Quando a campanha de 2022 começou, candidatos ao governo do estado enfatizaram a questão do empreendedorismo ao falar das periferias. Mas o que os moradores que têm os pequenos negócios nas quebradas querem dos governantes a partir de 2023?
Combater o desemprego e a fome, investir em cursos de capacitação e oferecer mais linhas de crédito estão entre as demandas, apontam comerciantes e prestadores de serviços entrevistados pela Agência Mural.
PLANOS DE GOVERNO: confira o que que candidatos a governador e presidente têm de propostas para empreendedores das periferias.
Os pequenos empreendedores estão na ponta da cadeia produtiva e vivem o impacto direto das oscilações na economia, como a alta da inflação e o desemprego. A cabeleireira Cícera Alves, 59, explica. “Se eles [os clientes] têm dinheiro para comprar um pão, eles não vão deixar de comprar o pão para cortar o cabelo”, comenta.
Nos últimos anos, a crise econômica fez diminuir os clientes que procuram o salão de beleza dela, no bairro Jardim Casablanca, no Jardim São Luís, zona sul de São Paulo. Ela defende que os próximos presidente e governador trabalhem o “básico” para ajudar: “que [a população] tenha emprego e ninguém passe fome”, explica.
“O que as pessoas estão ganhando realmente é só para pagar a conta, principalmente a classe pobre. Tinha que baixar esses preços que estão tudo lá em cima”, afirma Cícera.
Moradora de Perus, na zona norte da capital, e dona de uma loja de materiais para construção, Bernardete Souza, 47, também aponta que o combate ao desemprego deve ser a prioridade “número um” de quem vencer a eleição. O empreendimento dela chegou a ter duas unidades antes da pandemia, mas ela precisou fechar um dos pontos com a piora nas vendas.
“A nível federal é urgente um investimento pesado para colocar de novo a população no mercado de trabalho porque é esse ‘povão’ quem vai consumir. Eu tenho 90% da minha clientela de pessoas assalariadas”
Bernadete Souza, 47, comerciante
Ela defende ainda que a gestão estadual trabalhe para combater a desigualdade em São Paulo.
O estado mais rico do país tem atualmente 9,2% da população em idade ativa desempregada, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Entre aqueles que estão empregados, 31,1% estão na informalidade.
O barbeiro Wilton Santana da Graça, 32, é dono de um negócio do bairro Quitaúna, em Osasco, na Grande São Paulo, e defende que os próximos governantes incentivem a criação de novas empresas, “com cursos e palestras que auxiliem para o crescimento e sucesso de novos empreendedores”. Ele investiu na barbearia há seis anos, depois de ficar desempregado.
Quando a pandemia começou, Wilton ainda se recuperava financeiramente depois de “perder quase tudo” durante uma enchente que atingiu a barbearia em fevereiro de 2020 e deixou um prejuízo de R$ 30 mil. Na época ele chegou a fazer uma vaquinha para recuperar parte do valor perdido.
Durante o período de restrição das atividades econômicas por causa do coronavírus, Wilton não recebeu nenhum auxílio dos governos estadual e federal enquanto ficou com o salão de portas fechadas.
Assim como ele, a confeiteira Eloisa Souza Leonardo dos Santos, 22, também não recebeu nenhum auxílio em 2020 para manter aberto o negócio, que era voltado para a venda de doces em festas. Com os eventos suspensos, ela precisou expandir a área de atuação da confeitaria e hoje a loja se tornou uma cantina em uma escola particular.
Para Eloisa, os próximos governantes precisam ter “visão empreendedora” e serem empáticos com os administradores dos pequenos negócios. “Sem valores abusivos, impostos caríssimos”, pede a confeiteira, que também defende a criação de cursos de capacitação para empreendedores.
A empresária diz que não tem visto muitas propostas para a categoria. “Eu me sinto contemplada por propostas em outros âmbitos da minha vida, que consequentemente impactam no meu empreendedorismo, mas pautas, projetos e diálogo voltados para empreendedores está bem escasso”, afirma.
A falta de apoio das gestões estadual e federal para os pequenos negócios é criticada pelos empreendedores. Para a empresária Sheila Cristina, 30, que vive em Parada de Taipas, na zona norte de São Paulo, a categoria não tem o mesmo apoio recebido por grandes empresas.
“[Na crise] faltou apoio e estrutura para as empresas pequenas, como teve para as grandes empresas. Por isso muitas faliram durante a pandemia. Vi muita gente sem condições de pagar o aluguel”
Sheila Cristina, 30, moradora da Parada de Taipas
A empresária investiu na estamparia depois que perdeu o emprego CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), em 2020. As vendas pela internet fizeram o negócio prosperar. “Nessa época ganhei dinheiro porque o mundo estava voltado para o online”, lembra Sheila.
Para ela, os governos poderiam oferecer mais suporte, como “cursos gratuitos para as pessoas que desejam empreender”. “Têm cursos hoje no Sebrae, mas falta mais divulgação e facilidade no acesso. Esse material poderia usar uma linguagem mais simples e de fácil entendimento para pais, mães de família e pessoas de idade que não tem familiaridade com tecnologia”, finaliza.
Dono de uma loja de materiais para construção em Itaquaquecetuba, na Grande São Paulo, Edislândio Bernardo, 36, conta que a esposa chegou a fazer um curso no Sebrae para melhorar os negócios. A loja é administrada pelo casal e a irmã de Edislândio.
No começo do negócio, eles precisaram pegar um empréstimo para fazer os primeiros investimentos no material. “Pequenos fornecedores não têm incentivo de nada”, comenta o comerciante.
Para ele, linhas de crédito, com juros mais acessíveis, poderiam ser uma ferramenta para ajudar empreendedores a investir em seus negócios. “Incentivo para quem precisa aumentar, comprar caminhão novo. No meu caso, se tivesse, ajudaria bastante”, afirma Edislândio.