Professor de inglês e rapper, Jordan Fields, 32, vive no Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, há quase quatro anos. Ele trocou a periferia da região metropolitana de Nova York pela paulistana em 2016, por conta do hip hop e do relacionamento com a esposa, que morava no Jardim Ângela, também na zona sul.
Apesar da situação vivida pelo Brasil por conta da pandemia do novo coronavírus e dos casos que avançam nas periferias, ele aponta que estar no país tem sido melhor. “Seria muito estúpido eu voltar pra lá”.
Nos Estados Unidos, viveu em Newark, Nova Jersey (EUA), perto de Nova York, local com maior número de mortes por conta da doença no mundo. No entanto, a preferência pelo Brasil está em dois pontos: a solidariedade e o SUS (Sistema Único de Saúde).
“Se eu ficasse doente lá, eu morreria ou quebraria. Seria curado, mas teria que pagar uns 5 mil dólares para usar um respirador”, comenta o rapper. Ele também cita que o preço tornou inviável um retorno após a alta do dólar em relação ao real.
Jordan é responsável pelo projeto “Inglês na Quebrada”, onde são oferecidas aulas de língua estrangeira no Centro de Mídia M’Boi Mirim para moradores da região. O curso e também o álbum de rap que estava em fase de produção precisaram ser interrompidos por conta da quarentena.
“Alguns shows foram cancelados e também havia o disco, mas não podemos ir para o estúdio gravar. Nosso cronograma está totalmente destruído”, conta.
O Inglês na Quebrada abriria turmas em abril, mas suspendeu as aulas por conta da pandemia. “O curso, que é parte da nossa identidade aqui na perifa, não está acontecendo”, conta Jordan. Por enquanto, o professor tem mantido aulas particulares e para empresas em plataformas na internet.
A vinda para a zona sul paulistana surgiu inicialmente por causa da música. Em Nova Jersey, ele tinha um grupo chamado “Negros Americanos”, que fazia rimas em espanhol para o público negro e latino da região. Ele conta que o único vídeo que viralizou foi de um cover da música O Trem, do grupo brasileiro RZO.
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“Eu já tinha ouvido falar no Capão Redondo enquanto estava lá ouvindo Racionais e outros artistas”. Enquanto busca aprender português pelo Facebook, conheceu a esposa. “Quando ela falou que era daqui, aí tudo fez sentido e eu acabei mudando pra cá. São Paulo está sendo a Nova York que eu nunca consegui ter”.
O rapper conta que a maior diferença que percebe do Capão Redondo para Newark é a solidariedade. “Lá é cada um por si, é muito predatório, se o cara não gosta do seu rosto ele quer dar um tiro em você, sabe?”, compara.
“Vi na favela há um ano atrás um carro que caiu no córrego e estava cheio de pessoas que nem conheceram o motorista e que estavam tentando ajudar a tirar esse carro do córrego. Na minha cidade, as pessoas só iam rir da cara do cara”, compara Jordan.
CANADENSE
Quem também permaneceu no Brasil durante a pandemia foi o canadense Chris Krentz, 35. Ele é professor na 4you2, uma empresa que tem como bandeira a democratização do ensino de inglês nas periferias. A unidade no Capão Redondo, a primeira da rede, conta com sete professores, todos estrangeiros.
Chris mora no Capão, mas dá aulas na unidade do Jardim Ângela. Conta que sentiu um pouco de medo quando o novo coronavírus chegou ao Brasil, mas que também preferiu ficar aqui ao invés de voltar ao seu país.
“Mesmo se eu quisesse, não é fácil chegar no Canadá agora”, diz. Os voos para fora do Brasil estão limitados. “Pensei um pouco em março quando todo mundo estava um pouco assustado. Agora não, mesmo sendo difícil estou gostando das aulas online e fazer home office”.
O momento em que mais se preocupou durante esse período foi com a fila na agência lotérica próxima de onde mora. “Fui pagar contas na lotérica e teve uma fila de umas cinco horas e meia por causa do auxílio emergencial do governo, foi um pouco assustador ver as pessoas desesperadas”.
Antes do Capão, ele já havia passeado pelo Brasil e morado na região Sul do país. Veio para a zona sul ao conseguir oportunidade na empresa.
Ele mora no Capão Redondo há dois anos. Diz que apesar da preocupação, a família apoiou a opção de permanecer no Brasil. A mãe dele é enfermeira no sistema de saúde pública do Canadá, e está em constante contato com ele e o lembrando das medidas de higiene.
“Minha mãe fala muito sobre as precauções a tomar, sobre separar as roupas quando voltar da rua, lavar as mãos, coisas assim. Eles estão preocupados, com certeza”, afirma.