No CEI (Centro de Educação Infantil) Jardim Lapena I, na zona leste de São Paulo, o EVA, material emborrachado e flexível, muito utilizado em atividades escolares, não entra. O motivo é que esse produto não é reciclável e a decomposição leva de 250 a 400 anos.
No lugar dele, são usados elementos recicláveis para a aprendizagem, aulas ao ar livre, vasos de plantas e arbustos.
Por lá, 640 alunos matriculados, na faixa etária de 3 a 6 anos, participam do Projeto Sustentabilidade. Dentro do período escolar, todos os alunos desenvolvem atividades, a começar pela acessibilidade ao jardim, que tem plantações feitas e cuidadas pelas crianças.
Além disso, toda semana elas participam de uma caminhada ecológica pelo território, a fim de saber sobre a história do lugar em que vivem e também refletem a respeito das mudanças urbanas e climáticas. Outra atividade muito comum é a reciclagem, que estimula a criatividade de cada um com a confecção de brinquedos de garrafa PET e papelão.
A escola também se tornou polo de outras ações como a coleta seletiva de óleo de cozinha, horta terapêutica, compostagem e plano alimentar com produtos colhidos da horta orgânica.
Essas experiências começaram em 2021 e foram uma forma de tentar resolver o acúmulo de lixo depositado ao redor da unidade. “Era um problema enfrentado, mas conseguimos reverter isso com informação, ações e também solicitamos à Prefeitura a operação cata-bagulho”, conta Rita Rodrigues, 42, diretora do colégio.
Para buscar mais conhecimento a respeito da agenda climática, as professoras do CEI participaram de oficinas educativas do coletivo de mulheres chamado “Guardiãs”, localizado no Jardim Lapenna, e o Instituto Lixo Zero.
A professora Janete Gonçalves, 48, associa a especialização em contação de histórias com as técnicas de ensino sobre a jardinagem. “Todas as crianças participam do processo de plantação, adubar a terra, conhecer a textura dos alimentos e verduras por meio da contação de história de maneira bem lúdica.”
“Muito se fala sobre o lugar que deixaremos para a nova geração, mas pouco se fala sobre quem deixaremos. A transformação começa de dentro para fora”
Tatiane Lourenço, educadora
Desafios climáticos
Entre os desafios da unidade está o descarte ecologicamente correto das fraldas utilizadas pelos alunos, tema que, segundo a diretora Rita, precisa ser trabalhado na escola.
“Mesmo fazendo a separação do lixo, as fraldas descartáveis levam 600 anos para se decompor. O nosso intuito é fechar uma parceria com uma instituição que recolha as fraldas e transformem em matéria-prima para novos produtos”, conta.
Outra adversidade que atravessa o território e impacta os alunos do Jardim Lapenna são as enchentes. A região que fica próxima ao rio Tietê convive há décadas com o problema, sendo um dos locais mais afetados da cidade. Por lá, houve anos em que as ruas ficaram semanas alagadas.
A diretora relata que muitos alunos já ficaram ilhados em casa ou precisaram usar galochas para transitarem na água. Dentro da temática, as professoras buscam discutir as mudanças climáticas usando o teatro, filmes, desenhos e propondo roda de conversa.
“A escola acaba sendo um refúgio para os alunos. No interior do CEI, não entra água. E mesmo com as casas invadidas pela enchente, muitos responsáveis preferem trazer as crianças para poderem comer, tomar banho e brincar”, relata Rita.
Para ela, seria fundamental a construção de uma nova entrada na escola que evitasse a passagem dos pais e crianças em pontos de alagamentos nos períodos chuvosos.
Seguindo o exemplo
Quem termina o ensino infantil no CEI tem como colégio mais próximo para seguir os estudos, a escola estadual Pedro Moreira, localizada a 250 metros. Por lá, inspirados no trabalho do CEI Jardim Lapena I, a unidade tem discutido ações em prol do ambiente e como a mudança climática afeta o território.
Desde outubro de 2022, os educadores têm buscado mais informações em oficinas, workshops e encontros para sistematizar o programa de sustentabilidade da unidade. Até o momento já foi realizada a semana de compostagem – que traz o processo de reciclagem do lixo orgânico, transformando em adubo natural.
Além disso, há também um mapeamento e parceria com o coletivo Mulheres do GAU para a introdução de uma horta terapêutica – que são plantações voltadas para o bem-estar físico e mental feitas por alunos.
Wesley Barreto, 15, afirma que as aulas têm sido importantes para compreender os eventos climáticos que acontecem no território. “É bem legal porque cada um pode fazer a sua parte, sendo agente de transformação”, pontua o estudante do 1º ano do ensino médio.
O jovem convive há anos com as enchentes, que atrapalham sua ida até a escola. Para ele, é fundamental que o bairro se una em prol da causa do meio ambiente. “Só conseguiremos isso [políticas públicas] com conhecimento da agenda climática”, finaliza.
“Junto dos alunos podemos buscar soluções para os imensos problemas do bairro”, afirma o vice-diretor Cláudio Fernandes, 42.
Ele cita a necessidade de mostrar aos estudantes a importância de cobrar dos órgãos públicos a colocação de lixeiras, serviços de coleta seletiva e cata-bagulho, para reduzir os impactos ambientais.
Na escola estadual Pedro Moreira, a diferença de faixa etária dos alunos é um dos desafios enfrentados para sistematizar uma agenda climática. “Temos estudantes de ensino infantil, fundamental e médio. Por isso, precisamos oferecer o mesmo conteúdo com abordagens diferenciadas”, explica o diretor Cláudio.
O ensino das questões climáticas é amparado pela Lei Nº 9.795, que institui que a educação ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal.
Na cidade de São Paulo, a Secretaria Municipal de Educação lançou o documento “Educação Ambiental: orientações pedagógicas”, que passa a compor o currículo da cidade. O material contou com a participação de professores e especialistas na área e tem como objetivo ser subsídio em sala de aula para a discussão da agenda climática.