O vereador Doutor Panelli (PSB) foi reeleito como presidente da Câmara de Caieiras, cidade de 100 mil habitantes e 10 vereadores na Grande São Paulo. A votação no meio do ano passado não teve polêmica – apenas um voto contrário. A escolha, contudo, repetiu um procedimento que tem sido criticado nacionalmente: o voto foi secreto.
A Câmara afirmou que apenas a eleição da Mesa Diretora segue essa regra. “Além da tradição entre os vereadores, o recurso do voto secreto, ao menos para a eleição da Mesa Diretora, resguarda o direito ao voto dos vereadores, que invariavelmente se sentem livres para fazer as próprias escolhas”, disse Célio Campos, chefe de comunicação da Casa.
Tema que causou polêmica nas últimas semanas no Congresso Nacional, a chance do voto secreto ainda é um recurso utilizado em algumas Câmaras Municipais, inclusive na Grande São Paulo.
O assunto veio à tona depois da polêmica votação para a presidência do Senado, no começo deste mês. Na ocasião, parlamentares aliados do senador Renan Calheiros (MDB-AL) defendiam o voto secreto, enquanto seus adversários sustentavam a votação aberta. Por fim, Renan foi derrotado por Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Na região metropolitana, o recurso ainda é previsto, mas em casos específicos. Levantamento da Agência Mural a presença de instrumentos do tipo em 10 regimentos internos das 39 Câmaras Municipais. Outras 19 mantiveram a possibilidade de realizar sessão secreta, no caso de analisar a alta de decoro parlamentar (quando um vereador adota conduta irregular na Câmara).
TIPOS DE VOTOS PERMITIDOS NAS CÂMARAS DA REGIÃO METROPOLITANA
Outras cinco tiveram mudanças na Lei Orgânica (Constituição do Município) que impediram o uso dessa modalidade de voto.
“O voto secreto foi utilizado pela última vez na Câmara Municipal de Franco da Rocha durante a eleição da Mesa Diretora, realizada em janeiro de 2013”, diz em nota a Câmara de Franco da Rocha. A Casa, por outro lado, manteve uma exceção: pode votar secretamente no caso em que envolva falta de decoro parlamentar de vereador (quando o político adota alguma conduta questionável durante o mandato).
Conforme a mesma nota, o objetivo é a independência do voto nesse tipo de caso. “Em algumas circunstâncias, a votação para perda do mandato de um vereador, por exemplo, o voto secreto daria mais independência para os vereadores, independentemente se favorável ou contrário.”
Na vizinha Francisco Morato, esse tipo de voto pode ser solicitado desde que dois terços da Casa aprovem. Outros são menos específicos: as Câmaras de Cotia, Jandira e Itapecerica da Serra apontam o voto secreto, mas não determinam para quais casos.
HISTÓRICO
Previsto na Constituição e nos regimentos das Câmaras de todo o país, a justificativa para ocultar o voto é a ideia de proteger o indivíduo ‒ algo que ocorreu em governos ditatoriais, por exemplo.
Para a cientista política Joyce Hellen Luz, 27, apesar de assegurado pela Constituição, os regimentos abrem margem para que os parlamentares em todo país interpretem, à sua maneira, o emprego do mecanismo. “O voto secreto não deveria ser usado dessa forma [para eleição da Mesa Diretora], pois não responde às demandas por transparência do eleitorado”, declara.
No entanto, ela aponta que há complexidade na atuação dos parlamentares. Ela relembra que declarar abertamente o voto ou posição acerca de um tema, gerou, por exemplo, ameaças ao ex-deputado federal Jean Wyllis (PSOL-RJ) que abriu mão do próprio mandato e deixou o país.
Ainda conforme Joyce, os parlamentares também buscam se resguardar dos próprios partidos, quando contrários às decisões de seus líderes. “Os parlamentares dependem do partido, dependem dos recursos de campanha que, como sabemos, também são um modo de puni-los ou compensá-los”, afirma.
DESATUALIZADOS
O regimento interno define as regras para a condução do trabalho dos vereadores. Disponíveis nos sites das Câmaras Municipais, alguns deles estão desatualizados, pois não apontam as mudanças aprovadas na Lei Orgânica.
Na Câmara de São Paulo, por exemplo, o regimento interno disponível no site da Casa consta que a eleição da Mesa Diretora, o julgamento político de prefeito e vereador, são por voto secreto.
Contudo, desde 2001, de acordo com a Lei Orgânica do município, todas as votações realizadas na Casa são abertas. “A mudança foi proposta, à época, pela Mesa Diretora da Câmara. A Lei Orgânica é superior ao regimento interno”, afirmou o legislativo paulistano.
O mesmo tom foi adotado pela Câmara de Suzano, cujo texto aponta esse tipo de votação para os casos de processo de cassação, eleição da Mesa, e análise dos vetos do prefeito aos projetos de lei.
Procurada, a Casa disse que o regimento disponibilizado no site não foi atualizado. “A Câmara de Suzano não usa mais voto secreto há anos. Houve uma votação de uma denúncia contra o prefeito da cidade que poderia resultar na cassação do político. Essa votação, assim como todas da Casa (apreciação de veto, eleição de Mesa), foi aberta”, disse a Casa, em nota.
Em Itapevi, a informação é de que uma comissão trabalha na atualização do regimento, mas que desde 2006, quando a Lei Orgânica foi modificada, não há essa modalidade de voto.
Embu-Guaçu não conta com voto secreto desde 2001. No entanto, o artigo 14 do regimento interno aponta que o parlamentar perderá temporariamente o mandato caso revele “conteúdo de debates ou deliberações que a Câmara ou Comissão haja resolvido que devam permanecer secretos”. Ainda que tenham suprimido o voto secreto, há, ao menos no texto do regimento da Casa, certa preocupação em “guardar segredos”.
Rômulo Cabrera e Paulo Talarico são correspondentes de Suzano e Osasco
VEJA TAMBÉM:
Outras notícias da Grande São Paulo
Pessoas com deficiência enfrentam dificuldades em UBSs de São Bernardo