Por: Daniel Santana
Notícia
Publicado em 16.01.2025 | 8:28 | Alterado em 16.01.2025 | 8:28
Poder transformar sonhos em realidade é uma grande responsabilidade. Trabalhar esses sonhos com a esperança de um futuro mais diverso no mundo da moda é o que move Jaque Loyal, 27.
“Quando a gente se coloca, é isso que acontece. É uma peça do dominó que caiu e está impactando todo o entorno”, afirma. Os resultados desse impacto no trabalho da estilista, moradora do Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, são vistos na região desde a adolescência.
Após abrir um brechó com um amigo aos 16 anos, Jaque começou no mundo da moda com a criação da marca Loyal. Ao longo de mais de uma década, o projeto cresceu reunindo diversas linguagens de moda periférica, sendo uma ferramenta de empoderamento na comunidade.
Além da Loyal, ela também atua como supervisora do Núcleo de Moda da Fábrica de Cultura do Jardim São Luís. Sob orientação dela, 26 aprendizes evoluíram ao longo dos últimos dois anos.
Por meio de diversas atividades, como oficinas e projetos, o grupo explorou a criatividade durante o curso. Ao todo, desenvolveram quatro desfiles, que alcançaram quase 800 pessoas, além de criar três coleções colaborativas focadas na construção de uma moda periférica brasileira.
No final de novembro de 2024, as aprendizes, a maioria pessoas não brancas e LGBTQIAPN+, apresentaram as criações finais.
Uma das participantes, Kitty Oliveira, 26, revelou como o Núcleo transformou a relação dela com a moda. Antes de conhecer o projeto de Jaque e um curso de Teatro da Fábrica, ela havia tido pouco contato com o setor, mas logo viu sua paixão florescer.
“O espetáculo tinha uma trilha curta de figurino, e aí me interessei pela área e comecei a estudar. Sempre gostei de desenhar e criar, então tudo foi se somando. Se for para fazer algo, quero costurar e desenhar roupas”, conta Kitty.
Para a conclusão do curso, ela criou peças inspiradas na cultura japonesa para expressar sua luta contra a depressão e seu processo de cura. “Não faço para vender ou agradar alguém. Tento transmitir o que passei e senti por meio dos figurinos”, explica.
Outra aprendiz impactada foi Isa Iwanaga, 22. “Ver as pessoas da quebrada, da rua de cima de onde você mora, criando juntas, tendo essa oportunidade, é sensacional”, destaca.
A coletividade e o senso de comunidade foram pontos fortes do curso. Isa enfatiza que projetos como esse, realizados nas periferias, valorizam o talento de jovens que desejam trabalhar com moda. “Temos muita coisa bonita para mostrar, mas, às vezes, faltam acesso, informação e apoio”, reflete.
Juliana Rodrigues, 29, também aluna do projeto, reforça a importância de iniciativas de moda nas periferias, onde a arte é frequentemente marginalizada.
‘A moda começa na periferia. Muitas vezes, nosso crédito é roubado porque estamos aqui. Mostrar isso para o público é provar que temos potencial, estamos prontos e temos talento’
Juliana, aluna do projeto
Tatuadora, a aluna incorporou a paixão pela arte na pele na coleção final. As peças fazem referência a tatuagens de países africanos e pinturas do hinduísmo. “Sempre quis fazer moda, e viver isso foi magnífico. Quis criar peças que eu usaria, mostrando que nossas artes têm valor.”
Jaque destaca a necessidade de mais políticas públicas para potencializar jovens estilistas das periferias. Atualmente, o Núcleo de Moda é gerido pela Poiesis, em parceria com a Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo.
‘É preciso fomentar a moda não só como expressão criativa, mas também como empreendedorismo e moda circular, para que ela não seja apenas um sonho, mas uma carreira e um meio de crescimento financeiro’
Jaque, estilista
Consultamos as páginas da Alesp (Assembleia Legislativa) e da Câmara Municipal de São Paulo para verificar projetos ligados à moda periférica nos mandatos recentes de deputados estaduais (2023-atualmente) e vereadores (2021-2024). Nenhum projeto de lei sobre o tema foi debatido nesses períodos.
Desfile Final do Núcleo de Moda da Fábrica de Cultura do Jardim São Luís @Daniel Santana/Agência Mural
A modelo com peças criadas pelos aprendizes do projeto Núcleo de Moda @Daniel Santana/Agência Mural
A jovem estilista maquiando a modelo para o desfile @Daniel Santana/Agência Mural
Aluno do curso arrumando os detalhes finais da peça que será usada no desfile @Daniel Santana/Agência Mural
Ainda no primeiro trimestre de 2025, o Núcleo deve abrir novas vagas. Nas palavras de Jaque, a estrutura disponível na zona sul já é um passo fundamental para o futuro: “Temos equipamentos, máquinas e materiais. O que falta é mais fomento, acessibilidade e viabilização. Os aprendizes da quebrada já são criativos, e com o apoio certo, eles vão longe.”
Jornalista, apaixonado por livros, samba e carnaval. Corintiano, vivo o futebol de domingo a domingo. Adoro contar histórias através do jornalismo.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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