Quem sofre mais com as consequências do racismo ambiental é quem polui mais? Certamente que não. Um exemplo disso foi o desastre de Brumadinho, em Minas Gerais, onde o rompimento de uma barragem vitimou centenas de trabalhadores em 2019. A Vale, empresa responsável pelo crime, ainda é, quatro anos depois, uma das mais ricas do Brasil.
Esse é um exemplo de duas dinâmicas que estão presentes (ou deveriam estar) nas principais discussões sobre clima no mundo: o racismo ambiental e a justiça climática.
O primeiro diz respeito a quem são as vítimas das consequências da crise ambiental. “As pessoas de favelas, de periferias, até as aldeias indígenas. São elas que estão na linha de frente [na luta pelo clima] e sendo as mais impactadas”, afirma a jovem ativista Jahzara Ona, 18.
Jahzara se autointitula como “ativista socioambiental”. Cria do Jardim Pantanal, bairro do Jardim Helena, na periferia da zona leste de São Paulo, ela entendeu o que era o racismo ambiental no dia a dia da comunidade, antes mesmo de se aprofundar no estudo do tema.
O que é racismo ambiental?
O termo foi criado na década de 1980 pelo ativista estadunidense Benjamin Chavis, que era aliado de Martin Luther King na luta pelos direitos civis dos negros dos Estados Unidos.
Na época, Chavis denunciava o despejo de resíduos tóxicos em uma região de população majoritariamente negra na Carolina do Norte.
O racismo ambiental trata exatamente de como as políticas ambientais, como o saneamento básico, são tratadas de forma desigual, privilegiando a parte mais rica de uma região.
“Na minha comunidade, passei por enchentes, pela insegurança alimentar e por diversas coisas, enquanto pessoas que moram num condomínio do centro de São Paulo não passam por isso”, conta.
“Qual a diferença? É que minha família vive aqui por ter uma renda mais baixa, por questões históricas, por não ter condições de viver num solo correto, não viver numa área de moradia apropriada etc.”
Jahzara Ona, ativista socioambiental
Jahzara é uma das entrevistadas do segundo episódio do podcast Tamo em Crise, uma produção da Agência Mural em parceria com o Greenpeace Brasil. Neste programa, conversamos com ela e mais um jovem da região metropolitana de São Paulo sobre como eles observam e sentem a questão do clima no dia a dia.
Ela contou ao podcast sobre o começo dos trabalhos como ativista. Apesar da pouca idade, Jahzara soma experiências que vão desde a arrecadação de alimentos para uma comunidade no bairro dela até a ida à COP 27 (Conferência das Partes), no Egito, onde os principais líderes mundiais se reúnem para discutir a questão climática.
Todas as justiças juntas
Da mesma forma que a definição de racismo ambiental admite que as consequências da crise no clima global não são sentidas da mesma forma por conta das diferenças sociais e econômicas, o conceito da justiça climática reconhece que é preciso cobrar de quem polui mais pelo sofrimento causado às vítimas.
Jahzara vai além. Na opinião da jovem, a justiça climática caminha junto a outras justiças que são buscadas pela sociedade, como a racial, social e de gênero.
“Ela ‘casa’ com o racismo ambiental porque as mesmas pessoas que estão sendo atingidas por essa crise também estão passando por outros problemas, de diversas outras pautas, seja evasão escolar, feminicídio, morte, fome e diversos outros problemas. Não se faz uma justiça sem as outras”, afirma a ativista.
Para ela, ambas as questões estão finalmente sendo discutidas com seriedade, tanto pela sociedade quanto pelos tomadores de decisão. Realizada no fim do ano passado, a COP 27 chegou a ser chamada de “COP da Justiça Climática”, justamente pela impossibilidade de não discutir assuntos como a redução de danos dos países ricos aos países pobres.
“Só agora as pessoas estão sentindo na pele o que está acontecendo. Infelizmente, por essa pauta agora estar sendo falada e conscientizada, as empresas usam muito disso também. Tem muita empresa que polui, mas se finge de sustentável”, conta Jahzara, mencionando um comportamento conhecido como “greenwashing”.
Como ativista jovem e participante de uma rede global preocupada com essa pauta (o movimento Jovens pelo Clima), ela acredita que a geração dela tem papel importante para levar essas discussões adiante, porém sem gerar a chamada “eco-ansiedade” e um excesso de responsabilização.
O termo eco-ansiedade é definido como “desconforto ou preocupação sobre o dano atual e futuro causado no meio ambiente pela atividade humana e a mudança climática”, segundo o dicionário de Oxford.
“Dá tempo de amenizar se a gente agir, ir atrás, continuar sendo incluídos em espaços de discussões, mas também agindo localmente na nossa comunidade, enquanto indivíduo, que também é extremamente importante. Isso traz um peso muito grande, então é preciso respirar e agir da forma que é possível”, conclui.
Confira a primeira reportagem da série Tamo em Crise: O que é essa La Niña? Entenda o fenômeno que causa frio e menos temporais.
Esta reportagem foi produzida com apoio da Report For The World