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‘Trabalhar com prevenção de suicídios exercita minha humanidade’ diz voluntária

Magno Borges/ Agência Mural

Por: Jacqueline Maria da Silva

Foi se perdendo nas escadas de uma estação de metrô, em 2007, que Rosana Andrade, 40, da periferia da zona norte de São Paulo, encontrou um posto do Centro de Valorização da Vida (CVV). “Eu olhei e recordei de uma propaganda que eu vi na televisão quando eu era criança”.

A semente já estava plantada, mas com a vida conturbada, aquele não era o momento para ela se comprometer com um voluntariado.

Tempos depois, em 2012, Rosana realizou dois sonhos: terminar a faculdade de serviço social, como bolsista do Educafro, e comprar o imóvel dos sonhos. Grata pelas conquistas, recordou daquele dia em que havia se perdido: “resolvi retribuir tudo de bom que estava recebendo”.

Fez a inscrição como voluntária no CVV, realizou o curso preparatório e iniciou os atendimentos, que manteve até 2018. Foi nesse ano que a servidora pública sofreu um acidente de carro muito grave em uma viagem para Goiás.

“O carro capotou três vezes, deu perda, mas eu não tive nada e sai daquele acidente e ilesa”, conta. Crente que esse era um chamado para o trabalho voluntário, Rosana passou a assumir outros compromissos no CVV, chegando à coordenação regional de São Paulo e, recentemente, à Comissão Nacional de Estudos, responsável por captar e formar voluntários.

Para ela, após a campanha do setembro amarelo, o tema tornou-se mais conhecido, porém o aumento de voluntários não é proporcional.

“A gente tem o desafio de ampliar o número de voluntários para aumentar a disponibilidade de atendimento, para que o serviço chegue em quem realmente precisa, principalmente nas periferias”.

Não é só quem está em busca de atendimento que ganha. Do outro lado da linha, no CVV, Rosana encontrou a oportunidade de contribuir para melhorar a sociedade e a si. “Quando a gente oportuniza trabalhar numa causa humanitária, eu também trabalho a minha humanidade”.

Ela reforça que tenta passar aos futuros voluntários a importância de ouvir o próximo com presença, e que o acolhimento não serve só nas horas de crise. “O suicídio é um processo. E quanto mais a gente oferece escuta, mais estamos atuando nessa prevenção”.

Transformando vidas

Graças ao trabalho, viveu situações marcantes, que transformaram sua vida. Em uma delas estava em um salão de beleza e comentou sobre seu trabalho no CVV. Foi então que percebeu o interesse de uma moça com idade aproximada de 20 anos.

“Ela me olhou e me mostrou os pulsos, com marcas de cortes. Percebi que não queria que outras pessoas soubessem e comecei a falar do CVV de uma maneira sutil, explicando como funcionava e como alguém poderia acessar. Eu vi a alegria dela por conhecer esse serviço e por saber que poderia ser acolhida”.

Na segunda situação, uma senhora conhecida a procurou em busca de aconselhamento.”Ela estava desesperada porque o filho falava de suicídio. “Eu disse para ela conversar com ele, acolher e dizer que você está com medo de perdê-lo, para abrir o coração para ele”.

Dias depois, um lindo agradecimento chegou em seu celular: “Eu estava fazendo o curso de psicologia na época, e senti que estava fazendo a coisa certa. Foi muito significativo ter ajudado aquela mãe”.

Na prática, ela acredita que muitas coisas mudaram em sua personalidade, dentre elas, o exercício da paciência e da compreensão, em um caminho de aprimoramento sem fim. “A escuta é algo terapêutico. Que a gente consiga escutar uns aos outros e oferecer essa escuta ativa de qualidade a quem precisa”.

A pedido da entrevistada, o nome foi modificado para preservar sua identidade.

Esta reportagem foi produzida com apoio da Report For The World

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