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Moradores apontam desmatamento em Embu das Artes e ameaça à Mata Atlântica

Felipe Barbosa/Agência Mural

População que vive em bairros da Unidade de Conservação Municipal Ambiental Embu Verde relatam modificações na biodiversidade

Por: Felipe Barbosa

Notícia

Publicado em 24.11.2023 | 9:51 | Alterado em 27.11.2023 | 9:19

RESUMO

Você verá aqui: - Moradores apontam desmatamento em área de Proteção Ambiental - Especulação imobiliária ameaça áreas verdes - Plano de Manejo foi entregue apenas este ano e com críticas - Eleição do Conselho Gestor de Meio Ambiente tem denúncias de manipulação da prefeitura

Tempo de leitura: 7 min(s)

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A dona de casa Maria do Carmo Batista, 70, avisa que vai pegar uma carona em instantes, mas consegue falar um pouco do bairro Chácaras Bartira, onde vive há mais de 44 anos, em Embu das Artes, na Grande São Paulo. “Noto uma grande diferença aqui na calmaria, pois quando mudei pra cá, havia mais verde e mais mata”, explica ela, que também trabalha como costureira nas horas vagas.

O Chácaras é apenas um dos bairros pertencentes à APA (Área de Proteção Ambiental) Embu Verde. A região é uma Unidade de Conservação Municipal Ambiental de Uso Sustentável e abriga fragmentos de Mata Atlântica em bom estágio de conservação.

Esses aspectos são importantes, tanto para os moradores quanto para o Cinturão Verde de São Paulo, regiões com área verde ao redor da capital e que são responsáveis pela qualidade de vida na região metropolitana.

Porém, esse cenário vem sendo ameaçado. O boletim do SAD (Sistema de Alertas de Desmatamento) Mata Atlântica apontou que Embu das Artes foi o município que mais desmatou a Mata Atlântica na Grande São Paulo em 2022.

Considerando todas as cidades do estado, Embu ocupa o 3º lugar, com 14,29 hectares de área desmatada de janeiro a outubro de 2022, o equivalente a mais de 17 campos de futebol.

Mãe e filha residem na Chácaras Bartira @Felipe Barbosa/Agência Mural

O crescimento urbano desordenado da cidade ao longo dos anos tem trazido algumas preocupações na APA Embu Verde, como o aumento do desmatamento e a especulação imobiliária sobre as áreas de preservação.

Maria conta que o bairro trocou o grito dos macaquinhos Bugio pelo barulho dos caminhões. A também dona de casa Elisângela da Silva, 37, é filha de Maria e relata que a construção de condomínios dentro e fora do bairro tem aumentado, e a qualidade de vida que se tinha antes já não é a mesma.

Maria inclusive ouve barulho de motosserra às escondidas. “A gente percebe, por exemplo, que um dia a estrada está fechada, no outro ela está aberta, e você não viu ninguém tirando [as árvores].”

Apa Embu Verde ocupa grande área da cidade @Atlas Socioambiental de Embu.

A APA é uma extensa área natural, com um certo nível de ocupação humana, que garante a proteção e conservação de atributos bióticos, abióticos, estéticos ou culturais importantes para a qualidade de vida da população.

A bióloga Mariana Montezuma, 38, mora há alguns minutos da casa de Maria e Elisângela e confirma modificações pequenas na configuração da biodiversidade do bairro pertencente à APA Embu Verde. “O cara primeiro levanta o muro e depois que o muro já está levantado ali, ele começa a derrubar as árvores.”

O técnico em meio ambiente Maurício Iocca, 37, é marido de Mariana e tem o hábito de andar de bicicleta pelo bairro e vê cada vez mais vias sendo alargadas e lotes à venda. “Já passei por estrada onde eles aterram e passam um trator ali. Nessa mesma estradinha você percebe o morro um pouquinho acima, o pessoal com tratores, parece que vão construir uma casa. Então é o primeiro passo.”

Há alguns quilômetros dali, quem nota com bons olhos a urbanização da região é a comerciante Célia Pereira, 45. Ela fala que o barulho dos caminhões incomoda um pouco, mas que a situação melhorou nos últimos 20 anos.

A comerciante trabalhava como camareira, mas precisou parar devido a problemas de saúde, e foi a partir disso que ela teve a ideia de abrir um comércio. “Se fosse naquela época que era estrada de terra e não tinha esse movimento, para mim, já não estaria legal.”

Estrada em Embu das Artes. Moradores têm visto mais estradas sendo abertas e lotes a venda @Felipe Barbosa/Agência Mural

Uma terra cada vez menos verde

O ambientalista Rodolfo Almeida é conselheiro da ONG Seae (Sociedade Ecológica Amigos de Embu). Ele diz que o maior problema da APA Embu Verde no momento não é a grilagem, mas o desmatamento que é licenciado e feito de forma inadequada.

“A gente vê com muita frequência a omissão do poder público em atuar de forma rápida em relação à grilagem e a desmatamentos ilegais.”

Rodolfo, ambientalista de Embu das Artes

A situação preocupa, entre outros fatores, pela importância da manutenção de áreas verdes na Grande São Paulo. Cesar Pegoraro, biólogo e ecoeducador da Fundação SOS Mata Atlântica, afirma que a APA Embu Verde exerce uma grande influência no bioma.

“Ela desempenha vários papéis ecológicos, oferecendo diversos serviços ambientais, não apenas para a preservação da biodiversidade da Mata Atlântica, mas para a manutenção dos serviços ambientais e a qualidade atmosférica.”

O estudante de economia Uriel Biazin, 25, mora em Itatuba há pelo menos 20 anos e relata uma mudança brusca nas áreas verdes. Ele cita que o clarão no meio da floresta é consequência do desmatamento desenfreado.

“A gente vive um processo de ataque assim. As nossas matas aqui da nossa região, do nosso bairro. A gente vê cada vez menos a presença da fauna.”

Clarão de área verde de Itatuba, divisa com Embu e Cotia @Felipe Barbosa/Agência Mural

Ao tentar denunciar casos de desmatamento no bairro, ele menciona a dificuldade dos órgãos responsáveis em agir rapidamente. Ele relata que é muito difícil que alguma viatura ou algum representante de órgão público venha fiscalizar no mesmo dia da denúncia.

“Por vezes, uma denúncia pode demorar até 15 dias para ser fiscalizada, quando depois disso o estrago já está feito, e a nossa entidade entende que apenas a aplicação da multa não é a situação ideal”, ressalta o ambientalista Rodolfo.

A região de Itatuba é caracterizada por uma alta densidade de vegetação e uma ocupação urbana relativamente baixa, com estradas de terra associadas a uma zona de morros.

Anteriormente parte do município de Cotia, o bairro foi anexado a Embu das Artes em 1964 e hoje é ocupado por condomínios de alto a médio padrão socioeconômico, bem como por loteamentos residenciais de médio a baixo padrão.

“A gente vê que é uma zona totalmente esquecida aqui da da nossa cidade”, conta Uriel. “Às vezes até existe uma divergência sobre quem quer que as ruas sejam asfaltadas ou que elas não sejam, mas todo mundo quer que elas estejam decentes”, conta Uriel.

Ele cita que como morador tem a impressão de que se entende esse problema do desmatamento como um problema menor e sem urgência.

Uriel Biazin e sua namorada Pâmela Tomazolli residem na região de Itatuba @Felipe Barbosa/Agência Mural

O ambientalista Cesar Pegoraro afirma que olhar para a natureza e para emergências climáticas passam a ser uma política pública de vanguarda.

“Muitos enxergam a natureza como um empecilho para o nosso desenvolvimento ou como algo que não faz parte de nós. Essa reconexão, esse trabalho casado das políticas públicas e do resgate da natureza são muito importantes no enfrentamento das emergências climáticas.”

Plano de manejo

Moradores relatam a necessidade de um plano de manejo como forma de preservar a APA Embu Verde. Trata-se de um estudo detalhado que determina o zoneamento de uma unidade de conservação, seus recursos naturais, flora e fauna, tendo como finalidade o disciplinamento de usos e conservação destas unidades.

Em julho de 2023, a Secretaria de Meio Ambiente da Prefeitura de Embu das Artes entregou a versão preliminar do Plano de Manejo da APA Embu Verde, por meio de um estudo da empresa Líder Engenharia e Gestão de Cidades.

O plano estabelece as diretrizes e as ações para o manejo da área, bem como incentiva a educação ambiental, preservação e propõe parcerias e acordos de cooperação técnica.

Para o ambientalista Rodolfo Almeida, o plano teve problemas como a demora na entrega, falta de participação popular e aponta não atender às necessidades da população da APA Embu Verde.

‘’Apesar de bonito esteticamente, é pouco eficaz porque tem poucos instrumentos para proibir e coibir ocupações prejudiciais para a preservação da flora e da fauna”, afirma. “É melhor do que não ter nenhum, mas é muito aquém do que seria necessário para enfrentar a especulação imobiliária e todas as ameaças que a APA enfrenta.’’

Pedreira na região da Chácaras Bartira @Felipe Barbosa/Agência Mural

A criação dessa proposta se arrastou por quase 10 anos. Mariana acompanhou a discussão acima do plano de manejo em 2014, quando a gestão do ex-prefeito da cidade, Chico Brito (PT), chegou a criar uma comissão formada por representantes da prefeitura, conselheiros da APA e das três comunidades para acompanhar a sistematização dos debates e encaminhamentos nos bairros.

A bióloga cita a discussão acirrada do poder público com os ambientalistas, que discordavam de diferentes pontos do documento, bem como a criação de um corredor de logística na região da Chácaras Bartira.

“Tinha uma pressão política empresarial, que recai sobre a prefeitura de manter esse zoneamento, permitindo essa área de uso intensivo, de cortar árvores para criar os galpões.”

Um outro ponto sensível na discussão foi a área ocupada pela Pedreira Embu, localizada na estrada Dona Maria José Ferraz Prado, na Chácaras Bartira. Na década de 1960, a pedreira se instalou na região e foi se ampliando ao longo dos anos. Hoje a área ocupa uma grande cava de mineração, cuja principal atividade é a extração de granitos.

Denúncias em eleição do conselho

A APA Embu Verde possui um conselho deliberativo composto por representantes da sociedade civil e membros do poder público, responsável por avaliar e aprovar mudanças e instalações dentro de sua área.

Depois de ter permanecido paralisado desde 2018, a prefeitura retomou o processo eleitoral para a escolha de novos membros do conselho no dia 4 de novembro.

A eleição para o conselho gestor da APA Embu Verde foi realizada juntamente com o Comam (Conselho Municipal de Meio Ambiente). As votações ocorreram na Escola Municipal Valdelice Aparecida Medeiros, situada a mais de 15 km de distância da APA e longe do centro. Entre os candidatos que foram eleitos, encontram-se pessoas e instituições apoiadas pela Prefeitura de Embu das Artes.

Por meio do coletivo Preservar Itapecerica, em colaboração com Pan Verde e Sociedade Ecológica Amigos de Embu, uma denúncia sobre compra de votos e assédio eleitoral foi enviada para Júlia Fernandes Caldas, 2ª Promotora de Justiça do Ministério Público de Embu das Artes.

Moradores têm ouvido motosseras em áreas da APA @Felipe Barbosa/Agência Mural

No ofício, o Preservar Itapecerica declara que foi informado por servidores públicos de que a prefeitura estaria manipulando a eleição do conselho gestor, distribuindo a versão impressa e digital de uma colagem da chapa anti-ambientalista da cidade.

A denúncia ainda ressalta que os comissionados, correligionários políticos e entidades assistenciais dependentes do governo foram obrigados a votar nos candidatos.

A Agência Mural tentou contato no e-mail fornecido pela Secretaria de Meio Ambiente da Prefeitura de Embu das Artes, mas até o fechamento desta matéria não tivemos retorno.

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Felipe Barbosa

Jornalista e social media, motivado por boas histórias e ideias. Jovem de espírito sonhador, com um pé na área cultural. Correspondente de Embu das Artes desde 2023

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