Produzido pelo Coletivo de Quebrada, longa-metragem mostra linha 7545, uma das mais movimentadas da zona oeste de São Paulo
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Por: Estela Aguiar
Notícia
Publicado em 26.06.2020 | 15:29 | Alterado em 06.03.2024 | 14:12
Produzido pelo Coletivo de Quebrada, longa-metragem mostra linha 7545, uma das mais movimentadas da zona oeste de São Paulo
Tempo de leitura: 4 min(s)Correr para pegar o ônibus lotado, enfrentar o trânsito nos horários de pico, chegar até o centro de São Paulo, no vale do Anhangabaú, e começar a trabalhar.
A história que se repete no dia a dia de moradores da periferia de São Paulo é o tema do documentário “Até onde a gente vai?”, que estreia no sábado (27), às 19h, no canal Coletivo da Quebrada no Youtube.
O longa aborda a vida de Amanda, Lília e Rogério, três moradores do distrito da Raposo Tavares, na zona oeste da capital, que mostram as relações com o transporte público, especialmente em uma das principais linhas da região, a 7545-10 – Praça Ramos/Jd.João XXIII.
Na história, os três protagonistas fazem uso da linha para irem ao trabalho, estudos e lazer, e passam pelos dilemas de estarem fora das regiões centrais, como a demora, a lotação e o tempo do trajeto.
Entre novatos e veteranos do audiovisual, o longa-metragem conta com a direção de Pedro Fernandes, 24, que também participa do roteiro junto com Alvim Almeida Silva Junior, 20.
A ideia surgiu da experiência dos dois em relação ao transporte, que ao mesmo tempo é individual e coletiva. “É o ônibus que a gente mais pega, mais pedia carona quando não tínhamos dinheiro, além do final da linha, na Rua Nazir Miguel, ser um ponto de encontro para muita gente do bairro”, justifica Fernandes.
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A estreia, que antes estava programada para ser presencialmente, teve que ser remanejada para o online, devido a pandemia do novo coronavírus. Apesar disso, a expectativa permanece alta.
“Sabemos que existe uma perda nesse formato, mas também é uma experiência interessante lançar online. Não há limites no número de pessoas e nem limitações territoriais”, diz Lucca Amaral Tori, 28, entrevistador no documentário.
LOTAÇÃO
Apesar de ter sido gravado em 2019, antes da pandemia, a lotação no transporte público aponta discussões que se tornaram ainda mais urgentes nos tempos de distanciamento social.
“A sempre precarizada, distante e cara ligação entre periferias e centros é mais uma barreira para essa população acessar os direitos ao trabalho, a educação, cultura e saúde”, afirma o entrevistador e produtor Diego Peralta, 24.
“Nos tempos do “Fique em casa” vem a pergunta: “Quem pode não sair de casa?” De novo, a população periférica recorre ao transporte, dessa vez, mais escasso.”
Nas últimas semanas, o secretário municipal de Transportes, Edson Caram, deixou o cargo, após ter sido criticado publicamente pelo prefeito Bruno Covas (PSDB), após não cumprir o que foi prometido no início da flexibilização da quarentena em São Paulo: que os ônibus circulariam somente com passageiros sentados.
Assumiu a pasta, Elisabete França, mas os ônibus permanecem cheios em meio à Covid-19.
Para Pedro, o novo coronavírus piorou de vez a relação do trabalhador com o ônibus. “A relação que a gente fazia do transporte público com o navio negreiro é mais explícita que antes. Estamos entrando numa lata para morrer”, diz, citando as embarcações utilizadas no tráfico de escravos no passado.
PROTAGONISMO DAS PERIFERIAS
A produção saiu do papel por meio do edital VAI (Valorização de Iniciativas Culturais), ação promovida pela SMC (Secretaria Municipal de Cultura) que apoia financeiramente atividades artístico-culturais.
As gravações foram feitas por uma equipe de moradores das periferias de São Paulo, boa parte na região do Jardim João XXIII e bairros vizinhos, sendo maioria participantes do Coletivo da Quebrada.
O grupo surgiu há três anos com atividades pontuais sobre direito à cidade, com foco no transporte, nas escolas das redondezas. A partir daí, houve a necessidade de ter um local para expor essas atividades e realizar novos projetos.
Para o diretor e roteirista da obra, Pedro Fernandes, o público poderá ter interpretações variadas. “Existem histórias dentro dessa lata que é o transporte.”
A produtora Letícia Lakatos, 23, diz que além de uma identificação com a história dos personagens, o público vai ser contemplado em uma questão que é pauta recorrente no acesso à cidade.
“As catracas não deveriam existir, apesar de chamarem de “transporte público” é totalmente excludente, quem não tem a grana tem que esperar a boa vontade de algum motorista para conseguir carona, vide a história da Amanda, uma das protagonistas”, diz.
Sonhadora e pré-vestibulanda para o curso de Letras, Amanda Evelyn Araújo Silva, 26, revelou a experiência de ter por uma semana uma câmera filmando os passos e trajetos dela.
“A princípio eu fiquei envergonhada porque ninguém quer mostrar o lado ruim da sua vida, mas achei necessário também. E eu estava entre amigos e sabia do objetivo do documentário. Isso me deixou mais confortável.”
Em produções audiovisuais centrais em que Pedro já participou, por mais que ele fosse o primeiro a sair de casa, ele era sempre o último a chegar devido à demora, e o tempo que se passa dentro do ônibus.
“Foi muito louco gravar experiências assim, registrando aquilo que nós lidamos. O documentário não é só uma conexão dos três personagens, ele é uma conexão de quem estava filmando, houve esse reconhecimento.”
Jornalista. É fiel à crença de que da ponte pra cá, o jornalismo é revolucionário. Apaixonada por carnaval, filmes e séries. Correspondente do Jardim João XXIII desde 2019
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