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Onze anos depois, obra do monotrilho ainda causa transtornos na zona leste de SP

Por: Matheus Santino

Desde 2022, os moradores do Iguatemi, na zona leste de São Paulo, enfrentam trânsito carregado em diversos pontos da principal via da região, a Avenida Ragueb Chohfi, que começa no Largo São Mateus, atravessa todo o distrito do Iguatemi e termina na Cidade Tiradentes.

A Ragueb também faz conexão com a Avenida Jacu Pêssego, que liga a região aos bairros de Itaquera e São Miguel Paulista e com a Avenida Vice-Presidente José Alencar Gomes da Silva, que vai para o ABC.

O congestionamento é consequência de várias intervenções que ocorrem na via devido às obras do monotrilho da Linha 15 – Prata do Metrô, que vai ter duas estações no distrito, Boa Esperança e Jacu-Pêssego, além do Pátio Ragueb Chohfi, que será usado para estacionamento e manutenção dos futuros trens.

Enquanto as estações não são uma realidade, os moradores do Iguatemi e de distritos vizinhos que dependem da avenida lidam com o transtorno das obras. É o caso de Vanusa Silva, 45.

Moradora da Cidade Tiradentes, ela atravessa a avenida inteira de ônibus até o Terminal São Mateus para pegar outro coletivo para o trabalho.

Moradores tiveram que andar 1 hora devido ao bloqueio @Vanusa Silva/Divulgação

Ela conta que, um dia antes de conversar com a Agência Mural, teve que ir andando do Terminal Cidade Tiradentes até a Avenida Jacu Pêssego, cerca de 5km e mais de 1 hora de caminhada, por conta de uma intervenção na Ragueb.

‘Tinham que colocar uma viga e fecharam um acesso da avenida às 4 horas da manhã, aí ficamos parados. Todo mundo teve que descer do ônibus e ir andando, porque não tinha transporte que conseguia sair do lugar’

Vanusa, moradora da Cidade Tiradentes

Vanusa trabalha no Jardim Grimaldi, em Sapopemba, e chegou 1 hora atrasada neste dia por conta do bloqueio na Ragueb. Para ela, a solução seria ter mais opções de caminhos.

“Cidade Tiradentes está crescendo e precisamos de mais avenidas que tenham acesso, porque só a Ragueb não está dando conta. É o único meio que temos de acesso para tudo, todas as rotas caem na por lá para chegar na Tiradentes”, diz.

Ela comenta que a rotina de ficar parada no trânsito é muito cansativa e afeta a saúde. “Só sabe quem pega ônibus de segunda a sexta às 5 da manhã. A gente acorda 4 da manhã para conseguir pegar um ônibus às 5. É muito difícil. E quando consegue pegar, ficamos horas parados em pé dentro de um transporte público lotado igual uma sardinha”, lamenta.

Obra atrasada

As vigas que sustentam os trilhos e estações começam a tomar forma na região quase 11 anos após a inauguração das duas primeiras estações da linha, Vila Prudente e Oratório, abertas para teste em 30 de agosto de 2014.

Em decorrência da obra, alguns trechos da avenida tiveram redução de quatro para duas faixas. Além do estreitamento da via, semáforos quebrados, mudança de pontos de ônibus e sinalização confusa são alguns dos sintomas que a construção deixa no local.

Trânsito carregado próximo à futura estação Jacu Pêssego @Matheus Santino/Agência Mural

A Agência Mural perguntou para a CET ( Companhia de Engenharia e Tráfego de São Paulo) se existem dados anuais do trânsito na região, para fazer um balanço do antes e depois da obra.

Em resposta, a Companhia disse que, por conta das obras, são feitas interdições e mudanças na via a todo momento, o que atrapalha o trabalho de monitoramento.

Em nota, a CET afirma que a última pesquisa com contagem de veículos que trafegam pela Ragueb Chohfi foi feita em 2015.

“A lentidão se manteve menor no período de pandemia e, posteriormente, houve um aumento. No entanto, as obras do Monotrilho, ao longo da Avenida Ragueb Chohfi, acabam influindo na coleta de dados e na lentidão do trânsito”, diz a companhia.

Futura Estação Jacu Pêssego, no Iguatemi @Matheus Santino/Agência Mural

A previsão inicial do Governo de São Paulo para a entrega das duas estações e do pátio era para 2025. Atualmente, o prazo para que o trecho seja entregue é de Setembro de 2027.

Empresas e comércios afetados

A região do Parque Boa Esperança, bairro que vai receber uma das estações, tem sofrido mudanças drásticas na última década. Com a chegada do monotrilho, diversos comerciantes e moradores foram removidos e algumas partes do bairro ficaram anos com cara de “cidade fantasma”, até que as obras realmente começassem.

As remoções causaram um atraso das obras, mas foram necessárias para que fosse feito alargamento da avenida, que só conta com duas faixas em grande parte do trecho.

Com desvios na via, reforma no asfalto e intervenções nos dois sentidos, a região é caracterizada pelo trânsito caótico, o que afetou a rotina dos comerciantes locais.

Meire Sthefany, 50, é moradora da região e dona de uma floricultura na avenida. Ela conta que o congestionamento constante teve impacto na entrega dos produtos.

“Antes eu podia falar com franqueza a hora prevista, hoje eu prometo que vou fazer o possível para entregar no horário, por virtude do trânsito”, diz. A comerciante costuma enviar fotos da avenida para os clientes, para provar a situação.

A floricultura atende vários bairros da região e precisou mudar a logística das entregas. Meire comenta que um caminho que antes era feito em 15 minutos, hoje demora 40. “A gente vai por dentro, mas todo mundo tem a mesma ideia. Quando chega em um determinado trecho, está tudo travado do mesmo jeito”, relata.

A comerciante conta que mesmo para pedestres a situação está difícil, pela falta de sinalização e semáforos quebrados. “O farol funciona 1 hora e quebra 10. Quando eles vêm arrumar, já é à noite. Não é justo nem com os próprios operários, ficar trabalhando meia-noite à luz de refletor”, diz.

Tatiane Campos, 38, é instrutora de trânsito em uma autoescola da avenida. Moradora da região, ela também reclama sobre a dificuldade de transitar a pé. “Eles fecharam as calçadas do lado esquerdo, sentido centro, a gente não anda. Se eu preciso ir em um comércio do lado esquerdo, eu não consigo acessar”, reclama.

Pedestres têm dificuldade para se locomover na região @Matheus Santino/Agência Mural

Ela comenta que o transtorno das obras fez com que ela mudasse a rotina das aulas. “O período da manhã é bem complicado, porque é horário de fluxo sentido centro, então a gente evita esse sentido e costuma dar aula mais pelo bairro mesmo”, diz.

Especialista no trânsito da região, Tatiane conta que não existe mais horário de pico na Ragueb e que a qualquer momento a avenida está congestionada. Ela comenta que uma melhor sinalização poderia ajudar na situação.

Estação Boa Esperança em construção @Matheus Santino/Agência Mural

Histórico da Linha 15 e os 16 anos de incertezas

1

2009-2014: O histórico da linha prata é marcado por atraso nas obras, mudanças de prazos e fases de testes demoradas. As obras começaram em 2009, com previsão de entrega da linha completa em 2012. Mas as primeiras estações só foram inauguradas em 2014.

2

2014-2018: Após a abertura, a linha só recebeu novas estações 4 anos depois. O trecho entre São Lucas e Vila União conta com quatro estações, abertas em 6 de abril de 2018, sete anos após a previsão inicial.

3

2019: A estação do Jardim Planalto foi inaugurada em 26 de agosto de 2019, enquanto as estações Sapopemba, Fazenda da Juta e São Mateus entraram em operação em 16 de dezembro daquele ano, seis anos depois da previsão.

4

2021: A última estação aberta foi o Jardim Colonial, em 2021, em frente à Subprefeitura de São Mateus.

 

5

Só em 2027: Atualmente, além das duas estações no Iguatemi, a linha também está se expandindo para a Estação Ipiranga, na zona sul, que faz baldeação com a Linha 10-Turquesa da CPTM. O prazo de entrega é para 2027.

6

Incertezas: Hoje, os usuários vivem com a incerteza sobre qual será o itinerário total da linha e quando ela será finalizada. No desenho inicial, a linha teria mais quatro estações depois da Jacu Pêssego, o que atenderia os moradores da Cidade Tiradentes.

No site oficial do Metrô, a informação é de que “o trecho a partir de Jacu-Pêssego, com atendimento até Hospital Cidade Tiradentes, encontra-se em análise, uma vez que depende de ações conjuntas com a PMSP, principalmente no que se refere ao alargamento da Estrada do Iguatemi”.

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