Embora o governador do estado de São Paulo, João Doria (PSDB) tenha adiado a retomada das aulas presenciais nas escolas públicas e privadas para o dia 7 de outubro, algumas cidades da região metropolitana de São Paulo não aderiram ao novo calendário.
Ao menos cinco município optaram em voltar às aulas apenas em 2021, outros estudam a possibilidade de retornar neste ano. O tema tem causado preocupação por causa da Covid-19 e gerado incertezas em pais e mães pelos bairros da Grande São Paulo.
Em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, muitas mães estão com receio da volta às aulas da rede pública de ensino devido os altos índices de casos de covid-19 na região. De acordo com o último boletim emitido pela Prefeitura, o município apresente 668 óbitos e 21.400 infectados.
O panorama da Covid-19 da Grande São Paulo elaborado pela Agência Mural, aponta que São Bernardo do Campo é o segundo com mais casos na região metropolitana, atrás apenas da capital.
A enfermeira Janaína de Oliveira Pinto, 32, mãe solo de Lucas, 8, não pretende deixar o filho retornar para a escola neste ano. Ela mora no bairro Baeta Neves e a criança estuda na Emeb Gofredo Teixeira da Silva Teles, no mesmo bairro onde mora.
“Acredito que será possível [a volta], quando houver um tratamento efetivo ou uma vacina. As escolas municipais não tem suporte para ter tantos materiais de limpeza e higiene, sem contar a escassez de profissionais para realizar as precauções e evitar o contágio”, ressalta.
A Prefeitura de São Bernardo realizou uma consulta pública via Whatsapp com os pais de alunos, sobre uma possível volta ao ensino presencial. A maior parte das respostas foi contra o retorno.
A assistente de financeiro Tatiana Almeida Rocha Dias, 35, é casada e mãe de um garoto de dez anos. O filho estudava na Emeb Doutor Vicente Zammite Mammana, porém no início do ano o colégio entrou em reforma e os alunos foram transferidos para a escola Pedra de Carvalho. Os alunos das duas escolas passaram a dividir o mesmo ambiente.
“As crianças já estão em um espaço reduzido, compartilhando com a escola do Estado. Para ir ao pátio ou quadra, depende da grade de horário dos alunos da rede estadual. Não acho viável o retorno, ainda mais com a evolução do casos”, comenta Tatiana.
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A Secretária de Educação de São Bernardo explicou que ainda avalia a possibilidade de retornar às aulas presenciais das escolas públicas (municipais e estaduais) no dia 7 de outubro, mas não chegou em um veredito.
A situação de São Bernardo não é única pela região metropolitana. Boa parte das cidades está sem previsão do que será feito. Outras, porém, cravaram que não retornam com aulas presenciais este ano, caso das cidades de Santo André, Mauá, Rio Grande da Serra e Ribeirão Pires, também no ABC. O sindicato das escolas particulares pretende recorrer na justiça da decisão.
O município de Mairiporã, na região norte, também informou que não haverá aulas este ano. São Caetano e Diadema seguem sem previsão de data.
Outros municípios, por enquanto, seguem nas fases de consulta pública. Em Arujá, 93% responderam que são contrários ao retorno este ano. No caso de Guarulhos, a prefeitura realizou uma consulta pública e 87% em um total de quase 40 mil respostas foram contrárias ao retorno das aulas presenciais.
Entre as cidades da Grande São Paulo, o município ocupa a segunda posição no número de vítimas e segunda em casos confirmados de Covid-19, de acordo com o levantamento semanal feito pela Agência Mural. A cidade possui 17.053 infectados e 1.131 mortos.
“Uma criança pode se contaminar na escola e trazer (a Covid) para dentro de casa. Aí é um problema maior ainda”, afirma Maria Aparecida Pereira dos Santos, 53, moradora do Jd. Tupinambá, no distrito dos Pimentas, em Guarulhos.
Maria trabalha como diarista e recebe o auxílio emergencial, porém teve que retomar algumas atividades e usar o transporte público para ir ao centro de Guarulhos ou em São Paulo. A volta das aulas presenciais em meio à pandemia, aumentaria os riscos de contágio do Covid-19 na rotina da diarista.
Néia Reis, 53, mora no Parque das Nações, também na região do Pimentas. Ela trabalhava como modelista, mas deixou as confecções por causa de problemas crônicos da fibromialgia. Tem duas filhas e um filho mais novo.
“Vai ter monitor o tempo todo? Não vai. Criança não tem essa percepção, eles (a escola) sabem que pode ter problema, porém eles não têm essa percepção. A gente que é adulto não tem”, questiona.
O comunicado da Prefeitura também mencionou reforma e manutenção de unidades do CEU (Centro de Educação Unificado). Mais tarde, no dia 6 de agosto, um memorando anunciou a reabertura parcial das unidades a partir do dia 12 de agosto, com 20% da capacidade.
Mogi das Cruzes também fez uma consulta pública, entre 28 de julho a 3 de agosto, e teve resultado semelhante: 89% dos participantes responderam que não enviariam os filhos à escola se esta fosse reaberta.
Vanessa Talita Siqueira Marte, 34, é dona de casa e possui três filhos nas escolas da rede municipal. Além de não concordar com a volta às aulas, ela tem um filho com deficiência e diz que seria ainda mais difícil um distanciamento social dentro da escola.
“As crianças são muito agitadas, não vão ficar no lugar. Tenho um filho com deficiência na inclusão e acho que seria muito difícil manter o distanciamento dos amigos na escola”, relata Vanessa.
Viviane da Silva Caetano, 43, é professora e tem uma neta que está na creche da cidade. Para a educadora, o retorno às aulas é uma tragédia anunciada. “Não podemos arriscar a vida de nossos filhos, netos e familiares por conta de três meses de aula. Vidas importam e vão além de economia e politicagem”, conclui.
Para o eletricista Celio Giovannini, 55, as aulas deveriam voltar apenas quando houvesse a vacina. “É necessário primeiro a proteção, pois são crianças e acredito que muitas não têm noção do perigo” afirma.
No caso de Suzano, a Secretaria de Saúde afirma que a decisão de reabertura é técnica e priorizará a segurança dos alunos. Não há previsão.
A merendeira Márcia Massariol Espezio, 46, não concorda com a volta às aulas prevista para o dia 7 de outubro. Para ela, o contato físico entre os alunos mais novos é inevitável. “As crianças gostam de ficar se abraçando. Eles não têm a noção real do perigo”, afirma.
Márcia é mãe de dois filhos que estudam na rede pública de ensino. A filha mais nova Giulia Espezio, 6, cursa a 1ª série em uma escola municipal da cidade. Ela teme que a filha contraia o vírus na escola e contamine a avó e os familiares que pertencem ao grupo de risco.
“Temos que diferenciar. Na educação infantil as chances de transmissão são muito maiores que no ensino médio. Difícil manter todas as crianças afastadas de máscara, sem que não coloquem nada na boca”, explica.
O filho mais velho Vinícius Espezio Soares, 16, cursa o 2° ano do ensino médio em uma escola estadual e faz curso técnico durante a tarde. Márcia diz que por ser mais velho, Vinícius será mais cuidadoso caso volte a estudar presencialmente, porém ainda sim, tem preocupações.
De acordo com a Prefeitura, não há uma data prevista para a volta às aulas, pois a decisão está atrelada às condições de segurança sanitária do município.
Na última sexta-feira (7), o governador do estado de São Paulo, João Doria (PSDB) adiou a retomada das aulas presenciais nas escolas públicas e privadas para o dia 7 de outubro. No entanto, a partir do dia 8 de setembro as unidades poderão ser abertas de forma opcional para oferecer acolhimento aos alunos em que os pais voltaram a trabalhar presencialmente.
CENÁRIO COMPLEXO
A questão das aulas presenciais também preocupa no caso dos alunos que não conseguem acompanhar pela internet as atividades e a chance de ter um ano perdido. Além disso, pais e mães que voltaram ao trabalho e não tem com quem deixar os filhos têm tido tido que se desdobrar.
Para o advogado Ariel de Castro Alves, especialista em direitos humanos, e ex-conselheiro do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), o retorno às aulas no atual contexto da pandemia no estado e no país configuraria verdadeiro atentado ao princípio da proteção integral da infância e juventude, previsto na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Estatuto da Juventude.
“Será necessário reavaliarem na véspera, antes da reabertura se concretizar, para, com base no aumento ou diminuição das contaminações, poder manter a data ou não, como foi feito até agora”, avalia.
*Correção: texto alterado em 13 de agosto. Cinco cidades anunciaram o adiamento e não sete como constava inicialmente.