Em meio à crise do coronavírus, Agência Mural foi a 88 farmácias e supermercados e encontrou o produto em apenas 13 locais
Cléberson Santos/Agência Mural
Por: Redação
Notícia
Publicado em 20.03.2020 | 16:00 | Alterado em 27.02.2024 | 16:22
Agência Mural foi a 88 farmácias e supermercados e encontrou o produto em apenas 13 locais em meio à crise do coronavírus
Tempo de leitura: 4 min(s)Uma caixa com 24 unidades de álcool gel era desembalada na quarta-feira (18) na Drogaria Luziel. Cada uma tinha 60 ml e saía por R$ 7. Ali era o único produto disponível em boa parte do distrito do Capão Redondo, na zona sul de São Paulo.
Ao longo do dia, a Agência Mural esteve em 17 estabelecimentos em bairros da região, como Chácara Santa Maria, Jardim São Bento Novo, Parque Independência e Valo Velho.
Nenhum outro contava com o produto que começou a sumir das prateleiras da cidade e da Grande São Paulo, desde o anúncio da pandemia de coronavírus.
Encontrar um estabelecimento assim também era questão de sorte em diversos bairros de São Paulo.
Ao todo, a reportagem visitou 88 lugares da capital e da Grande São Paulo. Apenas 13 tinham o álcool em gel usado para higienização das mãos – um dos principais cuidados para reduzir a velocidade do contágio. Naqueles em que havia, os comerciantes enfatizavam que o produto havia acabado de chegar e que não duraria muito tempo.
Sem escolha, vários clientes no Capão apelaram para o álcool de limpeza. “Também serve”, disse um rapaz em uma unidade do Supermercado Barbosa. Outros falavam até no uso do gel para cabelo. No entanto, infectologistas apontam que o álcool líquido não é eficaz para esse tipo de limpeza.
Em outra rede de supermercados da região, o líquido acabou um dia antes, segundo funcionários. O estoque acabou rápido, mesmo com a restrição de compra de dois por cliente.
Onde ainda havia álcool, os preços variaram. Em Embu-Guaçu, na Grande São Paulo, o único local com o produto vendia álcool gel a R$ 5,60 e R$ 10. A maioria dos estabelecimentos, contudo, ultrapassou os R$ 15. No Pimentas, em Guarulhos, uma farmácia vendia 500 ml pelo preço de R$ 25.
Mas quem encontrava algo no bairro tinha sorte. Em outro estabelecimento, não havia previsão e o anúncio era de que o preço tinha subido. “O preço de compra está inviável”, disse um funcionário, onde o preço estava R$ 18. “Também temos pequenos volumes de álcool líquido, mas a melhor coisa é sabão”.
Na região do Jaçanã, na zona norte de São Paulo, 245 ml saíam por R$ 19,99, valor semelhante ao bairro Jardim Felicidade. No Jardim João XXIII, R$ 15,99 por 420 ml.
SEM ÁLCOOL
No Tucuruvi, havia clientes esperando antes das 7h em frente a drogaria na esperança de encontrar o produto. Mesmo assim, a loja não continha o álcool em gel.
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A falta da substância tem levado a casos de desespero ou quase folclóricos na busca pela higienização.
No Capão Redondo, comerciantes disseram que uma moradora quase chamou a polícia, porque a loja limitou o número que cada morador poderia comprar.
Em Cidade Tiradentes, na zona leste, a vendedora contou que tendo em vista que não havia mais produtos na loja, um homem parou em frente ao estabelecimento com um carrinho que vendia “álcool gel a R$ 100”.
História parecida foi contada em Mogi das Cruzes, mas por um valor mais moderado: um frasco de 10 ml por R$ 12.
Em Guarulhos, vendedoras comentaram que os clientes compraram ‘gel cola’ para tentar criar uma produção caseira.
Segundo orientação do CFQ (Conselho Federal de Química) em parceria com o Ministério da Saúde, há riscos na prática de possíveis receitas do produto, de forma caseira.
“Quando se utiliza álcool líquido em elevadas concentrações, aumenta-se bastante o risco de acidentes que podem provocar incêndios, queimaduras de grau elevado e irritação da pele e mucosas”, diz o CFQ
Também aponta cuidados com a venda de outros tipos álcool. “A venda de álcool líquido em concentrações superiores a 54 °GL está, inclusive, desautorizada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) desde 2013, que considerou os riscos oferecidos à saúde pública decorrentes de acidentes por queimadura e ingestão”, continua o comunicado.
“O álcool em gel fabricado a partir de receitas e métodos caseiros não passa por nenhum controle de qualidade, por isso sem garantia de eficácia”.
Dos 14 estabelecimentos que a Agência Mural foi em São Bernardo do Campo, nenhum contava com o líquido. Na Farmácia Popular Drogaria Sergipe, o estoque acabou sexta-feira (13). No Supermercado SM Muramoto, não há álcool gel desde o dia 9. No lugar seis fileiras de álcool líquido.
No caso do Mercado Nascer do Sol, os dois produtos haviam se esgotado na quarta-feira (18).
De acordo com a Patrícia Guedes, 40, proprietária e caixa do mercado Nascer do Sol, fornecedores comentaram que o preço vai aumentar. “Se for assim, se o preço com os fornecedores estiver lá em cima, eu não vou pegar. Imagina ficar R$ 27 ou 32 como eu vi em outras regiões, vou precisar vender por quanto? É para acabar com o povo. Ganhar na dor dos outros”, afirmou.
O governo do estado anunciou que a partir de segunda-feira (23), em acordo com as empresas do setor, o álcool em gel deve ser vendido pelo preço de fábrica.
Em Osasco, na Grande São Paulo, a Agência Mural encontrou álcool gel na Farmácia Campeã, na quarta-feira (18), no centro da cidade. No entanto, os vendedores avisaram que foi sorte. “Acabou de chegar”. Ali o preço variava de R$ 10 para 100 ml e R$ 24,99 para 500 ml.
Não foi a mesma sorte de quem procurou na periferia do município. No Bandeiras, zona sul da cidade, não havia nada em três estabelecimentos. Um dos comerciantes citou que acabou desde sábado (14). “Aqui chegou hoje, mas acabou em 15 minutos”, disse outro vendedor do bairro.
Em outra região do município, a estratégia era realizar um cadastro de pré-venda. A Farma Freitas, no Padroeira, aceitava encomendas para um produto que sai por R$ 19,50, uma embalagem de 420 ml.
Colaboraram: Aline Kátia Melo, Ana Beatriz Felicio, Ariane Costa Gomes, Cintia Gomes, Estela Aguiar, Fellipe Sales, Giacomo Vicenzo, Jariza Rugiano, Jéssica Silva, João Vitor Reis, Kátia Flora, Paulo Talarico, Pietra Alcântara, Rubens Rodrigues, Sheyla Melo, Sidney Pereira, Thalita Arcangelo e Vagner Vital.
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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