São Paulo, a cidade que nunca para. É a agitação que não acalma, o ritmo que não desacelera e as construções que não param de surgir e fazem a cidade crescer cada vez mais para o alto: 34% do seu território verticalizado. Pesquisa realizada pelo ZAP, empresa do Grupo ZAP, aponta que a zona sul e o centro são as regiões mais verticalizadas.
No topo dessa lista, República e Higienópolis (ambas localizadas na região central) são as que mais têm prédios, com 97% dos imóveis sendo do tipo apartamento. Já Moema e Vila Olímpia (na zona sul) registram 93% e 88%, respectivamente.
Levando em conta os últimos dez anos, o estudo também apontou que a zona oeste foi a que mais teve novos prédios construídos. Atualmente, 58% dos imóveis da região são edifícios. Lapa e Vila Sônia são os bairros dessa região que mais receberam novas obras, ambos registraram um aumento de 16% das grandes construções.
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Prédios altos e numerosos são as marcas de São Paulo. A cidade teve seus primeiros prédios construídos na primeira década do século 20. O edifício Martinelli foi o primeiro a ser construído e causou polêmica na época por ter mais de 20 andares.
“O conde Martinelli construiu a casa dele no último pavimento, na cobertura, para provar que o prédio não ia cair, tamanho era o medo que a população da década de 1920 tinha”, explica Edimilsom Castilho, arquiteto e urbanista especializado em história social e professor e pesquisador no Instituto Bixiga Pesquisa e Formação da Cultura Popular.
Por concentrar os serviços de infraestrutura da cidade e as indústrias, a região central foi a que mais teve prédios construídos. Castilho conta que o processo de verticalização começou, efetivamente, nos anos 1940: “Nessa época, iniciou-se a ocupação do centro e das periferias que já tinham facilidade no deslocamento para essa região.”
“A partir de 1950, a verticalização passa a acontecer na Paulista; de 1980 a 1990, vai para região sul e a partir dos anos 2000 as grandes construções começam a se acentuar na zona oeste da cidade”
EDIMILSON CASTILHO, ARQUITETO E URBANISTA
ALVO DAS CONSTRUTORAS
Atualmente, a região oeste é “a menina dos olhos das grandes construtoras”. Historicamente, a parte oeste de São Paulo sempre foi uma área residencial.
“A moradia no Brasil sempre foi uma conquista da população elitizada. Essa região sempre foi reconhecida como o local de residência dessa elite”, conta o pesquisador.
Localizada entre a Marginal Pinheiros e a Marginal Tietê (o que facilita o acesso às principais rodovias da cidade), a zona oeste tem recebido novas operações urbanas que estão atraindo os empreendimentos.
“Os projeto que vieram depois da revisão do Plano Diretor da cidade estão estimulando o processo de valorização daquele solo urbano. É por isso que a Lapa, Vila Leopoldina, Barra Funda, Pompéia e proximidades estão recebendo tantas novas construções”, completa Castilho.
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PRÉDIOS TOMBADOS
Com 57 anos, o eletricista Carlos Arthur Silva vive no bairro da República (centro de São Paulo) há 23 anos.
“É excelente para morar. Tudo que precisamos está ao alcance: metrô, ônibus, bons restaurantes, teatros, cinema, mercados, padaria… enfim, tudo”, diz.
Silva conta que apesar do alto índice de criminalidade e moradores de rua, observa a atratividade da região para novos empreendimentos.
“Por curiosidade, certa vez contei 18 prédios sendo construídos no entorno (República, Vila Buarque, Arouche e Consolação). Como a região é tombada, temos muito do antigo e do novo, o que torna a região especial”
CARLOS ARTHUR SILVA, ELETRICISTA
Depois de passar por um período de precarização, entre 1970 e 1980, o centro de São Paulo sofreu um esvaziamento.
“O empobrecimento da população da região junto a violência urbana e o consumo de drogas concentrados naquela área contribuíram também para a degradação. Mas, a partir do ano 2000, começou o movimento de centrificação – de revalorização”, destaca o Castilho.
Entre as tendências que estão voltando a valorizar o centro paulistano e a provocar a especulação imobiliária, o professor fala do retrofit de prédios residenciais que consta “em fazer uma modernização sem alterar, necessariamente, a estrutura da construção. Com as adaptações o prédio acaba tendo valor de mercado novamente”.
MODERNIDADE E ALTURA
Aumento de moradores, de trânsito e de casos de roubos são questões apontadas por quem acompanha o surgimento de novas construções.
Um dos dois bairros mais verticalizados da cidade, Higienópolis foi o primeiro a receber obras de saneamento, ter esgoto encanado e fornecimento de água.
Moradora do bairro há 24 anos, a publicitária Nadya de Andrade Silva, 26, descreve a região como tranquila e ainda conserva a característica histórica que o nomeou: “o bairro é muito família; não temos barulhos durante a noite e é bem limpo também”.
A publicitária conta que observou a modernização chegando. “Os prédios estão mudando, se modernizando; alguns até já tem aqueles portões eletrônicos sem precisar de porteiro e colocaram grades”, comenta.
“Roubos começaram a aparecer, o que me deixa triste. Antigamente eu andava sem ter problema e agora vivemos com medo, mesmo tendo policiais”, complementa Nadya.
Na Lapa, o casal Jéssica, 28, e Daniel Falkenstein, 28, notaram as mudanças no policiamento e, principalmente, no trânsito.
“Aumentou o policiamento na parte da noite e retiraram moradores de rua que estavam acampados”, conta Jéssica.
“Acho que a maior quantidade de moradores vai aumentar o comércio ao redor. Houve, também, construções de prédios comerciais, o que pode somar na piora do trânsito nos dias úteis e nos horários de pico”
JÉSSICA FALKENSTEIN, MORADORA DA LAPA
Daniel Falkenstein já percebeu o aumento do número de carros e comenta sobre o condomínio em fase de construção na avenida Hermano Marchetti.
“O trânsito tem piorado bastante por perto e também na marginal Tietê nos últimos dois anos. Acredito que qualquer condomínio vai piorar a situação do fluxo de pessoas na região, que já é grande”, diz.
Sobre os problemas que a verticalização pode causar a cidade, o professor Castilho aponta que eles estão relacionados ao processo de urbanização acelerado e ao descontrole na Lei de Zoneamento.
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Quanto aos casos de roubos e insegurança, Castilho diz não acreditar que a verticalização seja a causa. “Acho que a criminalidade está mais ligada às questões da crise urbana e econômica”, comenta.
Já em relação ao trânsito, ele afirma ser “uma questão óbvia, quando aumenta o número de prédios, aumenta o número de pessoas no espaço físico”.
“E se cada uma dessas pessoas tem um automóvel? Esses carros vão paras ruas nos mesmos horários – todo mundo sai pra trabalhar de manhã e volta à noite – o que provoca uma diminuição da capacidade de absorção rodoviário”, segue.
A Lei de Zoneamento aprova a construção – e o número de andares – de novos empreendimentos de acordo com a capacidade de moradores que a região é capaz de suportar, levando em consideração o número de vias e as suas dimensões.
“Justamente por conta do processo de especulação imobiliária, muitas dessas leis são alteradas e começam a ter cada vez mais incorporadoras construindo edifícios que muitas vezes não respeitam os códigos das vias”, explica o urbanista.
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http://32xsp.org.br/2018/01/31/parque-no-butanta-pode-dar-lugar-a-cinco-predios-de-25-andares/