Nas terças, quartas e quintas-feiras, o interior de uma oficina de costura dá lugar a aulas de reforço escolar para crianças do Jardim Lapena, região da subprefeitura de São Miguel Paulista, na zona leste de São Paulo. A iniciativa é da costureira e professora Simone de Jesus Andrade Pimentel, 43, que concilia as duas profissões dentro de casa.
Por lá, a queixa mais frequente dos pais é a dificuldade no processo de alfabetização dos filhos. “Muitos não sabem ler e nem escrever ou tem alguma dificuldade na aprendizagem em formar frases, interpretação e até calegrafia”, diz Simone.
Nascida na Bahia, Simone mudou para o Jardim Lapena em 2001 e decidiu continuar dando aulas. “Eu trabalhava com a educação com o magistério, por lá nós chamamos aulas de reforço de banca escolar. Quando cheguei aqui, busquei me especializar e me formei em pedagogia para poder dar aulas em escolas.”
A tarefa de iniciar um negócio de reforço escolar veio com o desafio enfrentado por muitas mulheres: a de conciliar o trabalho com a maternidade. “Para poder trabalhar na creche, eu deixava a minha filha com outras pessoas. Quando planejei engravidar do meu segundo filho, decidi que empreenderia com reforço escolar em casa”, diz Simone.
Para iniciar as aulas, o marketing boca a boca foi e ainda é o responsável por trazer os alunos para a sala de aula da “Tia Simone”, como carinhosamente os estudantes a chamam. Após estruturar a grade curricular, a professora pediu ajuda aos vizinhos e comerciantes locais para indicar o trabalho. As aulas são realizadas às terças, quartas e quintas-feiras, por duas horas cada. Ela cobra R$ 100 por aluno.
A procura cresceu mais após a pandemia de Covid-19, quando as crianças ficaram afastadas das aulas presenciais, por conta das medidas de segurança. As aulas online foram um dos obstáculos para as crianças, em meio à falta de equipamentos e de internet de qualidade. “Muitos pais me procuraram após o período de Covid-19, justamente por conta da defasagem na educação”, destaca Simone.
A pesquisa Resposta Educacional à Pandemia de Covid-19 no Brasil, que contempla toda a educação básica, aponta que no ensino privado, 70,9% das escolas ficaram fechadas no ano letivo de 2020. O número é consideravelmente menor que o da rede pública: 98,4% das escolas federais, 97,5% das municipais e 85,9% das estaduais.
O estudante Ezequiel Ramos, 8, foi uma das crianças afetadas pela pandemia. “Aqui eu tenho mais atenção do que na escola, aprendi a ler e formar palavras, porque a Tia Simone ensina de uma forma mais fácil de entender”, diz Ezequiel que adora ler livros de quadrinhos.
A pandemia também trouxe mudanças significativas na carreira da Simone. Foi nesse período que ela se encontrou com a costura e decidiu iniciar mais um negócio. “Estávamos em quarentena, já não tinha mais a renda do reforço escolar e fiquei pensando o que eu posso fazer em casa para conseguir uma renda?”, relembra.
A solução foi a costura, atividade que a mãe dela exercia. “Apesar de ter crescido vendo a minha mãe costurar, foi apenas na pandemia que busquei me aperfeiçoar. Vi vídeos na internet, fiz modelos de roupas para a família, amigos e vizinhos e assim começou uma nova profissão”, diz a costureira.
Sobre conciliar as duas profissões, Simone afirma que é preciso ter um planejamento e organização. “Nos dias que tem aula, não há costura! Busco me dedicar inteiramente aos meus alunos, seja preparando a aula ou tirando as dúvidas”, destaca Simone, professora e costureira no Jardim Lapena.