Inaugurado há 45 anos e privatizado em 2020, o terminal de ônibus Santana, o principal da zona norte de São Paulo, vai passar por obras de revitalização.
O projeto da empresa Unitah, que venceu a licitação e ficou responsável por 13 terminais integrados ao metrô na cidade, prioriza a exploração comercial, mas não resolve os transtornos causados pela saturação do terminal.
Atualmente, parte dos usuários das 27 linhas regulares e 13 noturnas utiliza pontos de ônibus nas ruas do entorno, em pequenos abrigos, sem segurança e banheiros. Esses passageiros precisam caminhar até as entradas do metrô, expostos ao sol, frio ou chuva.
Segundo a concessionária, durante as reformas não serão ampliadas as áreas de embarque, o principal alvo das críticas dos passageiros e trabalhadores. Da mesma forma, vai permanecer a antiga cobertura, com grandes aberturas entre as plataformas e laterais sem proteção, e não haverá a instalação de escadas rolantes em complementação às fixas.
Já a Prefeitura de São Paulo, por meio da SPTrans (São Paulo Transporte), confirma que mantém linhas fora do terminal, por falta de espaço, e que não há previsão para resolver essa questão.
O órgão informa que, antes do início da pandemia, em março de 2020, foi registrada uma média de 77,7 mil passageiros por dia útil, da empresa Sambaíba e do Consórcio Transnoroeste, totalizando cerca de 1,71 milhão ao mês.
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Para o arquiteto e urbanista Ayrton Camargo e Silva, 58, diretor da Aeamesp (Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Metrô), é correta a adoção de espaços verticalizados, de uso comercial, em terminais de transporte, de acordo com o Plano Diretor da cidade.
Sobre a saturação da capacidade do terminal Santana, ele propõe um novo desenho da rede de ônibus, com base na pesquisa origem-destino.
TERMINAL PROBLEMÁTICO
Gessé da Silva, 36, trabalha como fiscal nos pontos da rua Gabriel Piza e atende motoristas e cobradores em uma cabine na calçada, sem nenhum conforto.
Ele opina que o metrô deveria aproveitar o terreno de uma grande loja popular e estacionamento anexo para a expansão do terminal.
“Aqui na rua é ruim para os passageiros, quando chove ou faz sol forte, principalmente para os idosos. Nesses dias, o motorista tem que abrir a porta do ônibus pra que todos entrem e se abriguem”.
A demonstradora Anacléia da Cruz, 47, mora na Cohab Brasilândia e sempre toma ônibus na rua. Voltando do hospital veterinário e carregando uma caixa de transporte com a gatinha Kiara, ela teve que caminhar 300 metros do metrô até o ponto inicial.
“Aqui é terrível quando chove, as filas são grandes e não tem onde se proteger. No terminal seria muito melhor, com mais conforto e bancos pra gente não ficar em pé tanto tempo”, reclama.
O aposentado João Pires, 62, aguardava um ônibus para o Jaçanã e critica as atuais instalações. “Santana é ruim porque é do governo do estado. Passo por terminais da prefeitura, como o da Casa Verde, e são bem melhores.
Apontando para o acesso do metrô ao terminal, ele diz que “cansa subir todos esses degraus, nem tem escada rolante, mas espero que a reforma dê um jeito nisso e que não seja só um “banho de loja”.
READEQUAÇÃO
Especializado em planejamento de transportes, o urbanista Ayrton Camargo e Silva considera correta a adoção de edifícios comerciais em terminais de ônibus, metrô e trem, de acordo com o Plano Diretor da cidade.
Ele avalia que a edificação nesses locais estimula o chamado não-transporte, encurtando as distâncias e reduzindo o tempo de deslocamento das pessoas.
“Você desce do trem, chega ao mezanino e tem acesso à torre comercial. É mais prático, a pessoa nem pisa na calçada, não precisa atravessar avenidas, diminui a necessidade de mais semáforos e dá menos impacto na fluidez do trânsito.”
Sobre a questão do terminal Santana, o especialista fala que “não é racional que várias linhas ainda terminem ali, quando já há um prolongamento do metrô, com mais três estações: Jardim São Paulo, Parada Inglesa e Tucuruvi.
Como a prefeitura administra a rede de transportes, cabe a ela reavaliar a situação e talvez distribuir as linhas entre as demais estações e redefinir outras com itinerários sobrepostos. Seria um novo desenho da rede, com base na pesquisa origem-destino”.
Questionado se não existe “diálogo” entre prefeitura e metrô para traçar as diretrizes do transporte na cidade, o urbanista afirma que “infelizmente não temos um modelo institucional de gestão que compatibilize as políticas de transporte das várias instâncias, como uma autoridade metropolitana”.
Ele destaca também que a implantação do bilhete único eliminou a necessidade de convergir todos os ônibus para um só local.
“Acho problemático trazer um monte de linhas para um único terminal, causa degradação e a necessidade de uma mega rodoviária. Isso não faz mais sentido. O modelo de terminal tende a desaparecer como um equipamento gigantesco na zona urbana por conta da evolução tecnológica da bilhetagem”, conclui.
OUTRO LADO
A prefeitura de São Paulo, via SPTrans, reconhece que mantém linhas com ponto inicial fora do terminal Santana pela falta de espaço e também por se tratar de “uma região de grande interesse da população”.
O órgão ressalta que, de acordo com o processo licitatório, em setembro de 2019, os novos contratos de concessão permitirão a reorganização do sistema de transporte por ônibus na capital, “com benefícios para os passageiros, ao eliminar a sobreposição de linhas, reduzir intervalos entre os veículos, tornar as viagens mais rápidas e confortáveis e permitir a modernização da frota”.
A SPTrans esclarece que não houve realocação de linhas de Santana para as estações Tucuruvi ou Parada Inglesa do metrô e que não há planos de transferência para esses locais.
A empresa vencedora da licitação justifica não ter competência para ampliar a capacidade do terminal, pois “o remanejamento de linhas de ônibus fica a cargo da SPTrans. Porém, com a implantação do futuro centro comercial edificado, há “tendência de que novas linhas sejam acrescidas ao terminal, assim como a disponibilização de estacionamentos”, prevê.
Em relação à situação atual da cobertura, antiga e que não dá proteção total aos usuários, a empresa diz que a estrutura “não será substituída no curto prazo. A previsão é de que seja construído um shopping center acima do terminal. O projeto de edificação está em fase de elaboração”.
Outra reclamação dos usuários é de que o acesso do nível metrô às plataformas dos ônibus só é feito por escadas fixas. A Unitah alega que “as áreas internas de acesso ao metrô não fazem parte do contrato de concessão”.
Em resposta à questão levantada pelo fiscal de ônibus, a concessionária afirma que “estuda doar novos mobiliários para os fiscais da SPTrans que trabalham nas plataformas. Dessa forma, melhorará o conforto e haverá padronização visual”.
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PROJETO DO TERMINAL SANTANA
Segundo a Unitah Empreendimentos, o terminal Santana será transformado em um “destino de compras”, com investimentos em zeladoria, paisagismo e segurança, implantação de área de lojas e alimentação, posto de informações e wi-fi gratuito.
No projeto, também estão previstos novos banheiros e espaços revitalizados, para a realização de atividades culturais e até feiras livres. “Os pequenos boxes e quiosques que existem hoje serão padronizados e se somarão às novas áreas comerciais maiores”, afirma.
Chamado de “Praça Unitah”, o projeto deve representar uma economia de R$ 22 milhões/ano ao Metrô, em manutenção, vigilância e conservação dos espaços.
Os 13 terminais de ônibus integrados ao metrô que passaram para a iniciativa privada, por 30 anos, são: Linha 1-Azul – Ana Rosa, Armênia, Parada Inglesa e Santana; Linha 3-Vermelha – Artur Alvim, Brás, Carrão Norte, Carrão Sul, Patriarca Norte, Penha Norte, Tatuapé Norte, Tatuapé Sul e Vila Matilde Norte. Sete deles, incluindo o de Santana, vão permitir, no futuro, a construção de prédio comercial, residencial ou de serviços. As primeiras lojas já estão em funcionamento no Terminal Tatuapé Sul.