“Mãe, já tá na hora de acordar?” Antes de me desejar bom dia, Pedro Henrique, 7, sempre quer ter certeza de que não acordou cedo demais. Normalmente, quando acorda, já estou sentada na mesa da cozinha, trabalhando no computador.
Quando ele levanta começa a minha correria: enquanto preparo o café, ele assiste a um desenho na TV; depois aquela “checagem” no caderno da escola e a lição de casa; enquanto a máquina lava as roupas da família dou um trato rápido na bagunça do dia anterior; depois corro para fazer o almoço enquanto ele toma banho.
“Filho, agiliza aí, a ‘tia do portão’ odeia quando a mãe chega atrasada”, é minha frase diária sobre o risco de perder o começo da aula.
Enquanto ele almoça, tomo banho e me troco apressada como se fosse uma prova do ‘Se Vira Nos 30´. Engulo o almoço para não ficar com fome no trampo, depois descemos correndo as escadas do prédio e saímos.
Antes de entrar para escola, ganho beijos e alguns acenos até que ele desaparece no meio das outras crianças. Pedro está no segundo ano e estuda na mesmo colégio em que eu e o pai dele nos conhecemos, uma das escolas municipais mais antigas do Capão Redondo, na zona sul de São Paulo.
Ser mãe é sempre um desafio. Para as mães das periferias, um desafio ainda maior. Não tem babá pra olhar a cria e nem empregada para cuidar da casa. É tudo com a mãe.
O portão da escola fecha às 13h30 e se eu atraso tenho que levar o Pedro para o trabalho comigo. Ruim para mim, pior ainda para ele que não terá nenhuma criança para brincar enquanto espera dar o meu horário.
Aquela “rede de apoio”, quando uma mãe pode contar com o apoio de outras mulheres para ajudar nos cuidados com o filho, não é tão fácil de encontrar. Tenho minha mãe que me ajuda e só. Mas antes de acioná-la sempre penso primeiro: será que ela tem algum compromisso hoje? Na dúvida, a maioria das vezes prefiro me virar sozinha ao ter que tirar a liberdade da mulher que também me criou praticamente sozinha em tempos ainda mais difíceis.
Outro momento difícil é quando o filho adoece. As crianças que ficam doentes aqui no Capão Redondo não têm outra opção: se é dia de semana e não passou das 19h, a mãe pode levar na UBS (Unidade Básica de Saúde) mais próxima, que nem sempre tem pediatra, mas ainda assim é melhor do que quem passa mal depois desse horário e tem que enfrentar a fila do UPA (Unidade de Pronto Atendimento) do Hospital Campo Limpo e passar horas na espera.
Há sete anos, entendi que minhas escolhas não eram por mim, eram por ele. Escolhi que queria viver a maternidade da forma mais completa possível, mas para isso tive que mudar muitas coisas na minha vida. Trampar da ponte pra lá, na região central, não é mais uma opção para mim por conta da distância e do tempo que levaria no transporte público.
Tenho a sorte de ter um trabalho que me permite levá-lo e buscá-lo na escola todos os dias. Um trampo em que ninguém desconfia de mim quando digo que fiquei o dia inteiro na UBS esperando para passar meu filho no pediatra.
Eles também me apoiam em participar do processo educativo do Pedro, só assim consigo ser vice-presidente do conselho escolar, membro da APM e do Grupo de Mediação de Conflitos.
Mas sei que sou exceção. A maioria das mães da quebrada fazem o corre diário sozinhas e matam um leão por dia para sustentar os filhos. Muitas delas saem da periferia para criar os filhos de outras mulheres que por opção ou necessidade precisam do apoio delas para desempenhar a maternidade.
É assim que chegamos ao Dia das Mães, que na periferia também pode ser diferente. O almoço por aqui foi a luz dos raios sol que entravam pela fresta da janela. A energia elétrica acabou por volta das 14h15 e a previsão de retorno é para as 19h.
Na casa da minha sogra, também no Capão, o almoço espera pela dona da casa que saiu para trabalhar 4h30 da madrugada e ainda não retornou.
Só um pequeno exemplo de como ser mãe na periferia é para as mais fortes.