Desde cedo, Isabela Alves, 21, encontrou na arte uma maneira de se expressar. Moradora no Jardim João XXIII, na zona oeste de São Paulo, a artista é estudante de letras na Universidade de São Paulo, designer e trabalha, principalmente, com colagens digitais – um tipo de arte que usa a montagem com sobreposição de imagens na internet.
“[Trabalho] a questão da pessoa negra, da pessoa indígena, da ancestralidade, do afeto, principalmente das afetividades não brancas e não heterossexuais; então, como eu sou uma mulher lésbica, eu falo sobre isso”. Parte desses trabalhos ela divulga no Instagram.
Foi aos 18 anos que Isabela percebeu que tinha um dom para as artes visuais. Ela conta que iniciou sem a pretensão de, algum dia, ter as colagens como profissão. “Fui fazendo, quando eu vi, já estava criando. Já tinha entendido o que eu queria discutir dentro das colagens, e aí eu comecei a receber pedidos”
No entanto, a expressão artistica na região não parou por aí. Ela fundou junto com a namorada Jéssica Ferreira o sarau “A perfeita queda dos Búzios”, o evento foi interrompido desde o começo da pandemia de Covid-19.
Isabela também produziu o podcast “Poesia FM”, a instasérie “Caminhão sem freio”, teve trabalhos expostos na Galeria 540, na região de Pinheiros, em São Paulo, já colaborou para instituições como o Sesc e a revista AzMinas, e atualmente faz parte do coletivo Afrotometria, um coletivo de fotógrafos negros.
Inclusive, se reconhecer uma mulher negra foi um processo que Isabela só passou durante a adolescência, ainda no colégio. “Já sabia [que era negra], mas foi lá onde eu consegui teorizar isso, entender o meu lugar na negritude.”
A poesia e o slam também foram meios pelos quais Isabela encontrou para reafirmar as raízes e reforçar a própria identidade.
Entre 2016 e 2017, a jovem, junto com um grupo de amigos, fundou o coletivo “Quilombo XXIII”, com a intenção de “trazer debates políticos, históricos e culturais com o devido recorte racial no [bairro do] Jd. João XXIII”.
“A gente entendeu que não dá para concentrar as revoluções só no centro, e teve um movimento muito grande das periferias”, diz sobre a motivação de fundar o coletivo e a adesão dos moradores, principalmente os mais jovens.
Ela faz parte de uma geração periférica que anseia a mudança, juventude que cobra seus espaços e constrói, de dentro para fora, uma nova periferia.
Lamenta, por outro lado, a falta de representatividade negra em alguns setores artísticos. “Se você for nos museus, tem muitos quadros com mulheres brancas sendo amadas, com homens brancos sendo amados, cortejados, celebrados”, diz. “E a gente não celebra, né? A gente morre toda hora.”
*Esta reportagem faz parte da série Crias da Quebrada, com a história de dez jovens das periferias de São Paulo