Após receber diversas críticas sobre a retirada praticamente por completo dos grafites nos muros da avenida 23 de Maio, ação que faz parte do projeto Cidade Linda, o prefeito de São Paulo, João Dória (PSDB), decidiu voltar atrás. “Tirar o grafite das paredes é dar espaço para a pichação”, diz Mauro Neri, 35, grafiteiro que desde 2002 faz o seu trabalho em uma parte dos 15 mil metros quadrados de muro da avenida.
O taxista César Licciardi, 45, passa pela avenida todo dia e compartilha da mesma opinião que Neri. “Deixar as paredes cinza, praticamente sem cor, é dar espaço aos pichadores. Grafite é uma arte tão bela que inúmeras vezes parei para apreciar, tirar foto ou vi pessoas fazendo o mesmo”, lembra Licciardi.
“É claro que não me sinto contente em ter minha arte apagada, mas não é a primeira vez que isto acontece comigo ou com outros amigos grafiteiros. Entra uma gestão nova e as paredes são pintadas. Foi assim com [Gilberto] Kassab (PSD), [Fernando] Haddad (PT) e agora o Dória. Mas, o que muda é o processo como cada um agiu em meio a isso. É preciso haver um diálogo antes. Nós não somos informados de que nossos desenhos serão apagados e isto é frustrante”, diz Neri, que também é coordenador do projeto Cartograffiti.
Em nota enviada ao 32xSP no dia 24 de janeiro, a Secretaria Municipal de Cultura afirmou que vai “abrir um chamamento público em breve e avaliar propostas que serão apoiadas pela Prefeitura de São Paulo e desenvolvidas em áreas públicas em um festival de grafite.” A secretaria não se pronunciou se os grafites que cobrem os muros das periferias paulistanas serão retirados.
Ontem (26), Doria anunciou a criação do programa Museu de Arte de Rua. A iniciativa propõe a liberação de muros públicos e privados a cada três meses para que sejam grafitados. Um grupo de grafiteiros será selecionado por meio de um edital público e de uma comissão formada por artistas, críticos e especialistas no assunto para fazer a sua intervenção em local previamente escolhido na cidade.
Indagado se participaria do festival para deixar a sua marca novamente nas paredes da avenida, o grafiteiro disse que jamais deixará de fazer a sua parte e que o grafite é uma arte que se renova dia após dia.
Seja de forma independente ou não, ele é um dos artistas que foi convidado a participar na gestão Haddad do projeto “23 de Maio”, que teve como intenção ter a maior galeria de grafite a céu aberto da América Latina. Na época, abriu mão de alguns dos 30 trabalhos que já tinha por lá para dar lugar aos de outros artistas.
Pichação e Grafite
Qual é a diferença entre o grafite e a pichação? De acordo com o site artistas na rua, o grafite é uma arte baseada em desenhos: todas as letras e figuras que são utilizadas na pintura são pensadas e elaboradas, para que representem aquilo que o artista quer mostrar. A pichação é o ato de escrever ou rabiscar e, por isso, é considerada vandalismo e contestada por muitas pessoas.
A Lei Federal de Crimes Ambientais, de 1998, divide os trabalhos entre pichação e grafite. Enquanto pichar é proibido sob pena de detenção de três meses a um ano, além de multa, o grafite é permitido, desde que com autorização e “objetivo de valorizar o patrimônio público ou privado mediante manifestação artística”.
Mas, esta autorização não é nada fácil de conseguir, conta o grafiteiro Mauro Neri. “No projeto Cartograffiti, do qual a Secretaria Municipal de Cultura era parceira, foi muito difícil, pois passa por diversas instâncias para conseguirmos”.
Em São Paulo, os trabalhos são regulamentados pela Lei Cidade Limpa, que permite grafites em áreas públicas desde que com autorização conjunta da Comissão de Proteção à Paisagem Urbana e das prefeituras regionais.
Quando se trata de uma intervenção numa propriedade privada, o pedido tem de ser feito para o proprietário. Sem a autorização, os grafites podem ser considerados crimes ambientais e os autores estão sujeitos a pena de até um ano de prisão.
Irbem
Na última terça-feira (24) foi laçada uma edição especial da pesquisa Irbem (Indicadores de Referência de Bem-Estar), feita pelo Ibope em parceria com a Rede Nossa São Paulo. Ao todo, foram feitas 1001 entrevistas com maiores de 16 anos em toda a capital paulista. Uma das questões abordava a percepção da população sobre a aparência e estética da cidade. A nota recebida na área foi de 3,9, considerada abaixo da média. Porém, ela está entre as cinco áreas mais bem avaliadas pela pesquisa.
No recorte feito por regiões, as notas médias dadas à área pelos moradores das zonas sul 1 e centro, cortadas pela avenida 23 de Maio, foi de 3,9 e 4,4 respectivamente.
Foto principal: Acervo pessoal – Mauro Neri