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Bibliotecas comunitárias atraem leitores com cultura e ações sociais

Sem bibliotecas públicas na região de Águas Claras, em Salvador, entidades criadas e geridas por mulheres buscam trazer novos frequentadores

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Lucas Barbosa/Agência Mural

Por: Lucas Barbosa

Notícia

Publicado em 01.10.2021 | 5:45 | Alterado em 23.11.2021 | 18:51

Tempo de leitura: 5 min(s)
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A pedagoga Ruane de Jesus é mediadora de leitura da Biblioteca Comunitária Sandra Martini, em Águas Claras @Lucas Barbosa/Agência Mural

Foi na infância, há mais de 10 anos, que o artista e músico Tiago de Jesus Santos, 22, descobriu na Biblioteca Comunitária Sandra Martini, em Águas Claras, Salvador, o quanto a leitura iria fazer parte da sua vida e influenciar o seu trabalho.

“Eu era uma criança antissocial, que não jogava bola, não empinava pipa. Minha onda é bem barata, é leitura e arte. Sempre que queria fugir do mundo, ia pra biblioteca porque lá não podia fazer barulho e era o único lugar onde eu estava em paz”, diz o artista que também é MC.

“Percebi que todos os grandes MCs liam muito, então comecei a ler também. É preciso ter conteúdo para desenvolver uma mente rápida e dar uma resposta certeira na hora da batalha MC, porque informação e conteúdo são nossas armas. Comecei a devorar livros e todos com conteúdos políticos”, diz.

Cruzando o seu caminho, a biblioteca, localizada na Rua Jacob de Carvalho, fica na rua do jovem e marcou o início de sua trajetória com as palavras.

“Acho que o que me salvou foi ter essa biblioteca comunitária do lado da minha casa. Depois que a conheci e acessei as informações, comecei a ir em outras bibliotecas comunitárias”, diz Santos.

Na região, as bibliotecas comunitárias têm suprido a falta de equipamentos culturais e mantido programações focadas no incentivo à leitura. “Crianças e adolescentes que moram ao redor são os principais frequentadores do espaço”, diz Ruane de Jesus, 26, mediadora de leitura e pedagoga.

Hoje, a biblioteca funciona no convento das Irmãs Franciscanas da Imaculada, mas tem gestão autônoma no espaço. Ruane destaca o papel das mulheres negras no comando da entidade, que homenageia a professora Sandra Martini, fundadora da primeira biblioteca comunitária de Águas Claras.

“A biblioteca passou por diversas gestões e hoje é gerida por quatro mulheres negras que possuem o objetivo de estimular e incentivar de novos leitores, priorizando leituras e escritas afro-brasileiras e africanas.”

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Miraneide Gomes organizando o acervo de livros da Biblioteca Comunitária Sandra Martini @Lucas Barbosa/Agência Mural

Também gerida por mulheres negras, no Loteamento Condor Caminho 10, nº 17, outro endereço de Águas Claras, funciona a Biblioteca Comunitária Condor Literária.

A pedagoga Patrícia Santos, 40, uma das fundadoras e responsáveis pelo espaço, conta que a iniciativa surgiu a partir de um processo de expansão da Biblioteca Sandra Martini, em 2014.

“Na época realizamos uma divisão dos acervos, móveis e das funcionárias. Na inauguração fizemos um mutirão e realizamos uma caminhada literária e atividades culturais”, relembra.

Vera Dias, 35, mediadora de leitura da Biblioteca Comunitária Condor Literário, diz que a iniciativa surgiu para suprir uma demanda do bairro. “As pessoas da comunidade perceberam a importância da literatura para o desenvolvimento do ser humano. Elas acreditam na relevância da existência de uma biblioteca comunitária no bairro para ampliar a oferta de literatura de qualidade e o atendimento para um público maior e mais diversificado”.

Atualmente, uma série de atividades fazem parte da programação da instituição, que ganhou o nome dos moradores em homenagem aos pássaros da região.A entidade faz parte da Rede de Bibliotecas Comunitárias de Salvador, que reúne polos de leitura compostos por bibliotecas comunitárias e que atuam na capital da Bahia desde 2008. A iniciativa conta com diversas ações em prol da democratização do acesso ao livro e da formação de leitores.

Também em Águas Claras, está a Biblioteca Comunitária do Movimento Cultural de Águas Claras, conhecida como Moca, fundada há seis anos, por lideranças comunitárias da época. A instituição fica no número 61 da rua Álvaro Ramos Batista.

Maria Raimunda Silva Rodrigues, 44, mediadora de leitura da biblioteca, destaca uma programação cultural voltada para incentivar novos frequentadores e leitores, incluindo atividades como rodas de capoeira, oficinas criativas, mediação de leituras, entre outras.

Quinzenalmente, às segundas-feiras, acontece na Moca uma atividade que mistura ação social e arte, chamada “Sopas, prosas e poesias”, quando as doações dos moradores viram uma distribuição de sopas com versos de poesias.

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Maria Raimunda Silva Rodrigues, 44, mediadora de leitura da Moca @Divulgação/Moca

Assim, como na Moca, a preocupação com a comunidade também bateu à porta da Biblioteca Comunitária Sandra Martini.

A artista circense e mediadora de leitura na entidade, Miraneide Gomes, 33, conta que diversas ações sociais foram promovidas pela biblioteca para reduzir os impactos causados pela pandemia na comunidade.

“Conseguimos cestas básicas, fazer distribuição de livros do projeto ‘Leia para uma criança’ do Itaú social, e ainda participamos de atividades culturais em articulação com o FavelArts africanas e o Coletivo Empretecidas. Também conseguimos criar um clube de leitura on-line através do edital Aldir Blanc”, enumera Miraneide.

Outro ponto em comum entre as bibliotecas comunitárias de Águas Claras é a maneira de manter suas atividades. Todas as instituições aceitam doações, fecham parcerias com comerciantes locais e participam de editais públicos.

A maioria também recebe apoio do financiamento do “Programa Prazer em Ler”, do Instituto C&A. Como é o caso da Biblioteca Comunitária da Tia Jana, localizada na rua General Figueiredo, 13 E, também no bairro.

A pedagoga Zanilza Ventura, 42, gestora da biblioteca, conta ainda que uma doação importante mudou o destino da instituição. “A nossa sede seria dentro da Creche do Convento, mas recebemos uma casa de doação de uma senhora da comunidade”.

A senhora é a Tia Jana, que dá nome ao projeto. “É como todos da comunidade a chamam. Mesmo analfabeta, ela acredita no poder de transformação que a leitura tem e sempre foi uma contadora de histórias”, diz Zanilza.

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Zanilza Ventura explica que as atividades da biblioteca são pensadas com a rede da qual faz parte. “As atividades são planejadas de acordo com as agendas da Rede de bibliotecas Comunitária Municipal e Nacional que participamos e adequamos às necessidades da nossa comunidade.”

A estudante Bruna Cupertino, 22, mediadora de leitura da Biblioteca Comunitária da Tia Jana, diz que o acervo e as preferências dos frequentadores são bem diversificados.

“No acervo infantil, geralmente os livros-brinquedos são os favoritos das crianças, por conta da interatividade. No acervo juvenil, permeia entre as coleções Diário de um banana, Gibis e HQs, como por exemplo Turma da Mônica e Turma da Mônica jovem”, conta. Já os adultos se dividem entre os clássicos nacionais e estrangeiros, segundo a mediadora.

Bruna diz que por conta da pandemia a biblioteca suspendeu as atividades programadas para o Dia das Crianças no ano passado. Contudo, conseguiram realizar a doação de brinquedos no Natal e a dúvida das crianças sobre a volta das atividades foi um momento marcante da sua trajetória na instituição.

“Isso nos impactou muito, porque o trabalho é de formiguinhas no incentivo à leitura e ouvir isso dos nossos leitores nos deu um sentimento de lamento. Porém, também deu forças para continuar, persistir na luta pela democratização da leitura e no acesso à cultura”, observa.

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Lucas Barbosa

Correspondente de Cajazeiras em Salvador, BA, desde 2020. Nascido em Jequié mas criado em Salvador, formado em ciências sociais e mestrando em antropologia, educador social, treinel de capoeira Angola e pai de Malik.

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