Para os meios de comunicação locais, descobrir como atrair e fidelizar leitores “é a pergunta de um milhão de dólares”, como lembrou Pedro Borges, jornalista e co-fundador do Alma Preta, durante o 14º Congresso da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), realizado entre 28 e 30 de junho em São Paulo.
A resposta para essa questão tem passado por duas estratégias: diversificar as formas de distribuir o conteúdo, que vão de jornais impressos a criação de grupos com jornalistas e leitores no WhatsApp, e aproximar a linguagem e o conteúdo da realidade dos leitores.
Apesar dos avanços tecnológicos, a publicação de jornais em papel segue como estratégia importante para falar com leitores que não tem acesso aos meios digitais, por falta de recursos ou de habilidade com a tecnologia.
Em Mariana (MG), foi criado um jornal impresso mensal direcionado às vítimas da tragédia de 2015, quando um rompimento de uma barragem gerou uma avalanche. “A lama passou a 30 km do centro da cidade e não atingiu a parte histórica, mas as notícias publicadas na mídia deram essa impressão. Isso irritou os moradores, pois afastou turistas e ajudou a aumentar o desemprego lá”, disse Elvira Lobato, que trabalhou no projeto Atlas da Notícia, um amplo levantamento sobre a mídia local no Brasil.
O jornal feito em Mariana, chamado A Sirene, teve edições mensais e usava uma linguagem diferente do modelo tradicional. O veículo busca reproduzir o jeito de falar dos moradores, sem editar eventuais imprecisões gramaticais e regionalismos.
Em vez de notícias com lide e título impactantes, apostou em registrar o que os moradores sonham para o futuro e as memórias sobre a vida que foi destruída e em dar orientações de como buscar reparação. Ali há espaço para registrar sonhos das crianças, como o de que nunca mais ocorram avalanches de lama capazes de engolir bairros.
No Rio de Janeiro, o Voz das Comunidades também tem uma grande preocupação com a linguagem. “Fazemos textos pensados para que qualquer um possa entender”, diz Gabi Coelho, repórter do projeto, que começou em 2005 com um jornal feito por Renê Santos, na época com 11 anos, e que hoje também divulga notícias das favelas do Rio em um site e em redes sociais.
Também no Rio, a Redes da Maré publica um jornal, com textos em que o tamanho das letras é bem maior do que a média, para facilitar a leitura para as pessoas mais velhas. E envia alertas aos moradores quando ocorrem operações policiais nas comunidades.
“Ao cobrir essas operações, a imprensa só costumava falar de quantos foram presos, quanta droga foi apreendida. Mas não citava as escolas fechadas, como isso afeta os moradores locais. Mostramos estas questões, e estamos aos poucos levando a imprensa, especialmente as TVs, a falar sobre isso também”, disse Dani Moura, coordenadora do Redes da Maré.
Atrair mais leitores é o elemento mais importante para que estes meios locais possam continuar existindo. O aumento do público permite buscar recursos via anúncios ou doações, seja com instituições filantrópicas, empresas ou por campanhas de arrecadação com os leitores.
Além de remuneração para os profissionais, também é preciso investir em equipamentos. “Muitas vezes a empresa tem um computador lá que já não serve pra ela, mas para a gente estaria ótimo”, diz Pedro Borges, do Alma Preta. “Tem que ter a cara de pau de ir lá e pedir”.