Sensibilizar a população sobre a importância da doação de órgãos, reduzindo a fila de espera por um transplante. Essa é a proposta do “Action HeartWay” (O caminho do coração), iniciativa criada por duas amigas na zona leste de São Paulo.
A artista plástica e grafiteira Stefanie Fabian Torelli, 30, do Itaim Paulista, e a analista de mídia digital Alessandra Sobral, 45, de Guarulhos, decidiram iniciar a ação que reúne trabalhos de artistas nas redes sociais pelo Brasil e em murais espalhados pela cidade de São Paulo.
“É muito legal deixar essa marca por meio da arte. Até o momento diversos artistas pincelaram a ação nos murais da cidade”, conta Stefanie, citando a participação de Luiz Sampaio, que assina como Samp, de Guarulhos, JanAcores, Tiko Finkanauer, da zona sul, e Rosália Surreal, zona norte.
A motivação veio por uma situação vivida na família de Stefanie. O pai dela, José Roberto do Nascimento, 63, foi diagnosticado com insuficiência cardíaca e teve de esperar dez meses para receber um coração novo. O transplante foi realizado ano passado.
“Percebi que o processo não seria fácil. São longas idas e vindas do hospital, internações e exames. Além da saúde física do meu pai ficar abalada, o emocional também fica”, conta.
“A questão do transplante de órgãos é desconhecida para a nossa sociedade, dificultando mais ainda as pessoas que necessitam”, afirma Stefanie.
Para contribuir no incentivo ao tratamento, a artista plástica pediu que familiares e amigos enviassem uma mensagem de apoio ao pai, segurando o símbolo da causa. O primeiro passo foi a criação do logotipo: um coração com linhas de arabescos, que demonstram as veias do coração, com flores e borboletas ao redor.
“O coração é a essência da vida. Como grafiteira, o arabesco é a minha marca registrada. As flores e borboletas representam o recomeço. A cada órgão doado um novo recomeço para alguém”, explica a grafiteira.
A fila de espera é dividida por biotipo, tipo sanguíneo e outras classificações. O transplante deve ocorrer o mais rápido possível, pois o órgão tem pouco tempo para ser reimplantado, assim que surge o doador. “A cirurgia do meu pai durou 18 horas. Para nós da família a espera é um dos piores momentos”, ressalta.
Segundo dados levantados em 2020 pela ABTO (Associação Brasileira de Transplantes), mais de 40 mil pessoas no Brasil estão na fila de espera por um transplante. Esse foi um dos motivos para iniciar a ação.
No Brasil, a Lei nº 9.434, de 1997, regulamenta o processo de doação e o procedimento só será feito após autorização dos familiares. Além disso, a Lei dos Transplantes determina que, após a retirada de tecidos e órgãos, o corpo do morto seja recomposto e entregue aos familiares em condições dignas para o sepultamento.
MESES DE ESPERA
A batalha de José Roberto do Nascimento começou em 1997, quando estava em casa e sofreu um infarto. “Foi desesperador aquela dor aguda no meio do peito acompanhado de uma sensação de queimação”, lembra.
Levado ao hospital e já com o diagnóstico da enfermidade, iniciou um tratamento por indicação médica com a colocação do marcapasso, um pequeno dispositivo que monitora o ritmo cardíaco e estimula o coração, evitando que os batimentos fiquem abaixo do considerado ideal.
Em 2020, o quadro clínico agravou-se: o marcapasso começou a falhar e foi necessário entrar na fila de transplante.
“Desde que descobri a doença a minha vida mudou”, conta José. “Entrar na fila não é fácil. Não tive muita ansiedade, mas me apeguei bastante na esperança de receber um órgão”, ressalta. “Infelizmente com a pandemia, os transplantes diminuíram, pois não há a possibilidade de transplantar um órgão de um doador morto por Covid-19 ”.
Segundo a ABTO (Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos), o número de doadores de órgãos diminuiu desde o começo da pandemia de Covid-19. Ao mesmo tempo em que o número de doações caiu, a taxa de mortalidade de quem está na fila de espera aumentou de 10 a 30%.
Após dez meses na lista de espera, o grande dia chegou. Há cerca de um ano, no Hospital São Luiz – Anália Franco, ele foi conduzido ao centro cirúrgico, onde sedado recebeu um novo coração de um jovem de 21 anos.
Depois do transplante, ele foi encaminhado para o hospital Israelita Albert Einstein e por fim para o Hospital Municipal Santa Catarina. Todo o trâmite é subsidiado pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
No Brasil, mais de 90% das cirurgias são feitas pelo SUS e cobertas por ele durante o atendimento que o antecede, como no acompanhamento após o transplante.
Com o passar do tempo e as longas horas no hospital, a artista começou a receber mensagens nas redes sociais de pessoas recém transplantadas dando apoio a causa ou buscando informações a respeito dos processos para a doação de sangue e órgãos.
Depois da cura do pai, ela decidiu manter a ação que segue se espalhando. A ideia dela é no futuro ter um instituto para conscientizar sobre o tema.