O motorista de aplicativo Ricardo Balbino, 45, passa constantemente em frente às obras da estação Brasilândia, da Linha 6 Laranja do Metrô, em seus trajetos, e aproveita para conferir a movimentação no entorno.
“Tenho visto bastante gente trabalhando, uma evolução de caminhões. Vi esses dias que a previsão da entrega está para 2025, e tomara que não parem mais, pois ficou um bom tempo parado. Já era para essa linha ter saído”, diz o futuro passageiro.
Balbino é um dos moradores da região, na zona norte de São Paulo, que redobraram a atenção aos prazos da linha nos últimos dias. A obra, que ficou parada por quatro anos, foi retomada em outubro de 2020. Mas o desabamento ocorrido em fevereiro deste ano, em um dos pontos da construção na Marginal Tietê, trouxe de volta o medo de que o Metrô demore ainda mais para chegar.
Na ocasião, um tatuzão, como é conhecido o equipamento de escavação dos túneis do Metrô, foi submerso pelo vazamento de um esgoto da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo). Uma cratera se abriu em um trecho da via. Não houve registro de pessoas feridas.
Mesmo mantendo a previsão para 2025, a Linha Uni, concessionária responsável pela obra, afirmou que até o momento não é possível avaliar se o impacto do incidente afetará o prazo de entrega da linha. O projeto ligará o distrito da Brasilândia, na zona norte, à Estação São Joaquim, no centro da capital.
Para o arquiteto Enio Silva, 66, outro morador da região, o desmoronamento deve afetar os trabalhos. “Esse desastre nos preocupa bastante, pois pelo que se sabe muita coisa foi danificada. Graças a Deus não houve vítimas”, comenta.
“A gente percebe que as obras estão quase zeradas e é essa nossa preocupação, se vai ter uma mudança da entrega da linha, qual o custo disso tudo e quem vai assumir essa conta”
Enio Silva, arquiteto
Sobre as causas do acidente, a concessionária se limitou a informar que a empresa acompanha e colabora com as informações necessárias para a apuração da causa do incidente realizadas pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), contratado pela STM (Secretaria de Transportes Metropolitanos) e a Sabesp.
“Acho que esse acidente pode atrasar o andamento dessas obras, até por conta da gravidade do que ocorreu. Tem equipamento que precisa ser reposto e é importado”, avalia o técnico metalúrgico José Valmir Gomes Moreno, 60, morador da Vila Penteado, na Brasilândia.
O período de chuvas intensas nos últimos dias também foi um ponto de observação levantado pelos moradores noticiados sobre os alagamentos na região das futuras estações Perdizes e Sesc-Pompeia. Em nota, a concessionária diz que as obras continuaram no mesmo ritmo que estavam sendo tocadas, sem interrupções.
“Foram instalados tapumes com aberturas inferiores, em toda a extensão dos canteiros, que conectam as áreas de obra com as áreas externas, de forma a amenizar as condições nos períodos de chuva e facilitar o deslocamento da água”, diz a concessionária, que também diz estudar outras soluções para evitar o impacto dos alagamentos.
Histórico de atrasos
Atrasos e problemas marcam a trajetória do projeto. Anunciada em 2008, a linha com 15 km de extensão foi celebrada como a primeira PPP (Parceria Público Privada) a construir uma ligação de metrô no país. A previsão inicial de entrega era 2012.
Contudo, a licitação só saiu em 2013, e três anos depois, em setembro de 2016, as obras foram paralisadas. Empresas participantes do consórcio Move, como Odebrecht, Queiroz Galvão e UTC Engenharia, viraram alvo de investigação da Operação Lava-Jato.
Em 2017, os moradores organizaram o Movimento Metrô Brasilândia Já, com objetivo de pressionar o governo a retomar as obras paralisadas na ocasião. “O movimento começou a se articular um ano após a parada da obra, pois estávamos preocupados. Queríamos que ela fosse retomada e a gente entendesse os motivos da paralisação”, conta Enio Silva, integrante do grupo.
Ele diz que, atualmente, há cerca de 70 participantes no Whatsapp que fazem parte do movimento. Os atos presenciais foram interrompidos durante o período da pandemia de Covid-19, e as reuniões passaram a ser on-line.
Em fevereiro de 2020, a concessionária foi trocada. A empresa espanhola Acciona assumiu o contrato para dar continuidade ao projeto da PPP, como sócia da concessionária Linha Uni. Em outubro de 2020, as obras recomeçaram com a previsão de cinco anos para entrega. Segundo a Linha Uni, a concessionária anterior havia realizado aproximadamente 10,45% das atividades previstas no cronograma inicial.
Com 15 estações, a Linha 6-Laranja fará integração com as linhas 1-Azul e 4-Amarela, do Metrô, e 7-Rubi e 8-Diamante, da CPTM, e deverá transportar um fluxo previsto de cerca de 633 mil passageiros por dia – população que atualmente conta apenas com ônibus para chegar aos bairros da Brasilândia. A expectativa é de mudanças para a população.
“Essa estação vai regionalizar a Brasilândia com outras regiões de São Paulo. Além disso, surgem outras benesses, como segurança, iluminação, tudo que um Metrô acaba trazendo para o bairro”
José Valmir
José diz que os participantes do Movimento Metrô Brasilândia Já estão atentos aos desdobramentos do acidente. “A Covid inviabilizou que a gente pudesse se reunir e fazer manifestações. Mas já estamos conversando para ver como a gente pode se posicionar a respeito da questão do acidente e mostrar para Acciona que, como movimento e moradores, nós seguimos vigilantes”.