Moradores da Cidade Dutra, Grajaú e Parelheiros, estão em campanha por uma universidade pública na zona sul de São Paulo, além de um parque tecnológico na região.
Atualmente, o movimento reuniu mais de 1.200 assinaturas nas ruas, mais de 400 na petição online e pretende continuar em campanha de maneira constante até que a política pública seja implementada.
A reivindicação popular por uma universidade pública começou em 1997, quando ainda não existiam políticas públicas de inserção dos jovens de periferias nas universidades, como o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e o ProUni (Programa Universidade para Todos) – criados em 1998, 1999 e 2004, respectivamente.
“Nos anos 2000, existia o movimento ‘Sem Universidade’ na zona sul. Através dessa movimentação popular, recebemos o Departamento de Pós-Graduação da Unifesp, que hoje é a Faculdade de Educação Física que fica em Santo Amaro”, conta Sheila Paulino, 43, professora de filosofia, psicanalista e militante do movimento pela universidade pública.
A luta pela universidade pública no extremo-sul de São Paulo tomou força novamente em 2023, após a ampliação do orçamento das universidades e institutos federais anunciada pelo Governo Lula, após cortes durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas verbas destinadas à ciência e tecnologia.
“Uma universidade próxima a você, muda a sua história”, afirma Alessandra Félix, 25, estudante de ciências humanas e coordenadora do cursinho Vladimir Herzog na Rede Emancipa, movimento social de educação popular.
É muito sofrido levar duas horas para chegar, sendo que é um tempo que você poderia estudar, ter lazer ou descanso. Não tem a ver só com a qualidade de vida, mas sobre sonhar outras possibilidades‘
Alessandra, estudante de ciências humanas
Enquanto educadora popular, ela relata que muitos alunos das periferias nunca pisaram na USP (Universidade de São Paulo) e nem imaginam que é um lugar acessível.
Ela ainda conta que existem casos de estudantes que foram aprovados em campus muito distantes de onde moram e, por não ter condições financeiras de se mudar, acabam desistindo dos cursos.
“As inúmeras barreiras, que estão presentes no próprio vestibular até a falta de recursos financeiros, fazem com que esse espaço continue sendo negado e isso não deveria ser assim, já que a educação é um direito fundamental. A falta de políticas públicas, por muitas vezes, acabam nos impedindo de sonhar”, relata.
Desenvolvimento do extremo-sul
Além de oferecer educação à população, os grupos que atuam pela chegada da universidade defendem que essa pauta é fundamental para a descentralização urbana, que significa tirar o investimento público e privado da região mais rica da cidade, como é o caso Paulista até a Vila Mariana, e ofertar em outros lugares da capital.
Um exemplo desse alto investimento está em Pinheiros, um dos bairros com as menores populações da capital e que possui mais linhas de ônibus e metrôs.
“A distribuição de oferta de serviço e de investimento do poder público para as regiões são muito desiguais. Isso mostra o preconceito de privilegiar algumas classes sociais em detrimento de outras”, afirma Sheila.
De acordo com os dados do Mapa da Desigualdade 2023, as populações do Grajaú, Cidade Dutra e Parelheiros chegam a mais de 757 mil pessoas. Mesmo representando quase 8,5% da população da cidade, a região não conta com nenhum museu, teatro, biblioteca pública, salas de concerto e espetáculos abertos ao grande público nos fins de semana.
“O centro de São Paulo é muito longe, inacessível e um lugar que rejeita a gente. Porque sempre as atrações de lazer legais ficam pra lá e quase não temos acesso aqui? Temos uma rica cultura e por isso temos que reivindicar o investimento público”, diz Alessandra.
As militantes da campanha afirmam que o primeiro passo para a conquista da universidade é a aprovação na Câmara Municipal de São Paulo e o engajamento de quem mora na região.
“Uma região se desenvolve quando tem oferta de serviços para a população, então isso é um primeiro passo para abrir o debate sobre a criação de mais museus, hospitais, linhas de ônibus e parques públicos”, reitera Sheila.
É importante ressaltar que o pedido não deseja que o campus fique em um lugar apenas, necessariamente. A Universidade de São Paulo, por exemplo, tem campus na zona leste, do Butantã até Pinheiros, e outro no Largo São Francisco.
Em relação a construção, o movimento se preocupa e pede que haja a preservação ambiental do espaço, sem desmatamento e que haja pesquisas que valorizem a rica Mata Atlântica existente.
“Em Parelheiros, nós temos uma escola agroecológica. Por que não se apropriar e estudar Ciências da Natureza, por exemplo? Porque a gente tem que ir para o outro lado da cidade sendo que a mata é o nosso quintal de casa?”, observa Alexandra.
‘A própria USP tem 50% dos seus alunos negros e boa parte são advindos da escola pública, então a universidade é um lugar de pluralidade, de incentivo ao conhecimento, a ciência, de desenvolvimento humano, do pensamento crítico e democrático’, conclui Sheila.
‘Onde a universidade está, o lugar se transforma e seria muito bom a gente ter isso’
Sheila Paulino, 43, professora de filosofia
No momento, a campanha conta com o apoio político do gabinete de Luana Alves, vereadora do PSOL/SP, e de Carlos Giannazi, professor e Deputado Estadual do PSOL/SP. Para acompanhar nas redes sociais, siga a página @universidadepublicagrajau.