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Agência de Jornalismo das periferias

Léu Britto/ Agência Mural

Por: Artur Ferreira | Sarah Fernandes

Notícia

Publicado em 07.11.2025 | 11:56 | Alterado em 10.11.2025 | 15:17

Tempo de leitura: 4 min(s)

A Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre as Mudanças Climáticas (COP30) começa na próxima segunda-feira (10) e jovens das periferias ainda temem que pautas importantes para as quebradas não ganhem espaço por falta de representação e vontade política.

Apesar de o evento ser realizado no Brasil, em Belém, no Pará, as dificuldades de credenciamento e os preços elevados de hospedagens – que dificultaram até a participação de delegações internacionais – afastou ativistas periféricos dos espaços de decisão.

“Espero que as pautas das periferias sejam tratadas como parte central da agenda climática, e não como temas complementares. É essencial que o debate sobre transição ecológica inclua urbanismo social, moradia digna, saneamento básico, reflorestamento e economia solidária”, reforça o ativista ambiental Wesley Silvestre Rosa, 38, de Cidade Ademar, na zona sul de São Paulo.

Wesley Silvestre Rosa, líder comunitário e ativista ambiental @Léu Britto/ Agência Mural

Ele não conseguirá participar da COP presencialmente, porque não conseguiu apoio financeiro para o evento. Wesley, porém, participou da comissão organizadora da instância municipal da Conferência do Clima em São Paulo, uma preparação para a COP30. A prefeitura da capital paulista não realizava o evento há 11 anos.

“As mudanças climáticas têm efeitos diretos sobre quem vive nas bordas da cidade: enchentes, deslizamentos, falta de saneamento, poluição dos mananciais e insegurança hídrica”, diz o ativista, que é presidente da OEKOBR, uma organização voltada à promoção do saneamento ambiental em São Paulo. “Nos bairros periféricos, prioridades como saneamento, moradia e segurança, são vistas como temas sociais e não ambientais, o que reduz a contribuição dessas comunidades na pauta climática.”

A diretora de Territórios da Periferia sustentável, Gabriela Santos @Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Gabriela Alves, diretora da organização Periferia Sustentável, concorda. Ela estará na COP30, mas reforça que dificuldades no credenciamento afastaram jovens das quebradas do evento.

“O principal desafio tem sido ter acesso aos espaços de debate. Hoje o credenciamento é muito difícil e está muito disputado, diferente de outras COPs”, diz a ativista do Jardim Ângela, na zona sul de São Paulo. “A gente precisa garantir juventudes no evento, mas juventudes representativas, periféricas e racializadas.”

Locais diferentes, desafios iguais

“É histórico a COP acontecer na Amazônia, mas também levanta preocupações. Mesmo que coloquem as periferias no centro da pauta, qual é a garantia que essas regiões realmente tenham voz?”, questiona a pesquisadora em antropologia social Patrícia Patrocínio, 29, fundadora do coletivo Perifa Amazônia, de Manaus.

Patrícia e outros membros do Perifa Amazônia enfrentaram muitos desafios na busca por financiamento para participar da COP. “É muito difícil viabilizar hospedagem e transporte, os altos custos e a falta de estrutura tornam inacessível”.

Patrícia é fundadora do coletivo Perifa Amazônia, e une clima e hip-hop @Arquivo pessoal

Ativistas denunciam que Belém vive uma crise de hospedagem com altos preços e poucas opções de locação, tanto para pequenos grupos quanto para as comitivas governamentais e empresariais. Em plataformas de aluguéis por temporada, como Booking e Airbnb, as diárias na capital paraense atingiram preços exorbitantes. A estadia em uma suíte chegou a R$6.500 por dia. Um apartamento de um quarto foi anunciado por R$1 milhão para 11 noites e uma casa simples foi orçada em R$1,21 milhão para o período.

Sem as periferias na COP?

Maurício Max, 29, é jornalista e comunicador popular e afirmou ter ficado feliz pela escolha de Belém como sede do evento. “Considero que é uma ótima cidade e muitos dos problemas expostos podem reforçar que áreas urbanas, principalmente da Amazônia, precisam de uma atenção especial e imediata”, afirma.

Ele fundou um projeto de jornalismo popular chamado Periferia Respira, na comunidade do Cafundó, no distrito de São Francisco, em Manaus. Mas a cobertura da COP, ao que tudo indica, será à distância.

Maurício Max na comunidade do Cafundó @Arquivo pessoal

“Participar de um evento grandioso desse seria uma honra pra mim, mas sei que há limitações e uma gama de vozes que precisam estar lá. Penso em somar nas narrativas, principalmente as periféricas”.

Acompanhando a realidade das quebradas, ele não titubeia quando perguntado sobre os assuntos mais urgentes a serem tratados na COP: garimpos ilegais, madeireiras e queimadas nas florestas, que impactam no clima e causam impactos diretos nos moradores das periferias.

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“Acredito que é uma oportunidade de mostrar para o mundo a realidade que vivemos e também a potência das periferias”, afirma a comunicadora e estudante de licenciatura em matemática Vânia Witoto, 24. “Mas ao mesmo tempo, existe a preocupação se o evento vai ser realmente acessível para nós que estamos nas comunidades e periferias ou se vai ficar restrito a autoridades e grandes instituições.”

A jovem atua no Instituto Witoto, uma organização liderada por mulheres indígenas na periferia de Manaus, e esgotaram tentativas de participar da COP30, mas os altos custos com hospedagem e alimentação limitaram o acesso.

“Somos nós que sentimos os impactos das mudanças climáticas de forma intensa: o calor extremo, as secas históricas que afetam os rios e as cheias que alagam as comunidades”.

Presença garantida, mas com desconfiança

Victor Zagury, 29, também conhecido como Zag, se autodenomina um “artivista”. O artista visual coloca em primeiro plano nos seus trabalhos as mudanças climáticas e o racismo ambiental, mas desconfia que a COP consiga trazer soluções concretas para as periferias.

“Uma coisa que me assusta é que a primeira edição aconteceu antes de eu nascer. Já tenho 29 anos e nada foi concretizado em nível mundial. A gente ainda tem perfuração de petróleo em áreas de biodiversidade, leis que afrouxam a devastação da natureza e dos biomas…”.

O ‘artivista’ Victor Zagury, Zag, que foca sua obra na crise climática e povos originários @Arquivo pessoal

Zag, que vive em Manaus, pretende ir de barco para o evento com outros colegas ativistas, em caravana. Para driblar os altos custos das hospedagens, eles ficarão na própria embarcação.

“Eu não acho que a COP 30 seja acessível, tudo é superfaturado. É um ‘capitalismo verde’ que se aproveita da pauta”, ironiza. “A juventude é quem mais sofrerá [com as mudanças do clima] no futuro e para quem está na periferia é sempre desafiador lutar pelas pautas importantes”.

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Artur Ferreira

Jornalista e redator. Atuou nas redações do Observatório do Terceiro Setor e Rádio CBN. Adora livros, cinema, podcasts e debater sobre política internacional. Palmeirense. Correspondente do Jardim São Luís desde 2022.

Sarah Fernandes

Jornalista e geógrafa, com foco em direitos humanos e ambientais. Reúno mais de 10 prêmios de reportagem, entre eles dois Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos.

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