A dona de casa Neuza Rossi, 67, nunca tinha participado de uma audiência pública. Por ser frequentadora assídua do Teatro Flávio Império, no Cangaíba, que fica a poucos metros de onde mora, compareceu ao local no último sábado (8), para acompanhar a discussão sobre o Plano de Metas da cidade de São Paulo. Apesar de não subir ao palco para apresentar demandas ou sugestões, a moradora não se conteve após uma fala provocativa sobre a falta de qualidade no atendimento público de saúde. “Falou certo, falou certo”, repetiu alto, enquanto aplaudia a colocação feita por um munícipe.
Durante a audiência regional da Penha, que é composta pelos distritos Artur Alvim, Cangaíba, Penha e Vila Matilde, o investimento na área da saúde foi uma das prioridades mais trazidas por moradores, líderes comunitários e conselheiros participativos da região. Com a presença do prefeito regional, Jurandir Junqueira Junior, e do secretário da fazenda, Caio Megale, os participantes expuseram durante cronometrados três minutos as suas sugestões para o Plano de Metas, divulgado pelo prefeito João Doria (PSDB) no dia 30 de março. No total foram 16 falas, das quais apenas três eram de mulheres.
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Além de criticar a proposta da atual gestão de fornecer medicamentos em farmácias da rede comercial, o professor Valdemir Nobre, 42, foi um dos participantes que apontou a sobrecarga da UBS Jardim São Francisco, no Cangaíba. “Fisicamente o equipamento não dá conta de atender uma população que cresceu muito nos últimos anos, e ainda recebe novos imigrantes haitianos, angolanos e do Congo. Sem falar no serviço prestado, que também é muito ruim”, disse ao 32xSP.
O Hospital Municipal Doutor Alexandre Zaio, na Vila Nhocuné, e a UBS Engenheiro Trindade, na Penha de França, também foram alvo de reclamações dos munícipes. “O que precisa ser incluído [no Plano de Metas], com muita ênfase, é a dignidade no atendimento ao povo”, discursou o conselheiro participativo Osni Pandori, 55.
“A maior demanda da região está na área da saúde e na regularização fundiária. A regularização é um pilar da habitação para que as pessoas tenham segurança de uma moradia digna com documento”, destacou o agente ambiental Jucivaldo Pereira dos Santos, 56, mais conhecido como Valdo. Apesar de reconhecer essas prioridades, o ativista ainda sugeriu que o Plano de Metas olhasse com mais atenção para aplicação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. “Temos 96 distritos na cidade, mas nem todos ainda são atendidos pela coleta seletiva”, mencionou.
Entre outros pedidos e propostas variadas para as áreas de educação, atendimento aos idosos e saúde preventiva, alguns munícipes também defenderam maior autonomia das prefeituras regionais e cobraram detalhamentos do Plano de Metas. “O controle de fiscalização social precisa de números claros e absolutos para acompanhar esse trabalho”, afirmou o especialista em gestão pública Cícero Floriano, 51, que também é conselheiro participativo da Penha. Na avaliação dele, o documento também deveria conter um planejamento executivo para permitir a verificação do cumprimento de suas metas. “O munícipe tem que confiar na gestão pública, mas também precisa ser ouvido e ter um retorno do que está pedindo.”
Sem demonstrar muita crença na efetividade das audiências regionais, o aposentado Nilson Ribeiro do Nascimento, 65, reclamou da falta de divulgação dos encontros e chamou atenção para o baixo quórum do evento. “Isso aqui deveria estar cheio de gente para discutir as melhorias da região, mas não chegou nem a cinquenta pessoas”, lamentou o conselheiro da UBS Jardim São Francisco. Ele também apontou a mudança de endereço da audiência, antes prevista para acontecer no CEU Quinta do Sol, como um motivo para a falta de participação da população.
Questionado sobre a troca de local às vésperas do encontro, o prefeito regional disse que a mudança foi ocasionada por indisponibilidade na agenda do CEU. O administrador regional ainda afirmou que, apesar do baixo número de participantes, a discussão foi produtiva. “Talvez, se trezentas pessoas tivessem aqui, seria tumultuada a reunião. Essas pessoas que estiveram aqui realmente tocaram em pontos sensíveis e importantes para a melhoria da nossa região da Penha.”
Junqueira admitiu que a área de saúde está entre as demandas prioritárias dos moradores, mas disse que será preciso trabalhar na melhoria dos equipamentos públicos já existentes. “A lógica é fazer funcionar melhor aquilo que já existe. Como eu invisto em um novo equipamento de saúde se eu já tenho vários que estão trabalhando precariamente?”, mencionou.
Ele também comentou as propostas que sugeriram maior autonomia das prefeituras regionais para resolver problemas locais. “A descentralização é a forma mais ágil de se administrar. Quando você desburocratiza, você agiliza mais a administração pública.”
Os munícipes ainda podem contribuir com o envio de sugestões para inclusão no Plano de Metas da cidade. Veja aqui como.
Fotos: Marina Lopes