Uma placa com a cor vermelha em frente ao Terminal Grajaú, na zona sul de São Paulo, alerta: “Está extremamente proibido o comércio ilegal dentro do terminal, sofrendo sanções legais e penais”.
O letreiro foi pendurado após a Prefeitura de São Paulo ceder a administração, conservação e manutenção do terminal de ônibus à iniciativa privada SPE São Paulo Sul S.A, que administra outros nove terminais da cidade.
A concessão foi feita em novembro de 2022 e durará por 30 anos. Após essa decisão, o espaço também vem passando por diversas reformas.
“Desde que mudou [a empresa], nos proibiram de trabalhar. Estamos voltando aos poucos”, diz Josemario Francisco da Silva, 57, pernambucano que trabalha no Terminal Grajaú há três anos.
Josemario vende queijo mineiro, massa de tapioca, requeijão, castanha, bolo e queijo coalho vindos de estados do Nordeste, como a Paraíba e o Ceará.
Após a saída dos ambulantes, o comerciante afirma que os próprios passageiros estranharam a situação. “A gente fica sentado aqui e o pessoal se acostuma. Se está frio e a pessoa não quer fazer janta, já levava um pedaço de queijo ou bolo”, diz.
Durante o tempo em que ficou sem trabalhar, vendeu os produtos mais baratos para que não estragassem, já que são alimentos perecíveis. “Os clientes me mandavam a mensagem no ‘zap’ e eu vinha entregar aqui na frente do terminal”.
Segundo ele, apesar das apreensões do “rapa” (nome dado aos policiais que apreendem as mercadorias de vendedores ambulantes) serem frequentes, essa foi a primeira vez desde a inauguração há 15 anos que tantos trabalhadores ficaram sem utilizar aquele espaço.
Histórico
A nova ordem gerou indignação entre os vendedores que organizaram um protesto no dia 12 de maio. Com cartazes que diziam “polícia civil, deixem-nos trabalhar” e “pedimos desculpas aos passageiros pelos transtornos. Estamos sofrendo perseguição e essa é a nossa ação”, os manifestantes se sentaram no asfalto, impedindo que os ônibus trafegassem.
Para dispersar a população, a polícia agiu com truculência. Vídeos que viralizaram nas redes sociais mostraram os policiais agredindo dois homens que já estavam imobilizados. O telão e as catracas da entrada foram quebradas.
Na época, a PM (Polícia Militar) afirmou que a ação ocorreu em reação à agressão sofrida pelos agentes, o que os vendedores negam. “Foi um protesto pacífico e os policiais partiram pra cima. Já que o terminal foi privatizado, a polícia nem poderia estar aqui. Porque fizeram uma operação fora da lei?”, questiona Alexandre Silva, 28, vendedor de milho que trabalha há um ano no terminal.
“Nem todo mundo consegue comprar o seu quiosque. Além disso, o terminal já não tem mais espaço para novas construções, por isso continuo na lista de espera”, afirma Alexandre.
Os ambulantes costumam montar as barracas entre 14h30 e 22h, mas sentem medo de novas represálias por parte da polícia.
Camila Adriana, 22, vende produtos que as pessoas precisam quando estão indo trabalhar, como carregador, fone, luvas, touca e outros utensílios.
Ela trabalha no terminal desde agosto do ano passado e relata que apesar do trabalho não ser registrado, continua nesta função para conseguir pagar as contas e comida.
“Se a polícia deixar, a gente trabalha. Depende do sistema. Se a gente monta sem autorização, eles levam a banca, pode ter agressão ou levar preso. Não participei da manifestação, porque estou grávida. Podia pegar alguma coisa em mim”, conta.
Segundo as lideranças locais, são mais de 120 vendedores que trabalham informalm ente dentro do Terminal Grajaú.
“Com a nossa presença, até a segurança aumenta no terminal. Queremos trabalhar na legalidade”
Alexandre Silva, 28, vendedor de milho
Em resposta à Agência Mural, a SPE São Paulo Sul S.A esclareceu que a responsabilidade desses ambulantes é do Poder Concedente, inclusive a fiscalização.
Em nota oficial, a São Paulo Sul afirma que já disponibilizou contato para os ambulantes que tiverem interesse em permanecer de forma legal dentro dos Terminais, firmando contratos e disponibilizando locais adequados que não prejudiquem o fluxo de passageiros e nem as rotas de acessibilidade, para a comercialização de seus produtos.
Segundo a empresa, “o grande problema hoje, é que todos estão de forma irregular, impedindo que seja executado as obras de reforma (principalmente acessibilidade), além de muitos venderem produtos proibidos como bebidas alcoólicas, mercadorias sem atendimento das normas da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e atrapalhando o fluxo dos passageiros nas plataformas”.
A empresa ressalta desconhecer qualquer tipo de acordo firmado com ambulantes para que possam comercializar produtos nas dependências do Terminal Grajaú, das 14:30 às 22h.