O forte laço que une os irmãos gêmeos Wesley e Pablo Barreto, 14, moradores do Jardim Lapena, em São Miguel Paulista, na zona leste de São Paulo, vai além do sanguíneo. Eles são apaixonados pelo universo da literatura – amor que nasceu em 2020 durante a quarentena da Covid-19.
“Não tínhamos nada para fazer. Não podíamos ir à escola, sair para a rua, nem ver nossos amigos. Ainda não temos computador em casa, então foram nos livros que descobrimos um novo universo”, diz Pablo.
O sistema municipal de bibliotecas de São Paulo conta com 107 unidades. No distrito de São Miguel Paulista existe apenas a biblioteca Raimundo de Menezes, localizada a 2 km de distância dos irmãos.
Já no Jardim Lapena, apenas um equipamento de cultura está disponível para a população, o Galpão de Cultura e Cidadania, também conhecido como Galpão ZL.
Como forma de abastecer os leitores do bairro durante o isolamento social na pandemia, o espaço de leitura comunitário criou o projeto “Bike Literária”, que existe até hoje e faz o empréstimo de livros e a entrega na porta das casas por meio de bicicletas.
Nesse período, o primeiro livro que fez os irmãos mergulharem na leitura foi o quadrinho infanto-juvenil “Diário de um Banana”, escrito pelo norte-americano Jeff Kinney. A história mostra um garoto de 12 anos chamado Greg Heffley e suas tentativas de se tornar popular durante o 6º ano do ensino fundamental.
“Nós gostamos muito de quadrinhos e o Diário de um Banana traz a história nesse formato. Além disso, é leve e divertido de ler e entender”
Pablo Barreto, morador do Jardim Lapena
Antes disso, a leitura só era feita na sala de aula, biblioteca ou por influência da mãe, Nelita Barreto, 35, que é leitora assídua. “Os meninos não tinham o hábito de ler, mas sempre incentivei e li para eles em diversos momentos juntos”, conta.
Em um caderno de anotações, os estudantes registram todos os livros que já leram no decorrer de dois anos, o que ultrapassa a quantidade de 300 para cada um. Dentre os conteúdos lidos, estão cerca de 120 quadrinhos, 70 exemplares menores, como os livros de bolso, além de obras maiores, como “Harry Potter e a Pedra Filosofal”, da britânica J. K. Rowling.
“Nos identificamos com o personagem Harry, porque ele é muito inteligente, mas também é tímido. Outro personagem que gostamos muito é o Rony, admiramos a lealdade dele”, fala Wesley. Segundo ele, esse é o livro preferido dos dois irmãos.
Atualmente, para conseguir conciliar os livros com os estudos e o tempo de brincar, os gêmeos têm horários definidos para realizar cada tarefa. Todos os dias da semana, na parte da manhã, os meninos vão até o Galpão ZL e dedicam duas horas à leitura. Depois voltam para casa e seguem para a escola.
“Também somos apaixonados pelo universo geek. Nossos super-heróis prediletos são o Batman, o Super-Homem e o Homem-Aranha. Mergulhamos a fundo e gostamos de ver como a história é apresentada em diversos formatos, tanto no quadrinho quanto no cinema”, complementa.
“Gostamos de ir para a biblioteca por ser um universo de muitos livros para empréstimos gratuitos e também silêncio, além das amizades que formamos por lá”
Pablo Barreto, morador do Jardim Lapena
Segundo os leitores, o hábito também passou a ajudá-los nas matérias da escola. “A leitura nos ajudou com atividades de interpretação de texto, português, história, geografia e também biologia”, comenta Wesley.
Apesar da quantidade de livros lidos e de terem considerado “a melhor sensação de terem descoberto esse universo”, os dois explicam que não fixaram uma meta em número a ser batida em 2023. De acordo com os dois, o objetivo é continuar lendo por paixão.
Para o futuro, os irmãos acreditam que a leitura contribuirá para o desenvolvimento profissional e acadêmico. “Queremos trilhar o caminho da tecnologia, com [o curso de] sistemas de informação, ou da área da saúde, com medicina”, finaliza Pablo.