Do gramado do campo de futebol do Parque Sete Campos, Marcos Yamada, 34, observa ao fundo as casas do Jardim Novo Pantanal, no distrito da Pedreira, zona sul de São Paulo. É com essa paisagem que o professor tem as principais ideias para desenvolver o hobby mais recente: construir miniaturas de favelas com materiais recicláveis.
O interesse surgiu no início da pandemia de Covid-19 e o passatempo ajudou no controle da ansiedade, que aumentou no período.
Tudo começou em 2020 quando Yamada dava aulas de arte e educação para crianças da comunidade e ajudava elas a fazer maquetes, que são representações de obras ou projetos em tamanho reduzido. Depois de montar uma em casa para mostrar de exemplo aos alunos, o artista não parou mais.
“A primeira eu peguei uma caixa de sucrilhos e um papelão e fiz como se fosse uma banca de jornal. A criatividade era pouca, só depois que comecei a utilizar outros materiais e as formas mais próximas do que faço hoje”, explica.
Ao decidir construir miniaturas de casas e comércios de quebrada, Yamada não quis ter réplicas de lugares específicos, mas inserir nas artes algo que remeta às favelas com base na memória. Das 15 feitas até o momento estão algumas casas, um bar, uma barbearia e uma tabacaria.
“Essa ideia de fazer miniatura é também dedicar a ter detalhes perfeitos ou próximos da perfeição de um detalhe real para a galera se identificar”, diz.
Além do amor declarado pela favela, outra inspiração do hobby foi conhecer o trabalho de Marcelino Neto, o Nenê, criador do projeto ‘Quebradinha’ que também transforma materiais recicláveis em elementos de favela. “A devolutiva sempre foi muito positiva”, citando o apoio que Nenê deu ao conhecer seu trabalho.
O processo criativo das obras de Yamada começa em um pequeno escritório que tem em casa. Ele mora com o filho, Yuri Yamada, 13, e a esposa, Darlene Aparecida, 43, que opina e dá ideias desde o esboço até a arte final.
O artista é o responsável por toda a produção. Ao construir, utiliza, em sua maioria, materiais recicláveis como papelão, papel machê, canudos de refrigerante e fios de energia e os reutilizáveis como palitos de sorvete, madeiras de fundo de gaveta e argila. “Tudo que eu olho pode virar parte da arte”, conta.
Dependendo do projeto, as miniaturas ficam prontas de dois a cinco meses. As peças já foram parar em exposições do bairro e o resultado tem sido motivador. Ele comenta que as pessoas, principalmente os adultos, se identificam com elas.
“As pessoas olham as miniaturas e dizem: ‘Minha casa tem isso’ ou ‘Na minha infância eu tinha uma janela dessas’. São essas memórias afetivas que dão o prazer de fazer”.
Por se tratar de um hobby, Yamada não as comercializa, mas deixa em aberto essa possibilidade no futuro. Agora, quer se desafiar e construir apenas com materiais que encontrar nas ruas, sem usar o estoque que já tem em casa. Todos os projetos podem ser encontrados no Instagram da @arquitetura_periferica.
Artista além das miniaturas
Morador do Jardim Novo Pantanal há 29 anos, a arte acompanha a vida de Yamada em quase metade deles. Muito ativo no bairro, já organizou saraus de poesia, bibliotecas comunitárias e eventos de hip-hop, mas o resultado não era satisfatório. “Os vizinhos ligavam para a polícia por causa do barulho”, lamenta.
Yamada também é cantor de rap e autor de um livro chamado “Saudações Favela”. Ele começou na música em 2006, e hoje se apresenta no tempo livre em espaços da região. O músico comenta que não estava conseguindo atingir todas as pessoas e então decidiu priorizar a área que se encontra atualmente: o esporte.
“Alcancei um tanto de pessoas com a música, mas percebi que os jovens estavam ficando dispersos. Foi aí que morando do lado do Parque Sete Campos vi que eles desciam muito pra jogar bola. A partir daí fui deixando a música em segundo plano e entrei de cabeça no esporte.”
Há quase 10 anos envolvido com o futebol, Yamada está fazendo faculdade de educação física para se tornar um profissional na área. Durante a pandemia, precisou fazer rifas de duas miniaturas para ajudar a pagar a graduação que termina este ano.
Ele também chegou a ficar desempregado, mas logo apareceu uma oportunidade para dar aulas de futebol para jovens do bairro, no projeto social que participa atualmente.