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Agência de Jornalismo das periferias

Por Paulo Talarico | 28.11.2019

Reportagem: Priscila Pacheco e Paulo Talarico. Infográficos: Fellipe Sales

Publicado em 28.11.2019 | 9:21 | Alterado em 16.06.2020| 11:02

RESUMO

A Agência Mural perguntou para as 39 prefeituras sobre como estão as metas das atuais gestões; no entanto, boa parte descumpre lei e ignora solicitação; do outro lado, maioria dos que respondem não envia dados claros sobre o que foi feito até aqui nos atuais governos

Tempo de leitura: 6 min(s)
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O site da prefeitura de Diadema, na Grande São Paulo, tem cara de ser transparente.  Só cara. Ao acessar a página, aparece um aviso para que os moradores participem da discussão sobre o plano diretor da cidade. Na aba governo ou perto do rodapé é possível encontrar o Portal da Transparência. 

Surge ali a página da LAI (Lei de Acesso à Informação). A Agência Mural registrou um pedido em 9 de agosto. Solicitamos dados sobre a execução do plano de metas da gestão do prefeito Lauro Michels (PV), reeleito em 2017. O sistema funciona bem e deu a previsão de resposta para 29 de agosto. Quase três meses depois, nada. 

Questionamos a prefeitura sobre a execução da LAI, mas também não houve retorno. O Portal da Transparência indica 121 solicitações em tramitação, mas não mostra qual é o período.

A falta de transparência de Diadema seria ruim se fosse isolada, mas se trata de uma realidade vivida por moradores de praticamente metade da região metropolitana de São Paulo.

A Agência Mural solicitou dados dos planos de metas de todas as 39 cidades da Grande São Paulo. Delas, 17 ignoraram os pedidos. 

Das que responderam, a maioria afirmou que esse tipo de dado está na internet dentro de projetos de lei como os planos plurianuais. Em geral, se recusaram a dar mais indicações. Biritiba Mirim, Santo André, São Caetano do Sul e Taboão da Serra responderam negando as requisições. Disseram que o pedido é genérico.

Além disso, em alguns portais não foram encontradas as páginas para registrar pedidos, e em outros não havia a opção para recorrer. Ambos são obrigação das prefeituras de acordo com a LAI (Lei 12.527/2011). 

COMO RESPONDERAM AS PREFEITURAS

TRANSPARÊNCIA COMO PROMESSA

Dizer que é transparente costuma ser marca dos candidatos nas eleições. Prática que muda quando se assume o poder. 

Quando disputou a prefeitura em 2016, o prefeito de Mogi das Cruzes, Marcus Melo (PSDB), fez questão de registrar que iria “ampliar as ferramentas de transparência e controle social da administração pública”. Três anos depois, na prática, a situação não é essa. 

Com 400 mil habitantes e orçamento de R$ 1,6 bilhão por ano, o município não tem uma página de fácil acesso. Sem encontrar o e-SIC (Sistema de Informação ao Cidadão), encaminhamos um pedido por carta. A prefeitura entrou em contato e disse que precisava de um documento pessoal e do telefone para protocolar.

O documento foi enviado em 15 de agosto. Quatro dias depois foi protocolado. Três meses se passaram e nenhuma resposta. Não há canal para recorrer. 

Quem também viveu problemas para acessar dados na cidade foi Jamile Santana, 31,  co-fundadora do site Painel Jornalismo. Jamile conta que já registrou denúncias no MP (Ministério Público) contra Mogi das Cruzes e Guararema, município vizinho. 

Na ação contra Mogi, ela pontuou os empecilhos que encontrou no e-SIC, inclusive a falta de opção para abrir recurso, ao protocolar, em 12 de junho de 2019, um pedido de acesso à lista de devedores inscritos na dívida ativa do município. 

A prefeitura descumpriu o prazo de 20 dias e no dia 3 de julho, sem pedir prorrogação, informou à Jamile que o Portal da Transparência não era a via adequada. Afirmou que o pedido deveria ser feito por escrito e pessoalmente no Protocolo Geral, local de atendimento. A ação, contudo, foi arquivada pelo MP.

Em Guararema, a questão levada ao MP foi o fato de um recurso ter sido avaliado pela mesma pessoa que havia rejeitado a solicitação antes. Jamile havia enviado um pedido sobre ISS (Imposto Sobre Serviços) por e-mail e recebeu uma resposta incompleta do chefe do setor financeiro. 

“Perguntei para ele: onde entro com recurso? Coloquei lá os argumentos, e quem julgou foi o próprio chefe que havia me atendido na primeira vez”, relembra. Segundo o artigo 15 da LAI, o recurso deve ser avaliado por alguém de hierarquia superior.

A falta de cumprimento da LAI em Mogi das Cruzes foi identificada pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado). Em parecer de agosto, o conselheiro Sidney Beraldo listou cinco tipo de falhas. “Apesar de ter sido criado um sistema de informação ao cidadão, não existe legislação municipal que trate do acesso à informação”, afirmou. 

Com essa situação, dados do planejamento “não são divulgadas com os programas e metas de ações governamentais”. Citou também a falta de informações sobre repasses feitos pela gestão para entidades; falta de dados sobre as licitações e desatualização dos dados sobre obras. 

O parecer de Beraldo foi emitido em agosto e se refere a 2017, primeiro ano da gestão Melo. O período de 2018 ainda está sob análise. Apesar das ressalvas, o TCE pediu a aprovação das contas e emitiu recomendações para a prefeitura. Cabe aos vereadores decidirem se aprovam ou não. 

COMO ESTÃO AS PLATAFORMAS

POUCOS AVANÇOS

A falta de transparência identificada é semelhante a apurada pela Agência Mural em 2018, quando identificamos ao menos 20 cidades que dificultam o acesso à informação pública. Na época, boa parte delas não tinha e-SIC visível. 

Todavia, desta vez optamos por enviar os pedidos por carta para as prefeituras nas quais não localizamos o sistema ou apresentavam algum problema que impedia o registro. Foram 13 envios pelo Correio. 

Destes, três cidades responderam o recebimento: Suzano, que enviou uma resposta; Biritiba Mirim, que rejeitou a solicitação, e Mogi, citado acima. Outras nove cidades simplesmente ignoraram a correspondência. Inclusive, o envelope enviado para Embu das Artes retornou mesmo com o endereço sendo o presente no site oficial da prefeitura.

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Nas cidades onde não foi localizada plataforma, foi enviado pedido pelos Correios. Embu das Artes devolveu correspondência @Anderson Meneses/Agência Mural

Os problemas de transparência vão além das prefeituras das cidades da Grande São Paulo. 

Em maio, a ONG Artigo 19 divulgou um relatório com resultados da avaliação sobre o funcionamento dos e-SICs dos 26 estados e do Distrito Federal, da CGU (Controladoria Geral da União), do Senado, da Câmara dos Deputados, do STF (Supremo Tribunal Federal) e do STJ (Superior Tribunal de Justiça). 

Nenhum órgão conseguiu alcançar 100% dos critérios definidos, sendo que a CGU foi o que teve a maior pontuação, 93%, seguido pelos estados de Alagoas e Maranhão, ambos com 80%. Em Roraima não foi possível nem fazer cadastro, pois o sistema estava fora do ar. 

A Agência Mural detectou problema semelhante em Juquitiba, cidade do sudoeste da Grande São Paulo. O site da prefeitura esteve fora do ar em alguns momentos do mês de outubro. Antes, não havíamos localizado o e-SIC para fazer pedidos.

COMO USAR A LEI DE ACESSO?

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ESCALA BRASIL TRANSPARENTE

Um relatório da CGU (Controladoria Geral da União) também ajuda a mostrar o cenário da Grande São Paulo. A Escala Brasil Transparente avaliou diversos indicadores como o cumprimento da LAI, a facilidade de acesso no site, entre outros quesitos de transparência.

O levantamento publicado no final do ano passado mostra sete cidades com notas inferiores a cinco. Apenas dois municípios da região metropolitana ficaram entre os 100 mais transparentes. No entanto, o melhor deles, Caieiras, também foi um dos que não respondeu ao pedido via LAI feito pela Agência Mural. 

POR QUE NÃO CUMPRIMOS?

Mas o que leva uma cidade a não cumprir uma lei em vigor há sete anos? Perguntamos para Fabiano Angélico, especialista em transparência pública. 

Um dos pontos é que as prefeituras pequenas podem sofrer dificuldade para implantar a estrutura necessária. É preciso de tecnologia e uma equipe para dar conta da demanda. 

Porém, prefeituras com orçamentos de quase R$ 3 bilhões ao ano, como Barueri, também ignoraram os pedidos feitos pela Agência Mural. A prefeitura barueriense, governada pela quinta vez por Rubens Furlan (PSDB), não respondeu aos questionamentos sobre a LAI.

Em Barueri, os pedidos devem ser feitos por meio de um formulário preenchido, assinado e enviado por e-mail. O modelo do documento fica disponível na página de transparência, sendo que solicitações feitas em outros arquivos, mesmo constando identificação e assinatura, não são aceitas. 

Por vezes, pode ser visto falta de interesse dos gestores no tema. “Vontade política é uma coisa criada. São as pessoas, ONGs, jornalistas locais, que fazem com que a prefeitura seja estimulada a agir”, diz Angélico. Para ele, quanto mais pedidos, mais chances de a lei ser usada efetivamente. “Está muito claro que estados e municípios não têm mais desculpa”, comenta. 

Ele explica que há três caminhos para cobrar melhorias no acesso à informação. O primeiro deles é mobilizar a opinião pública, levar a questão à Câmara Municipal para vereadores denunciarem a situação ou a veículos jornalísticos que atuem na cidade. 

O segundo caminho é o Ministério Público e, por fim, o TCE (Tribunal de Contas do Estado). 

Todavia, principalmente no caso de jornalistas, é recomendado agir em conjunto, em especial em municípios menores, por questão de segurança. “A OAB protocolar uma denúncia por conta do não cumprimento, por exemplo, pode ter mais peso no MP”, comenta.

 

DICAS

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Arte: Fellipe Sales/Agência Mural

Arte: Fellipe Sales/Agência Mural

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Paulo Talarico

Diretor de Treinamento e Dados e cofundador, faz parte da Agência Mural desde 2011. É também formado em História pela USP, tem pós-graduação em jornalismo esportivo e curso técnico em locução para rádio e TV.

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