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Mulheres ganham mais do que homens em só 7 dos 96 distritos de SP

Por: Renan Cavalcante e Thalita Archangelo

Irineia da Silva, 38, é auxiliar de limpeza em Ermelino Matarazzo, na zona leste da capital. A 35 km dali, Elizabete Rodrigues, 54, tem uma empresa em Jaguara, no extremo oeste da capital. Apesar da distância, as duas vivem em duas regiões que vivem uma rara estatística na cidade. 

Nestas duas periferias, são as mulheres que ganham mais do que os homens no mercado de trabalho. Dos 96 distritos da cidade de São Paulo, apenas sete vão na contramão quando o assunto é desigualdade salarial. 

Além de Ermelino e Jaguara, Cachoeirinha, Pedreira, Água Rasa, Cangaíba, Jardim Helena são os únicos locais em São Paulo nos quais a média salarial das mulheres é maior do que a dos homens. 

Os dados são do Mapa da Desigualdade, publicado pela Rede Nossa São Paulo, nas últimas semanas. 

Jaguara e Ermelino Matarazzo foram os que tiveram maior diferença a favor das mulheres. A média salarial feminina é, respectivamente, 15,29% e 11,85% maior do que a dos homens. Para se ter ideia, a média da cidade é de remuneração 15% maior para trabalhadores do sexo masculino. 

“Fico surpresa e ao mesmo tempo feliz. Já é um avanço. Nos tempos de hoje ainda existe um grande preconceito, por isso temos a média salarial menor”, diz Elizabete, sobre a situação de Jaguara. 

A empresa de Elizabete fabrica enfeites natalinos, e hoje conta com 11 funcionários fixos, sendo sete mulheres. Para o final do ano, foram contratadas mais quatro temporariamente. Todos com salários equiparados.

“Elas se destacam em todo trabalho que fazem. Também deve-se levar em conta que muitas tem jornada dupla. Têm toda administração de uma casa, pois geralmente são mães e donas de casa, além de trabalharem fora”, ressalta.

Bairro de Jaguara, na zona oeste de São Paulo @Renan Cavalcante/Agência Mural

Os salários maiores vêm de setores de comércio e construção civil. Neles, mulheres recebem uma média de 34,74% e 18,85% por cento a mais, respectivamente. Por outro lado, elas recebem 9,97% a menos no setor de serviços e 20,86% na área industrial.

As características do bairro ajudam a explicar a economia da região. Criado em 1923 com o loteamento de um sítio, o Jaguara ganhou esse nome devido ao médico e político Antônio Pinheiro de Ulhoa Cintra, o Barão de Jaguara. Em seguida, o local foi sendo ocupado por empresas e operários. Em 1964, virou um distrito da cidade de São Paulo.

Uma das características da região é estar próxima de vias importantes da cidade, como a Marginal Tietê e a rodovia Anhanguera, o que aproxima indústrias. Essa área concentra a maior parte das empresas, como L’oreal, JBS, Natura, além de diversos grupos do ramo de logística.

A parte central do bairro é dominada pelas residências e pequenos comércios. A população do distrito vem diminuindo nas últimas décadas. Dados do censo mostram que o número de moradores caiu de quase 33 mil para menos de 25 mil entre 1980 e 2010.

ERMELINO MATARAZZO

Do outro lado do mapa, em Ermelino Matarazzo, o levantamento da Rede Nossa São Paulo aponta que as mulheres que trabalham no bairro ganham quase 12% a mais do que os homens. 

Apesar do resultado, o professor do curso de economia da Unicamp, Márcio Pochmann, diz acreditar que o número em Ermelino Matarazzo pode não ser muito significativo quando aplicado à realidade da periferia. 

“Ermelino Matarazzo é o tipo de distrito cuja predominância é a condição residencial, tendo mais de 90% da população obtendo seus rendimentos no trabalho em outra parte da cidade”, comenta.

A região começou a se desenvolver em 1926, com a chegada da ferrovia e com a construção da estação ferroviária Comendador Ermelino Matarazzo. Indústrias como a Matarazzo e a Císper instalaram fábricas no local. 

Em Ermelino Matarazzo, mulheres ganham 12% a mais do que os homens @Thalita Arcangelo/Agência Mural

Com o passar dos anos, essas empresas se deslocaram para bairros próximos às rodovias, o que alterou o perfil de Ermelino. Segundo a Prefeitura, começaram a ser ofertados terrenos mais baratos e sem infraestrutura, o que atraiu muitos trabalhadores, principalmente vindos do nordeste. 

O distrito, então, passou a ser um bairro residencial, característica que o acompanha até hoje.

Com uma população de aproximadamente 207 mil habitantes, onde 51% é feminina, e com 4.423 domicílios em favelas, as condições econômicas no bairro ainda não permitem que a maioria dos moradores trabalhe na região. 

Thamires Oliveira, 21, por exemplo, buscou emprego fora do bairro, há dois anos, quando ainda tentava uma vaga de jovem aprendiz. “Eu até gostaria de trabalhar aqui pelo bairro, mas não consegui. Seria mais fácil, o deslocamento seria menor e eu não gastaria tanto dinheiro com passagem”, diz. 

Hoje, ela se tornou auxiliar de aeroporto, e faz um percurso de duas horas para chegar no trabalho, em Congonhas, na zona sul, e mais duas horas para voltar.

Já a auxiliar de limpeza Irineia da Silva, 38, procurou emprego no bairro. “Não pego transporte cheio e não corro risco de passar por algo perigoso chegando tarde em casa.” 

Além disso, ela comenta que a escola em que trabalha há três anos é a mesma em que o filho caçula estuda. “É mais cômodo também porque posso levar meu filho de quatro anos comigo”.

A psicóloga Rosangela Brichezi, 56, trabalhou dez anos em Ermelino Matarazzo, onde vivia até o começo do ano. “Desde que passei a trabalhar perto de casa a minha qualidade de vida melhorou muito, passei a ter mais tempo para mim e para as pessoas que gosto”.

A taxa de empregos formais em Ermelino Matarazzo por dez mil habitantes que fazem parte do PIA (População em Idade Ativa), com idade igual ou superior a 15 anos, chega a 3,09. A média da capital é mais que o dobro, 6,7. De acordo com a Prefeitura, as atividades econômicas predominantes no bairro são aquelas ligadas ao comércio e aos serviços. 

Para Pochmann, um bom planejamento urbano poderia tornar as oportunidades mais equilibradas entre as regiões da cidade.

“No modelo de cidade estendida, como São Paulo, que separa historicamente o centro de suas periferias, uma alternativa seria responder com um plano que estabelecesse a descentralização territorial da produção e serviços, públicos e privados”.

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