A data é um marco internacional da luta e resistência da mulher negra contra a opressão de gênero, o racismo e a exploração de classe. É um dia para reconhecer a presença e a luta das mulheres negras nesse continente.
No Brasil, também se celebra o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, instituído por meio da Lei nº 12.987/2014. Tereza foi uma líder quilombola no Mato Grosso, durante o século 18, símbolo de luta e resistência.
Nossas muralistas aproveitaram a data para homenagear algumas guerreiras negras periféricas inspiradoras para elas.
Lélia Gonzales por Semayat Oliveira, correspondente de Cidade Ademar
“No meio do movimento das mulheres brancas, eu sou a criadora de caso, porque elas não conseguiram me cooptar. No interior do movimento havia um discurso estabelecido com relação às mulheres negras, um estereótipo. ‘As mulheres negras são agressivas, são criadoras de caso, não dá para a gente dialogar com elas’, etc. E eu me enquadrei legal nessa perspectiva aí, porque para elas a mulher negra tinha que ser, antes de tudo, uma feminista preocupada com as questões que elas estavam colocando”, disse Lélia Gonzales em entrevista para o jornal do MNU — Movimento Negro Unificado, em maio de 1991.
Lélia nasceu em 1º de fevereiro de 1935, em Belo horizonte, e faleceu em 10 de julho de 1994, no Rio de Janeiro. Intelectual, professora, antropóloga e militante fundamental na história do movimento negro, fez parte da criação do Instituto de Pesquisas das Culturas Negras (IPCN-RJ), do Movimento Negro Unificado, do Nzinga Coletivo de Mulheres Negras-RJ, do Olodum-BA e outras frentes.
Ela é uma inspiração não só por ter sido pensadora fundamental na consolidação do conceito do feminismo negro no Brasil, mas, também, pela autenticidade de sua escrita, combativa, embasada e, ao mesmo tempo, irônica e leve — na medida do que se pode ser.
Seus textos oferecem uma leitura intrigante, uma viagem que ensina e provoca, atiça a reflexão e a ação. “Se a gente dá uma volta pelo tempo da escravidão, a gente pode encontrar muita coisa interessante. Muita coisa que explica essa confusão toda que o branco faz com a gente porque a gente é preto. Prá gente que é preta então , nem se fala”. Este é um trecho do artigo Racismo e sexismo na cultura Brasileira (1984Lélia Gonzales). Fica o convite.
Leia um compilado de textos e artigos de Lélia aqui.
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Sharylaine Sil por Lívia Lima, correspondente de Artur Alvim
Para homenagear a minha amada zona leste, eu escolhi falar da Sharylaine Sil, que tem sua origem na região do Aricanduva. Ela foi pioneira da cultura hip-hop em São Paulo e uma das únicas mulheres no início do movimento, na década de 80. Fez parte do primeiro grupo de rap feminino, o Rap Girls, e a ela é atribuído o primeiro registro fonográfico rap de uma mulher no Brasil, em 1986.
Ela é inspiradora por ter aberto portas para mais mulheres dentro do hip hop, que por ser uma cultura periférica já enfrenta inúmeras dificuldades e preconceitos e, internamente, possui uma tradição muito masculina e muitas vezes machista. A mulher negra enfrenta sempre mais desafios em todos os espaços e por isso ela é inspiradora, é resistência!
Ouça: https://soundcloud.com/sharylaine
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Dandara dos Palmares por Martina Ceci, correspondente de Mogi das Cruzes
Existe alguém além de Zumbi. Dandara dos Palmares me faz querer mais sobre a memória da mulher negra. Ela foi mãe de três filhos, lutou — muitas vezes literalmente, com o que conhecia de capoeira — para a libertação verdadeira dos negros e cometeu suicídio para não voltar a viver como escrava.
Dandara inspira força, coragem e inteligência para nós mulheres negras que, ainda hoje, não nos vemos marcadas na história e precisamos lutar constantemente por lugares que ainda não nos permitem habitar.
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Djamila Ribeiro por Beatriz Sanz, correspondente de Diadema
No dia da Mulher Negra e latino-americana, eu falo daquela que hoje representa um dos maiores ícones do movimento negro e feminista do Brasil: Djamila Ribeiro, que é mestre em Filosofia pela Unifesp, colunista da Carta Capital e secretária-adjunta da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo.
Ela pertence a uma nova classe de mulheres negras que estão ascendendo ao poder, sem esquecer de suas raízes, trazendo questões que ainda precisam ser debatidas dentro da militância. Ao falar de Djamila, eu automaticamente homenageio todas as mulheres negras que estão ao meu redor. Procuro nunca me esquecer que eu sou porque nós somos. Ubuntu.
Leia artigos da Djamila em: http://www.cartacapital.com.br/colunistas/djamila-ribeiro
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Iracema do Nascimento por Jéssica Moreira, correspondente de Perus
Nascida no Jardim São Luiz, na periferia da zona sul de São Paulo, Iracema do Nascimento foi uma de minhas maiores inspirações Negras. Foi a minha primeira e única chefe negra e, ao ver seu Black Power ainda durante a entrevista de emprego, senti que, finalmente, poderia conseguir aquela vaga. Consegui.
Estudou Jornalismo na Unesp, fez mestrado na USP e agora está terminando o Doutorado em Educação na USP também. Além disso, morou em Londres, onde limpou casa, cuidou de criança, num tempo que ninguém da periferia fazia intercâmbio. Por aproximadamente dez anos foi coordenadora executiva da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, onde lutou bravamente pelo Direito à creche às crianças e por maiores investimentos em Educação no Brasil.
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Carolina Maria de Jesus por Priscila Pacheco, correspondente do Grajaú
Quem é Carolina Maria de Jesus? Carolina é uma escritora brasileira que teve livros traduzidos para mais de 10 idiomas. Escreveu romances, crônicas e poesias. Mulher negra e de família pobre, nasceu no interior de Minas Gerais em 1914, estudou até a segunda série do primário e trabalhou na lavoura ainda criança. Chegou na capital de São Paulo já na vida adulta. Foi morar na favela do Canindé, zona norte, sobrevivia como catadora de materiais recicláveis e escrevia em velhos cadernos. Lá foi descoberta pelo jornalista Audálio Dantas.
Carolina chegou ao mercado editorial, publicou seus escritos, conseguiu comprar uma casa em Santana, também zona norte. No fim da década de 1960, se mudou para um sítio em Parelheiros, extremo sul da capital de São Paulo, e lá ficou até o fim da vida, 1977. Carolina deixou filhos e outros livros que foram publicados postumamente. Diante da história de Carolina, me sinto envergonhada por ter a conhecido há tão pouco tempo e me pergunto: Por que Carolina Maria de Jesus não apareceu nas aulas de literatura que tive na escola?