Em entrevista exclusiva à Agência Mural, o prefeito de São Paulo Ricardo Nunes (MDB) admitiu a falta de mais espaços de cultura e esporte nas periferias de São Paulo. O gestor falou ao “Próxima Parada“, podcast da Agência Mural, original Spotify, na última sexta-feira (30).
Eleito vice em 2020, o prefeito, que assumiu a prefeitura há 78 dias após a morte de Bruno Covas (PSDB), também falou sobre volta às aulas e os receios da pandemia, a dificuldade no acesso à moradia na capital e sinalizou que avaliará a situação do extremo sul da capital quanto ao transporte público.
Ele respondeu sobre a situação de Barragem, bairro da região de Parelheiros onde moradores relatam andar 30 minutos para conseguir acessar o primeiro ponto de ônibus.
Inicialmente, Nunes afirmou que, por ser uma área de proteção ambiental, não era indicado trazer outros serviços para o bairro a fim de não “estimular” que mais pessoas morem na região.
“Não é interessante do ponto de vista de estratégia da cidade você fazer com que aquela região tenha uma identidade populacional maior do que ela tem a capacidade de absorver”, alegou.
No entanto, questionado sobre quem já vive há décadas no bairro, disse que vai buscar resolver o caso. “Se tem um local em que as pessoas estão demorando meia hora para chegar no ponto de ônibus, é óbvio que vou resolver”, afirmou.
“Se tiver uma única família que mora numa chácara não é possível fazer isso [estender a linha de ônibus], mas gostaria depois que vocês pudessem me passar qual é a situação e peço para fazer uma análise”, reforçou o gestor.
Nunes também admitiu a falta de espaços de lazer para os jovens da cidade como um problema a ser enfrentado nas periferias, ao responder sobre o funk.
“Acaba indo muita gente [nos bailes] e também a gente tem essa questão de falta de opções, porque quando você não tem opção nenhuma você leva um número de pessoas muito grande para o mesmo ambiente e aí você naturalmente acaba perdendo um pouco do controle”, afirma.
De acordo com dados do Mapa da Desigualdade de 2020 da Rede Nossa São Paulo, vários distritos das periferias como Marsilac, Cidade Líder e Jaraguá aparecem zerados no quesito equipamentos públicos de cultura (para cada cem mil habitantes), enquanto no Bom Retiro, no centro, são 23.
A realização de bailes nos bairros movimenta a economia de regiões como Paraisópolis e Heliópolis, as maiores favelas da capital. Alguns dos MCs inclusive ajudam comércios locais a divulgar os produtos. Porém, há também reclamações de parte dos moradores por conta do barulho.
O estilo ainda sofre preconceitos e foi o local de uma tragédia em 2019, quando nove adolescentes morreram em Paraisópolis, após uma ação policial.
“Particularmente acho horrível aquelas motos ficarem fazendo aqueles barulhos. Temos muito que avançar mas é necessário oferecer mais opções de lazer, de cultura e esporte”, diz Nunes.
Sobre a favela, algumas ações foram prometidas após a tragédia como a criação de escolas, espaços de cursos profissionalizantes, a canalização do córrego da Antonico, a remoção de famílias que estão em área de risco, além da abertura de áreas de lazer.
VOLTA ÀS AULAS
Nesta segunda-feira (2), tivemos o retorno oficial das aulas na rede pública e um dos temores é a abandono escolar motivado pelos problemas como a falta de renda e o acesso à internet durante um ano de estudo online.
Pesquisa da Rede Nossa São Paulo mostrou que 21% dos entrevistados eram responsáveis por alguém que abandonou a escola.
Segundo Nunes, 35% dos estudantes não entregaram nenhum trabalho escolar durante a pandemia. Sobre os riscos de uma nova onda de contágio por conta do retorno presencial, ele afirma que a taxa de vacinação – 80% da população adulta da cidade tomou a primeira dose – pode reduzir os riscos para os mais de 1 milhão de estudantes da rede municipal e seus familiares.
“É possível com o protocolo de segurança fazer o retorno”, afirma. “A responsabilidade não é só do prefeito. Confiamos plenamente na nossa rede e na capacidade dos nossos professores, diretores, portadores pedagógicos de que a gente vai conseguir recuperar [esses alunos].”
Além de afetar a educação com as dificuldades com a falta de internet nos bairros mais distantes do centro, a habitação é um dos grandes problemas agravados pela crise de Covid-19 na cidade.
Ocupações como a Penha Brasil foram formadas por famílias sem condição de pagar o aluguel por conta da perda de renda. Mesmo com a crise, processos de desapropriação foram feitos na cidade deixando essas famílias sem local para morar.
Questionado, o prefeito afirma que estão previstas 49 mil unidades habitacionais e que o número é maior do que o feito nas gestões anteriores (5 mil por Haddad e 25 mil por Doria/Covas).
Diz que a demora nos últimos anos para avançar na fila das moradias é por conta da burocracia. “A prefeitura para fazer uma unidade habitacional tem que comprar o terreno, faz a licitação para comprar o terreno, é um martírio.”
Nunes diz que apostará num novo modelo. Em vez de seguir um processo de contratar uma empresa para fazer o projeto e passar por todas as fases, a ideia é comprar direto um novo condomínio que esteja pronto, dentro de regras estabelecidas pela gestão municipal.
“Basta colocar a regra certinha de como é que vai fazer a remuneração, o pagamento dessa unidade habitacional e você agiliza, a gente sai daquela burocracia toda de ficar 200 pessoas fazendo um projeto para comprar o terreno”, afirma. A proposta foi aprovada pela Câmara em julho.
Nunes citou que um dos grandes problemas na hora de garantir a moradia é que a população esbarra na burocracia bancária ao trabalhar informalmente. “Vamos constituir na prefeitura um fundo garantidor. A Prefeitura vai garantir então a partir do princípio de que as pessoas são do bem, que elas não estão fazendo as coisas pra poder passar ninguém pra trás”, diz.