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Referência no vôlei sentado, Suzano atrai atletas e coleciona medalhas em Jogos Paralímpicos

Nathalie Filomena, 31, durante treinamento no SESI Suzano

Por: Cleberson Santos e Bruna Nascimento

Já conhecida como “capital do vôlei” graças aos títulos paulistas conquistados nas décadas de 1990, Suzano não deixou de ser referência nos saques e voleios, apenas mudou a altura da rede. No vôlei sentado, versão adaptada para atletas com deficiência, a cidade do Alto Tietê também coleciona títulos e medalhas.

Nos Jogos Paralímpicos deste ano, em Tóquio, cinco das 12 atletas convocadas para a seleção feminina vieram do Sesi Suzano — time 14 vezes campeão brasileiro da modalidade. No começo do mês de setembro, elas venceram o Canadá e conquistaram o bronze paralímpico pela terceira vez consecutiva.

Atletas da seleção brasileira de vôlei sentado exibem medalha de bronze e mascotes dos Jogos de Tóquio. Da esquerda para a direita: Laiana Rodrigues, Nathalie Filomena, Gizele Costa Dias e Ana Luísa Soares @Bruna Nascimento/Agência Mural

A cidade conta com nomes que vieram de muito longe para se integrar ao time, como é o caso da Laiana Rodrigues, de Manaus (AM), mas também de crias da região, como Gizele Costa Dias, de Mogi das Cruzes, também na Grande São Paulo.

Gizele, 43, é a mais experiente da seleção e esteve presente em todas as importantes conquistas do país na modalidade: três medalhas de prata em Jogos Parapan-Americanos e dois bronzes em Jogos Paralímpicos.

De 43 anos de vida, 32 foram dedicados ao vôlei indoor. Ela jogou profissionalmente por diversos times de São Paulo até 2009, quando precisou passar por uma cirurgia no ligamento cruzado anterior do joelho esquerdo.

“Nessa cirurgia aconteceu uma intercorrência, não é bem erro médico, e eu fiquei com um pedacinho do nervo fibular dilacerado. Portanto, fiquei com o pé caído”, relembra a líbero da seleção.

No mesmo ano em que passou pela cirurgia ela foi apresentada ao vôlei sentado. “Nem sabia que eu me caracterizava como uma deficiente física.”

Além de ter a atleta mais experiente da seleção, Suzano também tem a caçula do time. Ana Luísa Soares, 20, é a central da equipe e conheceu o esporte praticamente neste ciclo paralímpico, em 2016.

Ana Luísa Soares, 20, é a central da equipe de Suzano @Bruna Nascimento/Agência Mural

“Não conhecia a modalidade, cheguei um dia aqui só para conhecer, nem sabia se queria ficar, achava estranho. Mas aí eu falei ‘vou ficar para ver’, gostei e estou aqui até hoje”, conta Ana, que sequer gostava de jogar vôlei nas aulas de educação física.

Ana é de Cidade Tiradentes, zona leste de São Paulo. Ela ficou com uma limitação de movimento e perda de força na perna direita após um acidente de moto aos 14 anos.

Por conta da indicação de uma psicóloga, ela conheceu o Sesi e passou a praticar o vôlei sentado. Em 2019, com apenas três anos no esporte, já havia sido convocada para a seleção.

“Foi uma loucura, eu amei. Aprendo muito com as convocações da seleção. Tem vezes que eu paro olhando [para as atletas do time] e falo: ‘olha só quem são minhas amigas, duas vezes medalhistas paralímpicas’”, diz Ana, também medalhista.

QUATRO HORAS DE TRENZÃO PARA TREINAR

Entre as atletas de São Paulo, a ponteira Nathalie Filomena, 31, era a que mais sofria para ir ao Alto Tietê. Parte do time desde 2006, quando tinha 16 anos, ela morava no Campo Limpo, zona sul da capital, e enfrentava quatro horas de viagem para chegar ao Sesi em Suzano.

“Na época da faculdade, eu ia de trem no horário de pico, demorava quatro horas para chegar. Tinha dia que nem chegava. E para acordar cedo no outro dia? Os professores já sabiam da história, deixavam eu ir à tarde. Aí eu ia dormir. Eles passavam o maior pano para mim”, relembra.

Nessa época, as linhas 4-Amarela e 5-Lilás do metrô ainda não haviam sido inauguradas e as linhas da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) ainda não eram tão acessíveis quanto hoje em dia.

“Namoro com um cadeirante. Se fosse ele no meu lugar não teria vindo, é punk você pegar trenzão e não ter ninguém para te ajudar, a distância entre a plataforma e o trem é gigantesca. Se não tem ninguém ali para te empurrar você cai no buraco, até hoje.”

Nathalie nasceu com uma lesão no plexo braquial, uma rede de nervos entre a coluna cervical e o ombro esquerdo, além de uma paralisia branda neste mesmo lado. Porém, nada disso a impediu de jogar vôlei convencional desde criança.

“Não foi fácil, mas com meu jeitinho e com a ajuda do meu técnico, o Hélio, aprendi todos os movimentos. Hoje me destaco por conta disso, de ter batalhado muito, treinado muito para aprender. Para quem tem uma deficiência no braço não é fácil jogar vôlei”, diz Nathalie, citando seu técnico nos tempos de AABB, clube da região do Campo Limpo.

Foi neste mesmo clube que acabou conhecendo o vôlei sentado: “Um árbitro que apitava tanto em jogos do vôlei em pé quanto do vôlei sentado me descobriu e pediu para o Ronaldo [Oliveira, Orientador de Esportes do Sesi] me conhecer. Era uma quadra aberta quando cheguei.”

RUMO A PARIS

Sobre o futuro, Ana Luísa visa se preparar não só para Paris em 2024, mas também para os Jogos de 2028. “Sabe quando você realmente vê que você ama aquilo? Foi assim a experiência em Tóquio, é uma coisa surreal. Eu quero muito estar em Paris e espero estar em Los Angeles também, estou treinando muito para isso.”

No caso de Nathalie, foi a terceira vez que ela viveu a experiência dos Jogos e garante que foi a mais diferente de todas. Sem público, elas contaram com o apoio dos voluntários, que abraçaram a seleção brasileira como favorita deles, com direito a festa e musiquinhas.

Nathalie Filomena, nascida e criada no Campo Limpo, exibe o bronze conquistado em Tóquio. Foi a segunda medalha dela em Jogos Paralímpicos @Bruna Nascimento/Agência Mural

Ela afirma que pretende estar nos próximos Jogos Paralímpicos. “Pretendo jogar minha quarta Paralimpíada. Depois que a gente ganhou a medalha, foi só uma semana de folga. Já estamos em busca do ouro em Paris”, conta.

Gizele, que terá 46 anos em 2024, também está na expectativa de disputar mais uma edição. “Enquanto eu conseguir identificar que tenho saúde física, saúde mental e que consigo ajudar as minhas companheiras em quadra, eu pretendo sim.”

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