347/2006, as pessoas com diabetes podem receber gratuitamente, pelo Sistema Único de Saúde, medicamentos e materiais para a monitorização da glicose. Já a portaria 2.583/2007, no artigo 2, limita o acesso dos insumos aos pacientes que são dependentes da insulina.
Desde o início da pandemia, a aposentada revela que não recebia acompanhamento médico. Mas quando retornou ao atendimento na Unidade de Saúde da Família (UBS), de Pernambués, soube dos serviços oferecidos para os pacientes com diabetes. “Eu falei com a médica. Vou ligar para agendar o dia da consulta para levar os exames”, conta Elisete, que também fará uma consulta com a nutricionista.
De acordo com a informação disponível no site da Secretaria de Comunicação, da Prefeitura de Salvador, de 2019, 28.695 pessoas com diabetes estão cadastradas para acompanhamentos nas Unidades de Saúde da Família.
Diabetes e a emoção
O controle do diabetes também pode ser influenciado pela saúde emocional. As mudanças na rotina, provocadas pelo Covid 19, podem impactar na saúde mental. Segundo o livro Autocuidado e Diabetes em tempos de COVID-19, da SBD, o comportamento que provoca o estresse pode alterar a glicemia.
“O diabetes, como qualquer outra doença, sofre influência de fatores psicológicos. Os hormônios secretados na reação de estresse influenciam a taxa glicêmica. Dessa forma, mesmo tomando insulina, uma reação de estresse pode elevar a glicemia”.
Para a psicóloga Catiane Ferreira das Neves, a pandemia pode gerar consequências como a ansiedade. “Existem o medo e a preocupação em contrair o vírus e com ele as possíveis complicações físicas. Esse medo gera um estado de alerta contínuo e provoca ansiedade”.
Por isso, a psicóloga recomenda uma atenção maior com a saúde emocional. “Os impactos da pandemia são muitos, mas investir em nossa saúde mental nos ajuda a ressignificar essa experiência e convoca a nos reinventar”, complementa.
Para Elisete, a prática da respiração traz calma para os dias agitados. “Isso me relaxa muito. Fechar os olhos e respirar. No final da tarde, eu fico na minha laje, dá para ver a paisagem, o céu. Eu gosto de ficar lá”, diz.
Ao longo do período de isolamento, Cássia conta que a música trouxe bem-estar. “A música é o dia todo, todo o dia; depois das minhas orações. É uma forma de não ficar pensando besteira”.
A dança também tem trazido prazer para os dias de Cássia. “Além de ouvir música, dançar também. Meu pagode, arrocha, cantando e feliz, porque a vida é assim, né? A gente não pode ficar presa ao que não nos faz bem. A gente tem que aceitar até o dia que Deus quiser, porque uma hora vai acabar”.