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Nova lei para laqueadura atrai mulheres das periferias, mas ainda é um desafio

Por: Halitane Rocha

“Nunca tive interesse em ter filhos”, afirma Steffane Fernandes da Silva Costa, 23, moradora do bairro Jardim Arco-Íris, em Cotia, na Grande São Paulo. Agora que mulheres a partir de 21 anos e sem filhos poderão realizar a laqueadura, a atendente irá recorrer ao direito de não viver a maternidade.

“Eu uso o DIU (dispositivo intrauterino), mas estou sempre preocupada, achando que talvez ele tenha falhado e eu esteja grávida”, diz Steffane.

Desde o dia 2 de março, passou a valer a Lei nº 14.443 que reduz de 25 para 21 anos a idade mínima para realização de laqueadura e vasectomia. Além disso, casais não precisam mais do aval do cônjuge, e pessoas de qualquer idade com dois filhos vivos também poderão realizar a esterilização.

O procedimento agora também pode ser feito durante o parto, antes era necessário aguardar 45 dias.

“Estou torcendo para encontrar um médico que respeite minha decisão e dê andamento à minha solicitação”

Steffane Costa, 23

A preocupação da jovem em relação ao atendimento é pela experiência negativa que teve quando tentou pela solicitar o DIU pelo SUS (Sistema Único de Saúde) pela primeira vez. Ela foi ao posto de saúde aos 18 anos, mas a médica não concordou.

“Ela me empurrou a pílula do dia seguinte, dizendo que era melhor. Depois de eu quase discutir com ela, insistindo, ela me disse que faria a solicitação”, relata.

Porém, após aguardar alguns meses, a jovem descobriu que, na verdade, a médica não havia feito a solicitação. “Nunca mais me consultei com ela”, se queixa a atendente.

DIU (dispositivo intrauterino) foi um dos métodos escolhidos pela Steffane para evitar gravidez @Laísa Queiroz / Divulgação Ministério da Saúde

Após esse ocorrido, Steffane precisou aguardar seis meses para agendar uma nova consulta com outro ginecologista. Este fez a solicitação e hoje ela usa o DIU de cobre fornecido pelo SUS. Mas a insegurança para pedir a laqueadura ainda permanece, apesar da lei. “Espero que o médico permita e não me enrole. Me preparando mentalmente.”

Talita do Nascimento Aguiar, 29, é mãe do Bernardo, 10, e está grávida de 5 meses da Amara. Por meio do convênio do trabalho, ela foi orientada a esperar a alteração na Lei do Planejamento Familiar para fazer a solicitação da cirurgia e realizar durante o parto.

“Decidi esperar a alteração da lei e já fiz o agendamento para consulta presencial e me informaram que meu companheiro não precisa estar presente”, conta a desenvolvedora, moradora do Jardim Rosimeire.

Talita Aguiar já havia tentado realizar o procedimento antes da segunda gestação @Arquivo Pessoal

Talita já havia tentado solicitar a laqueadura pelo SUS, antes de iniciar a pandemia em 2020, porém não atendia a nenhum dos requisitos. Sem convênio na época, ela chegou a procurar por uma rede particular, mas lhe foi cobrado R$ 12 mil e ela não tinha o dinheiro.

“Também nem me senti confortável com o atendimento. Quando o médico me ofereceu a cirurgia, ele informou que bastava eu levar ‘qualquer homem da rua’ no cartório, para assinar a permissão”, lembra o descaso devido à exigência antiga do aval de um cônjuge.

Para a desenvolvedora, a nova lei é significativa, “para que a gente possa cada vez mais decidir e agir por nós em liberdade”. Porém, ela ainda acha restritiva. “Continuam limitando as nossas opções de escolhas”, afirma.

Caso a lei não seja cumprida, uma pena de reclusão de dois a oito anos pode ser determinada pela Justiça. A ouvidoria do Ministério da Saúde tem uma canal para receber denúncias em casos em que o médico negue o encaminhamento para algum dos procedimentos do planejamento familiar. O número é o 136.

É preciso ter em mãos o número da carteira do SUS, nome do posto, nome, especialidade e CRM do médico (que pode ser consultado nos conselhos regionais de medicina); data e hora da consulta.

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